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Grace is Gone – Nossa Vida Sem Grace


Este é um bom exemplar de filme para ser bombardeado. Primeiro, porque a história é a típica que cai no gosto de quem gosta de julgar o próximo. Segundo, porque o diretor James C. Strouse não tem nenhuma pressa em acelerar o ritmo da narrativa ou de escrever o seu roteiro para agradar o espectador. Resumindo: Grace is Gone é o típico filme que fará muita gente criticar imensamente o personagem Stanley Philipps, vivido de uma maneira interessante e marcante por John Cusack, acreditando que tem a resposta certa para o que uma pessoa deveria fazer em uma situação como a dele. O problema é que jogam papéis decisivos aqui a frustração e a incredulidade. Como explicar para as suas duas filhas que você mal consegue criar sozinho quando a sua mulher está fora de que a mãe delas morreu de uma forma estúpida, sem justificativa? E olha que Philipps ainda acredita na instituição do Exército e vê como “justificável” a causa que matou a sua mulher… ou pensava que acreditava até que o pior aconteceu.

A HISTÓRIA: Stanley Philipps (John Cusack) é o chefe de uma equipe de vendedores de uma loja de departamentos típica nos Estados Unidos. Fora o tempo no trabalho, ele passa muito tempo em casa sozinho com as duas filhas, Heidi (Shélan O’Keefe) e Dawn (Gracie Bednarczyk), porque a mulher dele, Grace, serve o Exército e vive sendo chamada para missões fora. Desta vez ela está servindo na Guerra do Iraque. Um dia pela manhã, antes de ir trabalhar e depois que as filhas saem para o colégio, ele recebe a visita de dois oficiais que comunicam a morte de Grace. Sem saber como comunicar isso para as filhas, ele resolve sair com elas para uma aventura especial.

VOLTANDO À CRÍTICA (SPOILER – aviso aos navegantes que boa parte do texto à seguir conta momentos importantes do filme, por isso recomendo que só continue a ler quem já assistiu a Grace is Gone): Muitas pessoas – talvez a maioria – que vá assistir a esse filme sairá do cinema ou desligará o DVD irritadas. Estarão dizendo uma para as outras: “Mas isso é atitude de um homem adulto, pai de família e que tem duas garotas em casa que são suas dependentes?”. Fácil julgar. Sempre foi e sempre será mais tranquilo apontar o dedo para a pessoa próxima e dizer tudo que ela faz de errado. Mas quem pode julgar Stanley Philipps? Ninguém. Nem mesmo alguém que tenha passado pelo mesmo. E eu explico o porquê.

O personagem vivido por John Cusack (em uma das, senão a maior interpretação de sua carreira) vive frustrado. Se sente também culpado por estar em casa enquanto a mulher faz o que ele gostaria, enquanto ela leva a vida de “herói” que ele sempre sonhou. Enquanto ela está longe de casa defendendo o seu país – algo que ele realmente acredita ser o correto -, ele está em casa cuidando de duas meninas com as quais ele não consegue se comunicar direito. Quando começamos a assistir o filme, Philipps parece um estranho em seu próprio lar, em seu próprio corpo. Cada gesto, cada olhar furtivo que Cusack lança em sua interpretação denuncia a falta de conforto de um homem vestindo uma fantasia de pai de família. E se ele queria sair correndo, tudo fica mais impossível quando chega a notícia da morte de Grace.

É dificílimo lidar com a morte de uma pessoa que a gente ama muito. Mas, algumas vezes, por mais paradoxo que isso possa parecer, é mais fácil lidar com a perda quando estamos sozinhos. Porque daí nada e nem ninguém nos impede de nos afundarmos por um tempo, de nos jogarmos dentro de um casulo sem prazo para sair. Mas tudo fica mais “pesado” ou mais “grave” quando existem pessoas hipoteticamente mais frágeis que nós mesmos dependendo de nossa força, de nossa postura. Mas que força? Que postura? Como permanecer com a coluna ereta se perdemos uma parte importante de nós mesmos expresso na forma da pessoa que escolhemos para viver conosco e que é o nosso amor? Difícil, muito difícil. Mas necessário se reerguer.

Neste cenário de perda, de frustração e de dificuldade em se comunicar é que Philipps decide sair de casa, do seu “lugar seguro”, para aventurar-se. Quem sabe no caminho ele não encontra a forma de contar para as filhas que a mãe que elas sentem falta todos os dias nunca mais irá voltar? E ele vai dirigindo, perguntando o que Heidi e Dawn querem fazer sempre, enquanto pensa no que vai fazer. (SPOILER – não leia o trecho a seguir se realmente não assistiu ao filme). Para mim um dos momentos mais duros do filme é a última ligação que ele faz para a casa deles. Na primeira, quando ele liga para ouvir a voz de Grace na secretária eletrônica e deixa uma mensagem como se ela fosse voltar para casa, achei besta, pensei que ele estivesse negando a realidade. Talvez sim. Mas depois, quando ele liga para ouvir a voz de Grace na secretária eletrônica e também para pedir ajuda, perguntando como ele deveria falar o que deveria falar para as filhas, foi de matar. Cada um realmente sabe a dor que sente e encontra, por autopreservação mesmo, a melhor forma de enfrentar a sua dor.

Agora sobre o filme propriamente dito. Gostei do ritmo natural da história, que não tem pressa alguma em chegar a respostas. James C. Strouse escreveu o roteiro e também dirige o filme. Para mim, fez um bom trabalho. John Cusack, como eu disse antes, está incrível. Não é fácil interpretar um sujeito que carrega tanto peso sobre os ombros e que, por incrível que pareça, talvez seja mais comum do que gostaríamos. As meninas que interpretam as filhas de Stanley e Grace são ótimas, especialmente Shélan O’Keefe. Gostei bastante da direção de fotografia de Jean-Louis Bompoint e da trilha sonora de – quem diria! – Clint Eastwood.

Falando em “quem diria!”, Marisa Tomei faz uma ponta quase imperceptível como a “mulher da piscina” do hotel em que eles ficam hospedados uma noite – e em que Heidi conhece um garoto com o qual tenta “flertar” e começar a fumar.

NOTA: 8.

OBS DE PÉ DE PÁGINA: Algo interessante do filme é que nunca vemos a Grace que dá título ao filme, mas ela está sempre presente, como uma “entidade”. Acho que a trilha sonora de Eastwood ajuda bastante neste efeito.

Falando em “efeito”, achei curioso também como o filme acaba sendo uma crítica interessante a ignorância da Guerra do Iraque, ainda que isto não seja muito óbvio na história. Sabemos que Grace foi para o Iraque por uma “fração” de tempo em que Heidi está assistindo TV em casa. Depois, a crítica aparece em uma conversa “casual” entre Heidi, seu tio John (Alessandro Nivola) e o próprio pai. No fim das contas, assistimos em tela uma história que poderia ser real e que, provavelmente, está ocorrendo de maneiras “levemente” distintas em muitas casas dos Estados Unidos agora mesmo. Pessoas perdendo amores de suas vidas, filhas ficando órfãs por uma guerra inútil e corrompida. Mesmo sendo um “drama humano”, Grace is Gone é carregado desta crítica das mortes estúpidas e anti-naturais.

Até agora o filme foi indicado a 10 prêmios – levando para casa quatro deles. Entre os mais importantes, destaque para os prêmios de no Festival de Sundance – para o roteiro de Strouse e como prêmio da audiência para filme dramático. No Globo de Ouro o filme concorreu em duas categorias de música – trilha sonora e música – mas não levou nenhum prêmio para casa.

O interessante é que Grace is Gone teve um baixíssimo orçamento: teria custado US$ 2 milhões. Independente, sendo exibido em pouquíssimas salas nos Estados Unidos, ele até agora conseguiu uma bilheteria “ridícula” para os padrões de Hollywood: pouco mais de US$ 50 mil. Isso mesmo, “mil” e não “milhões”… hehehehehehehehe

Os usuários do site IMDb deram a nota 6,8 para o filme, enquanto o site Rotten Tomatoes publica 35 críticas positivas e 25 negativas para o filme.

CONCLUSÃO: Um filme com clara vocação para ser “amado ou odiado”, pode tanto fazer as pessoas chorarem quanto fazê-las querer bater no personagem principal – ou querer acelerar o filme até a parte inevitável. Ainda assim, achei um filme interessante por mostrar outra “ótica” na questão de perdas pela Guerra do Iraque. E, mais que isso, por tratar de forma natural o quão desajustada uma pessoa pode estar e/ou ficar com uma notícia incomunicável. Recomendado para quem consegue ver filmes sem muita ação e que gostam de observar diferentes tipos de pessoas em situações de ruptura em suas vidas.

Por Alessandra

Jornalista com doutorado pelo curso de Comunicación, Cambio Social y Desarrollo da Universidad Complutense de Madrid, sou uma apaixonada pelo cinema e "série maníaca". Em outras palavras, uma cinéfila inveterada e uma consumidora de séries voraz - quando o tempo me permite, é claro.

Também tenho Twitter, conta no Facebook, Polldaddy, YouTube, entre outros sites e recursos online. Tenho mais de 25 anos de experiência como jornalista. Trabalhei também com inbound marketing, professora universitária (cursos de graduação e pós-graduação) e, atualmente, atuo como empreendedora após criar a minha própria empresa na área da comunicação.

13 respostas em “Grace is Gone – Nossa Vida Sem Grace”

Oi Isa!!!

Puxa, obrigadíssimo por teu comentário incentivador! Infelizmente, como pudeste ver, eu não estou conseguindo atualizar este blog como gostaria… hehehehehehee. Mas eu tento!

Obrigada por tua visita e espero mesmo que voltes muitas vezes ainda. Depois comenta por aqui os filmes que assististe, certo?

Um grande abraço e uma ótima semana para ti – esta novinha que vai começar amanhã!

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Parabéns, maravilhosa a análise que você faz a respeito dos filmes, na sua maioria, filmes de arte que exigem grande sensibilidade para um julgamento. stou ancioso para uma próxima avaliação/recomendação.

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Oi Cleber!!

Primeiro de tudo, obrigada por tua visita e por teu comentário que é, acima de tudo, um incentivo.

Ainda bem que você falou “na sua maioria” sobre os filmes “de arte” porque, na verdade, eu vejo de tudo. hehehehehehehehe. Como comentei na apresentação deste blog, na parte de “sobre”, eu faço questão de ver filmes mais artísticos, menos conhecidos pelo “grande” público, ao mesmo tempo que aprecio assistir aos chamados “blockbuster” (arrasa-quarteirões de bilheteria) para saber o que a “massa” anda assistindo. Acho que existem bons e maus exemplos de filmes nas duas fronteiras.

Espero que este blog te ajude a encontrar filmes interessantes e que possas participar por aqui mais vezes, inclusive comentando o que tens assistido – e, claro, me recomendando bons títulos. 😉

Um grande abraço e volte sempre!!

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Oi Camila!!!

Como demorei para responder, eu pergunto: já assistiu ao filme? hehehehehehe

Como gostas muito do John Cusack, depois me diz se realmente está não é uma de suas melhores interpretações…

Um abraço e volte sempre!

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Oi Vander!

Que legal que você começou aqui comentando vários filmes, hein? Gostei!

Realmente, o filme é emocionante. E o bacana é que ele foge do lugar-comum em satisfazer o público, né? Afinal, ele não tem nenhuma pressa em narrar nada, pelo contrário… vai submergindo em uma história que realmente poderia ter acontecido com muitas famílias. John Cusack está fantástico e as meninas também estão muito bem.

Obrigada por mais este comentário e volte sempre com vários textos, viu? Um abraço!

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Também vi este filme após ver sua crítica aqui no blog. Ele tem sido referência para minhas sessões de cinema em casa.
Meu método é: vejo a capa, atores, breve sinopse, depois vejo o filme e volto aqui pra ler a critica até o final e depois comento.
Adorei este filme. Me lembrou Rebecca do mestre Hitchcock…rs!
Que filmão hein? John Cusack está espetacular. Filme pra te deixar com um nó na garganta.

abração e até a próxima.

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Oi Rogerio!

Novamente te digo que fico muito feliz que os meus comentários têm te ajudado a buscar alguns filmes bons por aí. De verdade.

No teu lugar, faria o mesmo… não ler muito para não comprometer as “surpresas” e o julgamento dos filmes. Aliás, sou da política de quanto menos se lê antes, melhor. Eu, por exemplo, procuro não ler nada antes… só depois. hehehehehehehehe

Realmente, Grace is Gone é muito bom. John Cusack em grande forma. E juro que você comentando de Rebecca eu fiquei com vontade de revê-lo – afinal, sem mentira, deve fazer uns 15 anos que o vi. Já nem lembro direito dele… Aliás, tenho planos de criar uma seção aqui no blog do tipo “segunda leitura”, onde comentarei filmes que eu vi há bastante tempo… até para comentar possíveis mudanças de opinião. Quem sabe eu não comece ela com Rebecca? Veremos… antes preciso arranjar tempo. hehehehehehehehe

Um grande abraço e te cuida!

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Olá,
Acabei de assistir o filme e enquanto algumas lágrimas caiam fui curtindo a musica final…é de Clint Estwood? o interprete é o Jamie Cullum…fantástico.
E foi procurando o nome da musica na internet que acabei nesse Blog.
Sou cinéfila, e ver filmes é parte da minha vida como comer, trabalhar….é um vício!
Filmes sao melhores ou piores de acordo com nosso astral, nosso momento concorda? Estou em um quarto de hotel, longe do meu país (estou no méxico) meu marido só volta tarde e aproveitei, já que ela nao gosta muito de dramas para assisti-lo.
O tempo da narrativa, cada gesto, cada olhar, cada momento de puro silencio fizeram toda o filme fluir lenta e densamente.
Nao existe o engano sobre a morte, que traria um final feliz e surpreendente, nao exixtem fantasmas que sussuram no ouvindo fazendo com que a gente sinta a presenca e se conforme mais….só a realidade!
Adoro o Jonh, realmente ele esteve impecável!
Quanto a Marisa….nossa….nunca perceberia!
Um abraco e vou ler outras críticas!
Como já assisti muuuuuitos filmes, vai ser bem interessante comparti-las!
Um abraco!!! sem cedilha)

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Olá Vicky!!

Faz um tempinho que assisti ao filme, mas a música final seria a música-título do filme, ou seja, Grace Is Gone? Se for essa, sim, é música do Mr. Clint Eastwood. A música é dele e a letra de Carole Bayer Sager com interpretação de Jamie Cullum.

Que legal saber que o cinema é tão importante para ti quanto as demais atividades básicas… filmes são demais, não é mesmo? Sou apaixonada por eles também.

Concordo que nosso astral e o momento que estamos vivendo na nossa vida influi muito na hora de gostar ou não de um filme. E digo mais: nossa experiência de vida é FUNDAMENTAL para que a gente tenha mais ou menos sensibilidade para algumas histórias. Falei um pouco disso na crítica de The Visitor, que é um dos filmes que me afetou bastante ultimamente e que eu sei que não deve afetar a muita gente da mesma forma. A arte é magnífica por isso mesmo, porque tem mil sentidos e mil leituras conforme cada pessoa.

E tens razão quando dizes que o filme não usa nenhum recurso para transformar a história em algo mais “feliz” ou bonitinho… não, ali está estampada apenas uma história real- com suas críticas subentendidas, claro.

Mas voltando a algo que dissestes antes… que bacana que estás no México. Uma experiência fora do país é sempre gratificante e muito, muito enriquecedora. Boa sorte por aí – um dia ainda quero conhecer o México.

Espero mais comentários teus… espero que por aqui encontres outros filmes que tenhas visto e que fales sobre eles.

Abraços e até a próxima! Ah, e seja muito bem-vinda!

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