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Eagle Eye – Controle Absoluto


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Um conceito indiscutível atualmente – mais do que em qualquer outra época da nossa trajetória humana – é de que toda ação provoca uma reação. Ou, em outras palavras, que cada gesto, cada atitude, cada ato provoca mudanças ao nosso redor que acabam transformando tudo – ou, pelo menos, muitas coisas. Pois Eagle Eye começa com essa idéia, de que uma decisão sobre o terrorismo pode levar não apenas a muitas mortes de civis mas, pior que isso, a um intricado plano de ataque mortífero no território teoricamente mais seguro do planeta: os Estados Unidos. E envolvendo civis aparentemente inocentes.

A HISTÓRIA: O governo dos Estados Unidos busca um procurado terrorista em um território inóspito no Oriente Médio. Mesmo utilizando os recursos mais avançados de espionagem, eles conseguem uma confirmação de apenas 51% da identidade de Majid Al-Khoei. Na hora H o presidente (Madison Mason) decide atacar – mesmo indo contra o parecer do secretário de Defesa George Callister (Michael Chiklis) -, o que acaba criando uma crise internacional e uma série de ataques terroristas contra embaixadas norte-americanas em vários países. Inesperadamente, o jovem atendente de uma loja de fotocópias, Jerry Damon Shaw (Shia LaBeouf), e a assistente legal e mãe de um garoto (Cameron Boyce) que estuda música, Rachel Holloman (Michelle Monaghan), se vêem envolvidos em um complexo plano para atacar figuras fundamentais do poder norte-americano.

VOLTANDO À CRÍTICA (SPOILER – aviso aos navegantes que boa parte do texto à seguir estraga as surpresas principais do filme, revelando momentos importantes da história, por isso indico que continue a ler apenas quem já assistiu a Eagle Eye): Adoro filmes que parecem uma coisa e se mostram outra completamente diferente. Inicialmente este Eagle Eye parecia um enredo de plano anti-terrorista e a devida represália dos “inimigos” dos Estados Unidos. Ledo engano. O filme é bem mais interessante do que isso.

SPOILER – Realmente não siga lendo se não assistiu ao filme e se não quiser estragar as principais surpresas dele. Quando o enredo passou de ser apenas um jogo de Estados Unidos versus Terroristas e passou a trazer para os dias atuais de paranóia a figura de um super-computador como o HAL 9000, do clássico 2001 – Uma Odisséia no Espaço, de Stanley Kubrick, eu ganhei o meu dia. Achei fantástica essa “adaptação” realista daquela figura onipresente e onisciente tão conhecida para os dias atuais. Eagle Eye acaba transportando para o cinema também a paranóia de muita gente sobre a capacidade cada vez maior do controle social através de celulares, cartões de banco e computadores, para citar apenas os bens mais “rastreáveis”. No fundo, o filme é um prato cheio de idéias bastante exploradas em outros meios – filmes, livros, estudos científicos e “teorias da conspiração” – que, misturadas, se transformam em um interessante enredo de ação e suspense.

Não é todos os dias – e, na verdade, algumas vezes não é nem uma vez por semestre – em que encontramos um filme de ação realmente inteligente. E, dizendo isso, não quero dizer que ele seja complexo demais ou cheio de “discursos”, mas que ele tem boas idéias apresentadas de maneira convincente e, o melhor, sem estragar o ritmo dos filmes do gênero. Pois Eagle Eye consegue essa façanha. Mérito dos roteiristas John Glenn, Travis Wright, Hillary Seitz e Dan McDermott (este último o autor também da idéia original que gerou o posterior roteiro) e, principalmente, do diretor D.J. Caruso.

O filme realmente tem um ritmo eletrizante e instigante. Por boa parte do tempo você realmente acredita que Jerry Shaw e Rachel Holloman estão sendo vítimas de um grupo de terroristas eficaz. Até um certo ponto, inclusive, temos dúvida se Shaw, especialmente, é o rapaz que diz ser – um “sem futuro” que trabalha em uma loja chamada Copy Cabana – vamos combinar que este nome é de rolar de rir. Ninguém pensou no trocadilho com Copacabana? Hilário!

A dúvida sobre Shaw não dura muito. Acho que, mais precisamente, dura até o envolvimento de Rachel Holloman no jogo de gato-e-rato. Afinal, ela realmente não tem nenhum perfil para ser terrorista. E daí entra em cena outra idéia ainda mais complicada: de que qualquer pessoa pode ser “acionada” de uma hora para a outra e obrigada a seguir ordens para salvar a própria pele – ou a de outras pessoas. Uma idéia um tanto exagerada, é verdade, mas que acaba sendo convincente no filme. 😉

Mas o bacana mesmo é quando entra em cena o supercomputador Ária. Desenhado para ser o “cérebro pensante” que controla todas as informações de civis disponíveis eletronicamente, Ária foi criado para ajudar o governo estadunidense em controlar a defesa em seu próprio território e auxiliar nas decisões de segurança nacional. Mas como ocorreu com o famoso HAL 9000, Ária “sai dos trilhos” quando analisa os erros humanos e decide, por sua conta, tomar as rédeas da situação. Claro que não vamos exagerar… Ária não tem a complexidade de HAL 9000 e nem Eagle Eye tem a filosofia de 2001 – Uma Odisséia no Espaço. Mas realmente é interessante ver uma adaptação daquela idéia para a vida “normal” e praticamente possível desta fobia pela segurança dos Estados Unidos.

Vale um capítulo à parte algumas das várias referências do filme. Começando pelos “codinomes” utilizados no início de Eagle Eye: Valhalla, Thor e Loki. Todos com origem em lendas nórdicas. Valhalla, uma palavra menos conhecida do “trinômio de identidades”, seria o lugar, na mitologia nórdica ou escandinava, onde os guerreiros vikings eram recebidos depois da morte. E os outros dois nomes… para os fãs de HQ’s eles são velhos conhecidos: Thor e Loki são os filhos de Odin, o “Deus supremo de Asgard” (o céu dos nórdicos). E mesmo Ária… o nome não tem origem nórdica, mas musical. Ela se refere a uma composição escrita para um solista. Nada mais propício nesta história, verdade?

O interessante do filme é que ele acaba mexendo em vários elementos possíveis. Vejamos: não seria a primeira vez que os Estados Unidos atacam um alvo sem ter certeza sobre possíveis culpados. Também não seria algo inédito que, após um ataque equivocado, embaixadas e outros alvos civis norte-americanos fossem atacados como retaliação por homens-bomba ou por terroristas. Também se sabe que governos como o dos Estados Unidos gasta bilhões de dólares por ano para investir em sistemas de informação, tecnologia e monitoramente de dados. Há quem especule que um computador como o Ária está quase em funcionamento. Ele ainda é ficção… ainda.

Finalmente assisti a um filme com Shia LaBeouf que eu gostei. Em Eagle Eye ele acaba “interpretando” um papel duplo: dos gêmeos Jerry e Ethan. Ok que, no final, Ethan praticamente não aparece na história. Mas apenas a interpretação dele de Jerry vale o dinheiro que lhe pagaram. Gostei também de Michelle Monaghan. Mas o curioso mesmo foi ver nomes como Billy Bob Thorton e Rosario Dawson em papéis coadjuvantes. Pois sim… Billy Bob Thorton interpreta o agente do FBI Thomas Morgan, enquanto Rosario Dawson interpreta Zoe Perez, do setor de Investigações Especiais da Força Aérea – da qual fazia parte Ethan Shaw.

As única “barrigadas” do filme, para mim, ocorrem depois que o “mistério” é desvendado. Ou seja: a operação um bocado desesperada de Zoe Perez e do Major William Bowman (Anthony Mackie). Aliás, eu diria que os ataques da dupla contra Ária e a “defesa” dela são os únicos momentos praticamente “dispensáveis” do filme. O restante está bem costurado e acaba ficando interessante na história – exceto talvez o final dos “tiros para o ar”, um tanto “antiquado” e previsível demais. Aliás, alguém poderia me explicar porque nos filmes eles nunca atiram nas cabeças das pessoas?? 😉 Também achei um pouco ridícula a “facilidade” do acesso de Jerry até o local da apresentação dos músicos mirins… ok, não se pode pedir lógica todo o tempo em um filme de ação, mas eles estavam indo tão bem até ali…

No geral, o filme é muito bom e acima da média do gênero. Não por acaso um dos produtores de Eagle Eye é o “visionário” Steven Spielberg. Vale citar o trabalho mais que competente do diretor de fotografia Dariusz Wolski e do compositor Brian Tyler. Gostei também da edição correta de Jim Page.

NOTA: 9.

OBS DE PÉ DE PÁGINA: Eagley Eye custou um bocado para os estúdios envolvidos na produção:  a “bagatela” de US$ 80 milhões. Mas o filme mandou bem e conseguiu lucrar… apenas nos Estados Unidos ele faturou pouco mais de US$ 100 milhões. Somado a isto temos que somar o restante da bilheteria no mundo e, com certeza, o sucesso que o filme fará nas videolocadoras.

D.J. Caruso tinha filmado antes Disturbia, outro filme estrelado por Shia LaBeouf – que eu ainda não assisti, mas está na minha lista. Antes ele dirigiu a Two for the Money, com Al Pacino e Matthew McConaughey. Mas o forte dele até hoje foi, realmente, as produções para a TV – incluindo séries como The Shield e Smallville. Acho que ele tem futuro.

Por sua vez, o homem “por trás” da idéia original do filme e um de seus roteiristas, Dan McDermott, estreou nos roteiros com este filme. Antes ele tinha escrito 13 episódios da série Angela’s Eyes.

Mas se o filme foi razoavelmente bem de bilheteria, não se pode dizer o mesmo a respeito da crítica… os usuários do site IMDb conferiram apenas a nota 6,8 para o filme, enquanto que os críticos que têm textos publicados no Rotten Tomatoes dedicaram 116 críticas negativas e apenas 43 positivas para a produção. Especialmente os críticos torceram o nariz para o filme.

Eagle Eye é uma co-produção da Alemanha com os Estados Unidos, mas foi todo filmado no segundo país – com locações na Califórnia, em Chicago (Illinois) e na Flórida.

Algo que não comentei antes: ainda que o “mote” principal de Eagle Eye não seja esse, mas o filme acaba tratando um bocado do tema “família” na história, seja pelo personagem de Jerry Shaw, seja pelo de Rachel Holloman. Ambos lutam para preservar os seus laços familiares, ainda que tentem fazer isso preservando muito o seu espaço e “liberdade”.

Curioso que as notas de produção do filme declaram que a idéia original de Eagle Eye surgiu há vários anos na cabeça de Spielberg. O diretor, contudo, mesmo fascinado pela idéia de que a “tecnologia está em tudo”, não teve a coragem de produzir este filme antes porque achava que ele pareceria muito “ficção científica”. Acho que ele teria conseguido um efeito muito melhor se tivesse “adiantado” uma tendência. Agora, o filme parece quase previsível demais. Curioso também que Spielberg tinha planejado filmar Eagle Eye mas que, ao se envolver no novo Indiana Jones, ele acabou entregando o projeto para o diretor do sucesso Disturbia – filmado pela DreamWorks, estúdio do qual ele é sócio.

Para muitos – como para mim – a aparição de Shia LaBeouf foi algo meteórico. Mas buscando mais informações sobre o ator reparei que ele tem 10 anos de carreira… começou a trabalhar mais “seriamente” em 1998 ao contracenar no filme para a TV da Disney Meu Amigo Einstein. Depois, ainda na Disney, ele estrelou a série Mano a Mana que lhe rendeu, em 2003, um Emmy por melhor atuação em série de TV dramática. Quem diria!! Ainda assim, segundo sua biografia, LaBeouf começou a carreira aos 11 anos quando contratou um agente para ajudá-lo a trabalhar – a vocação teria surgido antes, aos três anos, quando “interpretava” papéis para distrair os pais em casa.

Eagle Eye ganhou um prêmio que eu nem sabia que existia: “melhor equipe de trabalho” no California on Location Awards, um prêmio criado em 1994/1995 que celebra o trabalho de excelência dos profissionais locais.

Não sei se eu fui a única a ficar me perguntando: “Mas realmente o gêmeo Jerry Shaw poderia se passar pelo irmão em uma identificação como a que pede Ária?”. A verdade é que fui buscar mais informações e os chamados gêmeos monozigóticos possuem, realmente, uma carga genética idêntica. Mas daí ao tom de voz e tudo o mais ser identificado como igual pela máquina… não tenho tanta certeza se isso é possível. Mas ok, não vou complicar mais a análise deste filme – ou seja, uma obra de ficção e que não precisa ser “plausível”.

CONCLUSÃO: Um competente filme de ação sobre o potencial de erros da política de defesa dos Estados Unidos e os possíveis efeitos que podem acarretar a partir destes equívocos. Um filme que trata sobre terrorismo na mesma medida que aborda o uso da tecnologia para o controle “social” ou de “massas” com a desculpa de preservar a segurança de algumas nações. Eagle Eye acaba se mostrando um filme com ritmo e, ao mesmo tempo, com bastante inteligência. Tem interpretações condizentes com a história e uma condução técnica muito boa. Recomendado especialmente para quem assistiu a 2001 – Uma Odisséia no Espaço de Stanley Kubrick. 🙂

ATUALIZAÇÃO (em 4/1/2009): Para quem leu esse texto antes e agora viu que eu baixei a nota dele, vou me justificar: depois que eu assisti a Milk e resolvi dar para ele a note 9,5, pensei que outros filmes comentados aqui antes estavam supervalorizados, como este Eagle Eye. Por isso resolvi dar uma nota que eu achei mais justa para ele e os demais filmes que haviam ganho uma nota bem elevada nos últimos tempos.

Por Alessandra

Jornalista com doutorado pelo curso de Comunicación, Cambio Social y Desarrollo da Universidad Complutense de Madrid, sou uma apaixonada pelo cinema e "série maníaca". Em outras palavras, uma cinéfila inveterada e uma consumidora de séries voraz - quando o tempo me permite, é claro.

Também tenho Twitter, conta no Facebook, Polldaddy, YouTube, entre outros sites e recursos online. Tenho mais de 20 anos de experiência como jornalista. Trabalhei também com inbound marketing e, atualmente, atuo como professora do curso de Jornalismo da FURB (Universidade Regional de Blumenau).

3 respostas em “Eagle Eye – Controle Absoluto”

Gostei da sua crítica e de vc ter mantido sua opinião sobre o filme, mesmo que o público em geral (através do IMDB) e os críticos de cinema (Rotten) o tenham qualificado apenas como razoável.
Parabéns!

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Oi Gilvan!

Que bom te ver por aqui novamente!

Vou te contar um segredo: eu nunca mudo a minha opinião por causa dos outros. hehehehehehehehehehehe
Sério mesmo. Gosto de ver o que o público em geral (através do IMDb) e os críticos (pelo Rotten Tomatoes e por outros sites) estão dizendo, mas não dou muita bola para eles não… o que muda o meu conceito sobre os filmes é o tempo. Pois sim. Normalmente a minha opinião visceral sobre alguma produção vai diminuindo conforme o tempo passa e eu vou perdendo aquele “calor da hora”.
Claro que levo em conta o que as pessoas dizem – especialmente vocês, que comentam aqui no blog -, mas dificilmente eu mudo radicalmente de opinião porque alguém ou a maioria diz o contrário. Sou besta mesmo. hehehehehehehe. Ainda assim, estou sempre disposta a ver outras “maneiras de ler” um filme. Isso sim pode mudar os meus conceitos… se vejo um argumento bem escrito, isso pode ampliar meus horizontes e me fazer gostar (ou deixar de gostar) de algo que eu tinha visto antes.

A verdade é que realmente gostei deste Eagle Eye. Achei que ele tem problemas na história, como falei no texto acima, mas acho também que ele acerta em vários pontos. E sempre é bacana alguém fazer uma referência a um clássico com competência, né?

Obrigada por mais este teu comentário! E volte mais vezes. Um grande abraço!

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