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Persepolis – Persépolis


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Para muitos os desenhos ou filmes de animação continuam sendo “coisa para crianças”. Ainda que existam dezenas de exemplos de filmes do gênero que foram produzidos mais para adultos do que para “niños y niñas”, muitos ainda continuam com esta crença. Pois Persepolis, a animação francesa que arrebatou até agora oito prêmios e foi indicado para o Globo de Ouro deste ano, prova mais uma vez para os descrentes que grandes histórias podem (e até devem) ser contatas desta forma. Afinal, nenhuma produção com atores poderia ter rendido uma obra tão bonita e poética. Fiquei maravilhada com o filme e agora entendo porque ele foi tão admirado por onde passou.

A HISTÓRIA: O filme conta a história de Marjane “Marji” Satrapi (com voz de Chiara Mastroianni), uma iraniana que acompanha e narra as grandes mudanças sofridas por seu país desde a Revolução Islâmica. Através de sua narrativa pessoal desde a infância, acompanhamos a história, os costumes, as relações familiares e sociais no Irã no período de 1978 até os anos 90. Marji também conta a história antiga do Irã através do relato de seus familiares, como do pai (voz de Simon Abkarian), da mãe (voz de Catherine Deneuve), de sua avó (voz de Danielle Darrieux) e de seu tio, Anouche (voz de François Jerosme). Além da história de seu país, Marji nos conta a história que muitas crianças e jovens viveram nos anos 80 e 90, com toda a busca por liberdade e os gostos culturais desta época.

VOLTANDO À CRÍTICA (SPOILER – aviso aos navegantes que trechos do texto à seguir contam partes importantes do filme, por isso recomendo que só continue a ler quem já assistiu a Persepolis): Como falei antes, este filme é emocionante, tanto pela técnica, pela arte da animação feita com um esmero que há tempos eu não via, quanto pelo roteiro propriamente dito. O texto é lindo. E tem a força que tem, assim como a emoção que se vê, porque essa história é uma autobiografia. Ou seja: a menininha que vemos crescendo até se tornar adulta é a diretora e roteirista do filme, Marjane Satrapi – que antes de fazer esta animação já havia contado sua história através dos quadrinhos. Para colocar na telona o que viveu, ela contou com a ajuda do roteirista e co-diretor Vincent Parannaud.

O mais interessante do filme é que ele é divertido ao mesmo tempo que emocionante. Marjane consegue nos contar parte da história do seu país sem ser chata, acadêmica ou formal. Pelo contrário. Ela nos mostra a vida “como ela foi”, ou seja, o que ocorria ao seu redor conforme foi crescendo e amadurecendo. Conforme foi mudando de pele. Desta maneira acompanhamos a garotinha curiosa e idealista que queria aprender o máximo possível sobre política, Bruce Lee, revoluções e tudo o mais junto a seus amiguinhos; passando a vê-la em sua pré-adolescência, já com as imposições do islamismo no uso de trajes (como a adoção da burca) e com outras formas de controle sociais; até chegar a sua adolescência e fase adulta, quando vira uma imigrante e vai conhecer a sociedade fora do seu país.

Como se pode entender do resumo acima, Persepolis trata de muitos temas. De tradições, educação, família, idealismos, choque de culturas, crescimento pessoal, liberdade, autoritarismo, repressão, política, religião, costumes, amores, ilusões e desilusões, heroísmo, revolução, raízes, comprometimento, lealdade, etc. Um dos pontos mais bonitos, na minha opinião, é o da relação amorosa e de incentivo por parte dos pais e avó de Marji com ela. Realmente comovente a maneira com que eles encaram a sua liberdade e tentam orientá-la para uma vida justa consigo mesma e com os demais apesar da guerra e da repressão em que vive o seu país.

Falando em guerra, o filme inevitavelmente trata também da guerra entre o Irã e o Iraque, que durou oito anos e marcou definitivamente a história do país de Marji. Impressionante a delicadeza dos diretores e a arte realista que conseguem produzir destas histórias. Para mim, Persepolis é realmente uma obra de arte.

NOTA: 10.

OBS DE PÉ DE PÁGINA: Eu não conheço os quadrinhos em que o filme foi baseado, mas fiquei curiosa para conhecê-lo. Somente na França, a HQ de Marjane Satrapi vendeu mais de 400 mil exemplares. Os direitos de sua obra foram vendidos para quase 20 países. Em 2004, sua HQ ganhou o prêmio de melhor história em quadrinhos da Feira de Frankfurt. E pensar que eu nem tinha ouvido falar nela… realmente ando meio desconectada do mundo HQ.

Para quem não sabe, Persépolis foi uma antiga capital do Irã e é, atualmente, o principal sítio arqueológico do país. Ruínas da cidade datam de mais de 2,5 mil anos. Ela foi destruída pelo Exército de Alexandre, o Grande, durante o extermínio do império persa. Aqui encontrei uma interessante reportagem a respeito.

Persepolis ganhou alguns prêmios importantes, como o conferido pelo júri do Festival de Cannes; o de melhor animação pela Associação de Críticos de Los Angeles e pela Associação de Críticos de Nova York; o de Liberdade de Expressão pelo National Board of Review dos Estados Unidos (associação de críticos daquele país); prêmio da audiência como Melhor Filme Estrangeiro no Festival Internacional de Cinema de São Paulo; além dos prêmios de Filme Mais Popular no Festival Internacional de Cinema de Vancouver; prêmio especial do júri no Festival Internacional de Cinema Cinemanila, nas Filipinas; e o “Sutherland Trophy” do Instituto Britânico de Cinema. Além dos prêmios já recebidos, ele foi indicado ao Globo de Ouro como Melhor Filme Estrangeiro (perdendo para o também francês The Diving Bell and The Butterfly) e está concorrendo a quatro prêmios no Annie Awards, uma espécie de Oscar da animação que terá a premiação divulgada no dia 8 de fevereiro em Hollywood.

Os usuários do site IMDb conferiram a nota 8,2 para a produção, enquanto os críticos que tem seus textos publicados no site Rotten Tomatoes escreveram 62 comentários positivos e apenas quatro negativos para o filme. Parece que ainda é um filme que agrada mais aos críticos que ao público.

A animação de Marjane Satrapi teria custado aproximadamente US$ 7,3 milhões. Somente na França esta produção já faturou pouco mais de € 5,5 milhões (lembrando que o Euro está mais valorizado que o dólar). Na Bélgica, Persepolis acumula uma bilheteria de € 238,6 mil, enquanto nos Estados Unidos o filme faturou até o dia 6 de janeiro pouco mais de US$ 313,6 mil. Desde maio de 2007 Persepolis está fazendo o circuito dos festivais de cinema, sem ter caído ainda no gosto popular – exceto pela França. Nos Estados Unidos, por exemplo, o filme estreou apenas no dia 25 de dezembro com poucas cópias.

Uma qualidade do filme é que nele tudo funciona bem, desde o roteiro até as “interpretações” dos atores, que imprimem o tom exato em cada fala, passando pela trilha sonora e a arte gráfica propriamente dita.

O filme é uma co-produção França e Estados Unidos.

PALPITE PARA O OSCAR: Eu colocaria Persepolis como certeza na categoria de filme estrangeiro ou de animação, mas para a minha surpresa foram divulgados os nove “pré-selecionados” para a premiação deste ano e ele ficou de fora. Para mim isso só tem duas explicações: ou Persepolis será indicado na categoria de Melhor Animação e/ou de Melhor Filme ou, o que seria absurdo, a Academia simplesmente vai deixar ele de fora. Acho mais provável que ele seja indicado como Melhor Animação… e daí ele terá que vencer todo o marketing e lobby de filmes como Bee Movie para ganhar. O que ele merece, com certeza. Acho mais difícil ele chegar a ser indicado como Melhor Filme, já que o embate deste ano para uma das cinco vagas está grande.

CONCLUSÃO: Emocionante e divertida autobiografia de uma mulher que nasceu no Irã e viveu, desde a sua infância, as mudanças radicais pelas quais o seu país passou. Mais que uma história que aborda a política e as mudanças sociais naquele país, é uma história sobre a valorização da família, a busca da identidade própria e a necessidade de buscar uma vida melhor em outro país.

ATUALIZAÇÃO (08/01/2009): Passado praticamente um ano desta crítica, posso dizer que tive a alegria de ler a HQ que originou ao filme. Ela é tão boa quanto. Recomendadíssima para os que gostam de HQs (e das idéias feministas). 😉 No final, Persepolis foi indicado realmente ao Oscar de Animação em 2008, mas perdeu para Ratatouille. Em sua trajetória, o filme de Marjane Satrapi e Vincent Paronnaud ganharam 15 prêmios e foram indicados a outros 22. A nota no IMDb baixou para 8.

Por Alessandra

Jornalista com doutorado pelo curso de Comunicación, Cambio Social y Desarrollo da Universidad Complutense de Madrid, sou uma apaixonada pelo cinema e "série maníaca". Em outras palavras, uma cinéfila inveterada e uma consumidora de séries voraz - quando o tempo me permite, é claro.

Também tenho Twitter, conta no Facebook, Polldaddy, YouTube, entre outros sites e recursos online. Tenho mais de 20 anos de experiência como jornalista. Trabalhei também com inbound marketing e, atualmente, atuo como professora do curso de Jornalismo da FURB (Universidade Regional de Blumenau).

5 respostas em “Persepolis – Persépolis”

Olá Jussara!

Antes de mais nada, seja bem-vinda por aqui!

Também achei Persepolis excelente. E a HQ que originou o filme também é desta “estirpe”.

Agora, chegaste a conhecer o Irã naquela época? Se sim, seria interessante um depoimento teu sobre o que presenciaste por aqui. Seria uma honra.

Obrigada pela tua visita e pelo teu comentário, e volte por aqui mais vezes.

Abraços e inté!

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