Todo esse som que nos rodeia também nos define. E não é pouco barulho. Afinal, escolhemos o local onde vivemos, correto? Sim e não. Como bem reflete O Som ao Redor, muitas vezes vivemos onde decidimos morar e, outra vezes, herdamos esse ambiente que acaba nos afetando diretamente. Diferenciada na narrativa, esta produção brasileira, indicada para concorrer a uma vaga no próximo Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, surpreende nos detalhes, mas não tem o impacto que se espera de um filme vencedor.
A HISTÓRIA: Vários sons tomam conta da cena. Barulho de bichos, de caminhão freando, e aparece na tela os créditos do elenco, naquele estilo conhecido nos anos 1950 e 1960. Entra a trilha sonora, marcante. E surgem as primeiras cenas. Fotografias em preto e branco que mostram uma comunidade de trabalhadores, vastos campos e uma fazenda. Destas fotografias, passamos para duas crianças brincando.
A menina anda de patins “perseguindo” o garoto que anda de bicicleta. Eles brincam em um condomínio fechado onde estão outras crianças e alguns adultos. Algumas crianças observam um trabalhador. Em seguida, diversas cenas urbanas. Dentro de um apartamento, João (Gustavo Jahn) corre junto com Sofia (Irma Brown) para o quarto com a chegada da empregada Mariá (Mauricéia Conceição). Estas e outras histórias vão ser contadas no filme dividido em três partes.
VOLTANDO À CRÍTICA (SPOILER – aviso aos navegantes que boa parte do texto à seguir conta momentos importantes do filme, por isso recomendo que só continue a ler quem já assistiu a O Som ao Redor): Gostei demais do início deste filme. Mesmo sem aquelas fotos preto e branco fazerem sentido por boa parte da história, eu sabia que em algum momento saberíamos porque elas abriram a produção. E achei muito interessante a escolha de começar o filme apenas com diferentes tipos de som, deixar entrar a trilha sonora vigorosa de DJ Dolores e, em seguida, nos apresentar para aqueles “mundos tão diferentes” das fotografias do passado, estáticas e sem cor, e o presente colorido e movimentado de uma tarde de brincadeiras de crianças. Antagonismos que veremos em muitos momentos desta produção.
Logo percebemos também que as cenas urbanas e os sons que habitam o cotidiano de qualquer pessoa nestes cenários terão protagonismo na produção. Para quem já se aventurou recentemente a ir por aí na cidade sem música no carro ou no fone de ouvido ao pedalar ou andar, sabe que chega a ser assustadora a orquestra de sons que temos ao nosso redor. São dos mais variados possíveis. Criando, eles também, os efeitos mais diferentes nas pessoas.
Quem não está acostumado a andar com música o tempo inteiro – o que é o meu caso, porque sempre tenho alguma canção rolando no carro, quando dirijo, ou som no MP3 quando pedalo ou vou por aí – pode até sofrer com o estresse provocado pela poluição sonora urbana. No caso de O Som ao Redor, essa poluição nem é mostrada. Ela aparece aqui e ali, mas raramente misturada. Quase sempre cada som tem o seu espaço, como em uma sinfonia.
Apesar do cenário e da trilha sonora serem essencialmente urbanas neste filme, é no passado do interior, em uma fazenda onde antigamente existia um engenho, que surge a “alma” da história. (SPOILER – não leia se você não assistiu ao filme). Com isso, não me refiro apenas ao segredo que será revelado no final, da vingança que motiva dois personagens importantes para a história, mas também às condições desiguais das pessoas que orbitam O Som ao Redor.
O legado de Francisco (W.J. Solha), antigo senhor de engenho, ajuda a definir parte da vida dos herdeiros, principalmente dos netos João e Dinho (Yuri Holanda), que tem papel relevante na trama, assim como de um bairro praticamente inteiro do Recife, onde essa história está ambientada. Mesmo sem o poder que tinha outrora, quando comandava um batalhão de empregados e tinha um capataz para fazer o serviço sujo, Francisco segue tendo o poder dado pelo dinheiro. Um tanto extravagante, ele aparentemente faz o que quer e quando quer. Inclusive a ponto de acobertar o neto bandido.
Através do personagem de João, que vende apartamentos, o público de fora do país pode perceber como, de fato, muitas partes do país estão mudando o perfil de suas cidades. O processo de verticalização não é algo isolado em Recife, mas um fenômeno que está ocorrendo em diversas cidades de médio porte – nas de grande ele está se espalhando para bairros onde antes o que predominavam eram residências.
Assim como achei interessante aquele começo cheio de significados e escolhas estratégicas do diretor Kleber Mendonça Filho, gostei dos detalhes dos créditos. Tanto os iniciais quantos os finais fazem lembrar os filmes antigos, especialmente os dos anos 1960. Mas essas referências também criam um problema. Afinal, esses créditos iniciais e o próprio começo da narrativa me fizeram acreditar que veríamos um filme mais denso, que resgataria a tradição de filmes tensos e que contam a história de um mistério que será revelado com uma ou duas reviravoltas no caminho.
O fato do filme ser dividido em três partes também me fez acreditar que teríamos estágios bem marcados, e história praticamente isoladas que conversariam entre si. Que nada. Boa parte de O Som ao Redor fala do vazio cotidiano. Há tédio, insegurança e insatisfação espalhados por diversas partes. João, por exemplo, odeia o próprio trabalho e parece ter dificuldade em manter um relacionamento por muito tempo. O primo dele, Dinho, vive uma vida confortável e pratica pequenos crimes para ter alguma “diversão” frente a falta de vontade de fazer outra coisa.
E há ainda a personagem que ganha atenção de grande parte desta trama. Bia (Maeve Jinkings) é uma dona de casa que fica praticamente o dia inteiro enfurnada dentro de casa. Em um local com grades, portões trancados, ela se mantém trancada tendo como principais passatempos arranjar formas de controlar o cachorro do vizinho que vive latindo, fumar maconha sempre que pode e dar alguma disciplina para o casal de filhos. O marido dela (Dida Maia) aparece pouco e praticamente não tem voz no filme. Bia parece ser incapaz de dar muito afeto, mas também sabemos pouco sobre ela – apesar do espaço enorme que ela tem no roteiro do diretor.
Menos interessante dos personagens da trama, Bia parece ter tanta relevância no filme para nos mostrar que a “nova” classe média brasileira vive aprisionada e sem muitas aspirações além daquela de comprar uma televisão nova, preferencialmente maior que a do vizinho, e de apostar em novidades importadas para resolver os problemas do cotidiano. É a vida ordinária de quem conseguiu algum conforto e faz de tudo para esconder os seus pequenos “pecados” dos demais – vide o aspirador para disfarçar a fumaça e a cortina fechada durante a masturbação com a máquina de lavar.
Mesmo sendo uma crítica interessante da classe média de jovens casais, o espaço que foi dado para Bia e família me pareceu exagerado. Aliás, acho o filme longo demais. Outras histórias, como a dos seguranças que acabam cobrando dos vizinhos uma taxa para manter aquelas ruas mais seguras ou mesmo a de João, Sofia e Francisco, que parecem mais interessantes, acabam perdendo espaço. Assim, sabemos menos do que deveríamos do passado do engenho, por exemplo, ou mesmo sobre a figura de Sofia.
Um elemento presente do início até o fim da trama é a insegurança. E com ela, os artifícios, a maioria deles inútil, aos quais as pessoas recorrem para se sentirem um pouco mais seguras. A primeira parte de O Som ao Redor, intitulada “Cães de guarda”, apresenta a vida dos personagens principais da trama e marca a chegada de Clodoaldo (Irandhir Santos) na vizinhança. Até o início do serviço prestado por ele e seu grupo, as figuras mostradas pela produção viviam na busca por pequenos prazeres enquanto se esquivavam dos contratempos provocados pela violência – seja ela o furto do aparelho de CD de um carro, seja uma agressão aparentemente gratuita de uma vizinha, como Betânia (Mariangela Valença).
Até o começo do serviço da trupe de Clodoaldo, a sugestão do roteiro é que aquela vizinhança ainda vivia uma forma primária de busca de segurança, utilizando cães – como aquele que tira o sono de Bia -, muros e uma ou outra câmera de vigilância para se proteger. Depois de quase uma hora de filme, começa a segunda parte, “Guardas noturnos”, que marca o início do trabalho de Clodoaldo, Fernando (Nivaldo Nascimento), Ronaldo (Albert Tenorio) e sua equipe no trabalho de vigilância da rua da família de Francisco e nas adjacências.
A história evolui pouco entre a primeira e a segunda parte. A grande mudança, sem dúvida, é o trabalho dos vigilantes, e a estranheza que eles despertam em alguns vizinhos. Bia, por exemplo, comenta que acha muito suspeito que dois carros foram arrombados na noite anterior à chegada deles. Nesta segunda parte, há uma sequência muito boa, que é a da reunião dos moradores do condomínio de João. A disputa das pessoas para saber quem é mais “participante” na vida comunitária e a vontade de uns em desmerecer a opinião de outros revela muito desse nosso tempo, quando as pessoas parecem competir umas com as outras a cada oportunidade – mesmo quando é para discutir a demissão de um vigilante.
Finalmente o filme entra na terceira e última parte, após quase uma hora e 20 minutos, titulada “Guarda-costas”. Daí sim, a história começa a ganhar um pouco mais em informação e interesse, com a ida de João e Sofia para as terras do antigo engenhe do avô do rapaz. Os sons daquela antiga casa de “senhor feudal”, especialmente nas dependências dos empregados, e a incursão do jovem casal por locais da cidade do interior, com destaque para a sequência do cinema abandonado, são das melhores partes do filme.
Ao retornar para aquele ambiente e caminhar com os personagens por ali, depois voltando para o centro urbano do Recife, começamos a ver as peças se juntando. Nesta terceira parte, mais que nas duas anteriores, fica ainda mais evidente as diferenças entre as classes sociais, entre os que estão na posição de “chefes” ou “empregados”. A diferença social que existia no tempo dos senhores feudais e donos de engenhos segue repercutindo na sociedade, mesmo com a ascendência da “nova classe média” brasileira.
Mas ninguém parece estar muito interessado pela vida do outro, mas sim bastante centrados em si mesmos. Exemplo disso é a família de Bia – a mãe e os filhos estão muito ocupados consigo mesmos, sem manifestarem carinho ou preocupação verdadeira uns com os outros. E isso se dissemina por quase todos os outros personagens do filme – a família de Francisco, por exemplo, mantém o costume das reuniões familiares, mas vivem cada um bastante centrado em suas próprias rotinas.
O Som ao Redor é um filme que aborda estes aspectos de forma diferente, valorizando os sentidos da audição – através do som e da trilha sonora marcante – e da visão (com sequências muito interessantes e cenas belíssimas pipocadas aqui e ali). Um bom filme, sem dúvida, mas eu esperava mais. Não apenas porque eu tinha visto que ele tinha sido selecionado para o Brasil para representar o país no próximo Oscar, mas porque eu vi que ele foi muito elogiado pela crítica internacional. Aquele começo da produção também me fez acreditar que eu veria um filme cheio de estilo e significados fortes pela frente. O trabalho de Kleber Mendonça Filho tem intenções muito claras e é bem planejado. Mas senti falta de um pouco mais de emoção ou de impacto na história.
NOTA: 9.
OBS DE PÉ DE PÁGINA: Excelente a direção de Kleber Mendonça Filho. Ele forja cada cena com significado, mesmo quando o que ele quer explorar, como roteirista, é o vazio das conversas desinteressantes ou o vazio do cotidiano de atos repetidos. Mas cada ângulo da câmera é bem pensado, e a dinâmica é arrastada, muitas vezes, para reforçar o sentido que Mendonça Filho quer passar. Este é o primeiro longa de ficção da carreira do diretor que, antes, em 2008, lançou o documentário Crítico, que reúne 70 depoimentos de cineastas e críticos sobre o fazer no cinema.
Após a elogiada estreia em longas de ficção com O Som ao Redor, Mendonça Filho está trabalhando no próximo longa, Bacurau, que vai dirigir ao lado de Juliano Dornelles, que atuou como designer de produção em O Som ao Redor. Previsto para ser lançado no ano que vem, o filme será um drama com roteiro dos dois realizadores. Vale acompanhá-los.
Dois elementos da parte técnica do filme são fundamentais para que O Som ao Redor tenha a qualidade que tem: a direção de fotografia de Pedro Sotero, que contou com a codireção de Fabricio Tadeu, e a já comentada trilha sonora de DJ Dolores. Na direção, destaque para as cenas amplas, especialmente nos ambientes abertos e nos ambientes internos quando Mendonça Filho quer dar a noção de amplitude e busca apresentar o ambiente em que vivem as pessoas, e para a valorização do trabalho dos atores nos momentos mais diferentes – de diálogos ou de “satisfação solitária” dos personagens.
Achei um pouco complexo, até pela quantidade relativamente grande de personagens secundários, encontrar o nome dos atores principais desta produção. Os protagonistas já foram citados por aqui. Além deles, vale comentar o trabalho de Lula Terra como Tio Anco, a quem João vai procurar para saber sobre o rádio com CD que foi roubado de Sofia; e de Clara Pinheiro de Oliveira como Fernanda, a filha de Bia. Queria ter identificado o nome do ator que faz o irmão dela, mas não consegui esta proeza.
Neste filme, é fundamental a captação dos diferentes sons ambientais e, claro, dos diálogos entre os atores. E aqui, novamente, percebo um problema que chega a ser costumeiro em muitos filmes nacionais. A captação de sons funcionou bem, mas em muitos momentos achei muito difícil entender o que os atores falavam. Algumas vezes, porque o som estava baixo. Em outras ocasiões porque o sotaque, bastante carregado em alguns casos, impediu a minha compreensão. Quase procurei uma forma de ver o filme com legendas para ter o entendimento de 100% dos diálogos. Mas não gostei dele tanto assim para repetir a dose, admito. 🙂
Boa parte das minhas atenções, desde o início de outubro, estão voltadas para o próximo Oscar. É que a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood divulgou no dia 7 do mês passado a lista de 76 filmes que estão concorrendo a uma vaga na lista de indicados na categoria de Melhor Filme em Língua Estrangeira. Na mesma época, mais ou menos, começaram as primeiras apostas sobre fortes concorrentes que podem chegar até a reta final em algumas das principais categorias da premiação mais badalada do cinema mundial. O Som ao Redor, automaticamente, tinha entrado no meu radar.
Não será fácil para esta produção brasileira deixar pelo menos 71 concorrentes para trás – isso porque, normalmente, cinco filmes acabam sendo indicados na categoria para a qual ele está tentando uma vaga. Dos demais concorrentes, assisti apenas ao dinamarquês Jagten – para o qual publiquei esta crítica. Na comparação entre os dois, não tenho dúvidas de que Jagten é superior. Nesta preparação para o próximo Oscar, estou resgatando o tópico abaixo da conclusão, onde falo mais sobre as minhas impressões sobre as chances de cada filme.
O Som ao Redor teria custado aproximadamente R$ 1,86 milhão. Parte destes recursos veio através do apoio financeiro do Fundo Hubert Bals do Festival Internacional de Cinema de Rotterdam. A produção estreou no mesmo festival no dia 1 de fevereiro de 2012. Depois, O Som ao Redor fez um roteiro de festivais, passando por outras 12 premiações.
Neste caminho, conseguiu acumular 12 prêmios e ser indicado a outros cinco. Entre os que recebeu, destaque para os de Melhor Roteiro e o Prêmio do Júri do Festival Latino-americano de Cinema de Lleida; o Fipresci entregue pelo Festival Internacional de Cinema de Rotterdam; os de Melhor Longa Brasileiro pela escolha do público, Melhor Som e Melhor Diretor no Festival de Cinema de Gramado; o de Melhor Filme Brasileiro no Festival Internacional de Cinema de São Paulo; e os de Melhor Filme e Melhor Roteiro entregues pelo Festival Internacional de Cinema do Rio de Janeiro.
O candidato brasileiro ao próximo Oscar foi filmado totalmente em Pernambuco, nas cidades de Recife, Palmares e Vitória do Santo Antão.
Os usuários do site IMDb deram a nota 7 para esta produção. Uma boa avaliação. Os críticos que tem os seus textos linkados no Rotten Tomatoes foram mais efusivos, dedicando 33 críticas positivas e apenas três negativas para O Som ao Redor, o que lhe garante uma aprovação de 92% e uma nota média de 7,8.
Este filme entra na lista de produções que eu estou comentando aqui no blog para satisfazer dois desejos: o meu de ver ao máximo de filmes indicados ao Oscar 2014, e o de vocês, caros leitores, que votaram em uma enquete aqui no blog pedindo para que eu fizesse mais críticas de filmes brasileiros. A lista está crescendo.
Segundo o site Box Office Mojo, Neighboring Sounds, como foi chamado O Som ao Redor nos Estados Unidos, teria faturado pouco mais de US$ 60,2 mil nas bilheterias do país que vai escolher os melhores do ano no Oscar. Um desempenho fraco, muito fraco.
CONCLUSÃO: A valorização da vida cotidiana e do ordinário ganha com O Som ao Redor uma nova dinâmica. Os desafios, os encontros, a noção de família e as alegrias do dia a dia dão substância para a história. Enquanto nos distraímos com o cotidiano de moradores de uma rua, a maioria inquilina de um velho senhor de engenho, a verdadeira narrativa se transveste em mais um fato ordinário. Assim, de forma bastante sutil, O Som ao Redor nos mostra como as relações de poder seguem fortes, mesmo em tempos de desenvolvimento mais igualitário e após a “evolução” da sociedade, e de que os fatos realmente relevantes muitas vezes são ignorados pelas pessoas em meio a tanto barulho cotidiano.
Um belo exercício de cinema, mas que é prejudicado por alguns detalhes e pela falta de um pouco mais de “alma” na produção. Bem feito tecnicamente, exceto por algumas capturas de diálogos, ele surpreende ao revelar como somos prisioneiros de fatos do passado e do presente. O filme faz refletir na frase “o inferno são os outros”, porque cada personagem está incomodado com o que vem “do lado de fora”, sem perceber que ele próprio também cria incômodo para os demais e para si mesmo. Apesar das reflexões interessantes, o filme não emociona ou provoca impacto como gostaríamos. Claro que o problema está na nossa expectativa e não no filme. Ainda assim, vejo O Som ao Redor como um ótimo exemplo do cinema brasileiro conceitual que dá certo, mas que precisa ainda ser aprimorado para chegar mais longe.
PALPITE PARA O OSCAR 2014: O Som ao Redor tem alma e estilo. Mas não acredito que tenha a história universal que costuma ser premiada em um Oscar. Claro que espectadores de diversas parte do mundo podem compreender a sensação de insegurança, as desigualdades sociais e até se identificarem com algumas das cenas urbanas mostradas no filme. Mas há outras leituras, como a da continuidade do coronelismo e a emergência de uma nova classe média no Brasil que provavelmente só serão bem compreendidas pelo público local. Isso prejudica o filme no exterior.
Também acho que prejudica esta produção em uma disputa pelo Oscar o fato dela não ser arrebatadora. Ela não emociona, durante a narrativa, o que não é obrigatório, mas também não surpreende com cenas de impacto ou reviravoltas. E um destes pontos sim, vejo como obrigatório para um filme ser bem sucedido no Oscar. Preciso assistir ainda aos outros filmes que estão concorrendo a uma vaga na lista dos finalistas ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro para poder opinar definitivamente. Mas acho, desde já, que O Som ao Redor até pode chegar na lista dos cinco, mas não tem potencial para ganhar a estatueta.
Digo isso porque o único filme que eu assisti da lista até agora, Jagten (ou The Hunt), tem os elementos que eu comentei antes – é impactante, emociona e tem reviravolta importante na história. Enquanto Jagten é uma pancada e se revela universal, O Som ao Redor parece ser muito cerebral e arquitetado, sem emoção ou o impacto do concorrente dinamarquês. Sem dúvida vejo muito mais potencial de Jagten. Agora, falta ver aos demais filmes bem cotados.
ATUALIZAÇÃO (21/12/2013): A Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood divulgou ontem, dia 20 de dezembro, a lista de filmes que avançaram na disputa da categoria de Melhor Filme em Língua Estrangeira. O Som ao Redor ficou de fora da lista. Seguem na disputa os seguintes filmes: The Broken Circle Breakdown (Bélgica), An Episode in the Life of an Iron Picker (Bósnia e Herzegovina), The Missing Picture (Camboja), Jagten ou The Hunt (Dinamarca), Two Lives (Alemanha), The Grandmaster (Hong Kong), The Notebook (Hungria), La Grande Bellezza ou The Great Beauty (Itália) e Omar (Palestina).
7 respostas em “O Som ao Redor – Neighboring Sounds”
Assisti com muita expectativa esse filme, por isso talvez não tenha me surpreendido tanto, gostei da direção, conduzida de forma a fazermos parte daquele cotidiano, mas a relação com as fotografias do filme, e a época que se referem ficam muito superficiais durante a maior parte do filme. Achei longo também, mas confesso que o final me agradou e muito, coroando o teste de paciencia de mais de duas horas de filme onde pouca coisa acontece.
Gosto dos filmes autorais e na minha opinião as melhores, digo, as unicas produções que prestam no cinema brasileiro são as realizadas no nordeste. Espero que a possível indicação no Oscar, pelo menos divulgue esses competentes trabalhos.
E mais uma vez parabéns pelo site!! Abraços!!
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ótimo site, nao conhecia
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[…] nesta categoria que eu assisti até agora – incluindo o brasileiro O Som ao Redor, comentado aqui -, meu voto iria para Jagten. Acho que o filme de Thomas Vinterberg consegue um impacto maior no […]
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[…] qualquer forma, não tenho dúvida de que Le Passé (comentado aqui) e O Som ao Meu Redor (aqui) estariam em segundo plano na disputa. Se bem que a Academia sempre pode surpreender… De […]
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Prezados, só existe uma maneira de se entender e gostar 100% deste filme: é considerá-lo como uma parábola da proteção contra a violência. E a chave é entender qual a relação que tem o cão que late no filme com os Seguranças da rua… eu percebi esta relação, sutil, inteligente, sagaz… e considero O SOM AO REDOR uma pequena obra-prima… que venha o Oscar…
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Primeiramente, foi uma ótima e ampla crítica apresentada pela blogueira, mas achei controversa em certos aspectos. Já o filme em si, me chegou por recomendação, mas sinceramente não me tocou nem um pouco.
Achei curiosa a proposta, apesar do tema girar em torno de certo clichê de filmes nacionais do início produzidos entre o final dos anos 90 e início dos 2000. Achei curiosa no sentido de colocar o som, algo que costuma poluir o cotidiano urbano como centro da atenção, relacionando com aspectos de um cotidiano de um grupo de pessoas de modo de vida caricaturalmente urbano. propondo despertar perspicácia, mas no final vi uma arte um tanto crua. Pegou um cotidiano urbano, que emblematicamente transparece egoísmo, insegurança e uma justaposição de diversidades, mas que foi abordado de forma muito realista. E como se olhássemos uma realidade crua acabando prevalecendo uma análise protocolada evocando elementos descritivos alegóricos de conceitos científicos (como foi o caso da análise da blogueira e de comentários que traz “relações de poder”,”senhores feudais”, discriminações sociais, etc.), mas como arte mesmo, trouxe perspicácia ou criatividade apenas em detalhes, mas que pouco se orquestraram na composição da obra. E no final se revelou uma trama de vingança que pareceu exagerada, novamente de forma crua tentando abordar talvez um aspecto da potencialidade vida cotidiana e a dualidade da “microfísica do poder” (urgh! prometo jamais escrever isso).
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[…] Como a história mesmo sugere, Aquarius foi totalmente rodado na cidade de Recife, Pernambuco, cidade natal do diretor e local que ele costuma retratar em suas produções. Do diretor eu já tinha assistido ao bem elogiado O Som ao Redor (com crítica neste link). […]
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