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The Substance – A Substância


Finalmente cheguei até The Substance. Sim, eu sei que quase todo mundo assistiu esse filme em 2024, quando ele bombou e repercutiu bastante. Eu demorei mais tempo, porque admito que não gosto muito quando um filme entra no “hype”. Mas não dava mais para ignorar The Substance. Afinal, a interpretação de Demi Moore pode levá-la a ganhar o Oscar… ou não. Pode ser nossa Fernanda Torres, com sua magistral interpretação de Eunice Paiva em Ainda Estou Aqui (comentado por aqui). Logo descobriremos.

O que posso dizer, assistindo a esse filme há algumas semanas, é que entendo o hype sobre ele. É um filme realmente interessante, surpreendente, mas um pouco difícil de assistir em algumas partes. Recomendo apenas para quem está com o estômago em dia (e forte). Vai precisar para ver esse filme.

A HISTÓRIA

Um ovo quebrado, com sua gema e clara bem definidos sobre uma superfície azul. Duas mãos cobertas com luvas azul escuras chega perto e injeta com uma agulha um líquido verde na gema do ovo. Não demora muito tempo para a gema que apareceu inicialmente “gerar” uma nova gema, parecida com a primeira, mas um pouco menor. Corta. Uma música entra em cena, e vemos trabalhadores colocando uma nova estrela na calçada da fama de Hollywood.

Vemos o nome de Elisabeth Sparkle (Demi Moore) e o símbolo que representa que ela é uma estrela da indústria do cinema. Quando recebe a homenagem, ela é celebrada, há festa, vários cliques de câmeras. Depois, o tempo passa. Muitas pessoas fazem fotos no local. Mas essa lembrança vai se perdendo com o tempo, e o mesmo acontece com a própria homenageada, que já não encontra as mesmas oportunidades conforme envelhece.

VOLTANDO À CRÍTICA

(SPOILER – aviso aos navegantes que comento bastante do filme nesta parte da crítica, então recomendo que só continue a ler quem já assistiu a The Substance): Assisti a esse filme há algumas semanas. Sempre que possível, gosto de falar sobre o que eu assisti logo em seguida, para não perder as primeiras impressões e o que de mais forte ficou da experiência que cada filme me proporcionou. Mas nos últimos anos isso tem sido um pouco difícil de fazer porque a correria está grande.

Mas agora o relógio está correndo rápido e tenho que apertar o passo. Por isso vou escrever uma crítica mais sucinta desta vez, me perdoem. É que o Oscar se aproxima… só falta uma semana para a grande premiação de Hollywood. E bem, eu gostaria de ter assistido ao menos aos principais concorrentes na disputa. The Substance se torna importante nesta tentativa nem tanto porque ele tenha chances na categoria principal do Oscar. Mas porque, como vocês devem saber, Demi Moore é a grande concorrente de Fernanda Torres na disputa pelo Oscar de Melhor Atriz.

Bem, isso é o que realmente me atraiu a ver The Substance. Claro, eu sabia sobre o “buzz” que o filme despertou no ano passado. Quando ele estreou, quase todo mundo falou sobre ele. Comentaram sobre como ele era surpreendente e tudo o mais… mas sempre que um filme faz muito barulho, acabo tendo um pouco de preguiça de assistir a produção quando o auê está no seu auge. Acabo vendo tempos depois ou até passo de assistir. Mas voltei a The Substance porque, caso Demi Moore realmente levar a estatueta para casa, eu gostaria de saber se foi mega injusto ou não.

O que posso dizer a respeito? Bem, que eu vou entender se ela ganhar o Oscar. Ela, de fato, merece? Avaliando as principais concorrentes – só não vi ao trabalho de Cynthia Erivo em Wicked -, eu diria que não será totalmente injusto, ainda que, francamente, e não por eu ser brasileira, mas por amar cinema e acompanhar essa indústria com atenção há mais de 30 anos, acho que Fernanda Torres é quem realmente faz o melhor trabalho do ano (ao menos entre as concorrentes).

Então sim, eu acho que Fernanda Torres merece e deveria ganhar o Oscar de Melhor Atriz porque ela faz um trabalho soberbo, exemplar, do melhor cinema. Mas caso Demi Moore realmente levar o prêmio para casa, eu vou entender. Como entendo os exageros da diretora e roteirista francesa Coralie Fargeat em The Subtance. Dá para entender, mesmo que não concordemos, com ambos.

O que fará Demi Moore ganhar o Oscar, caso isso realmente acontecer? Será apenas pela sua performance em The Substance? Não acredito. Como sempre, o Oscar não avalia apenas cada trabalho de forma individual. Nem sempre o prêmio é justo e muitas vezes ele não premia o melhor ator, atriz, diretor ou filme, de fato. Muitas questões entram em jogo. No caso de Demi Moore, sim, ela faz um baita trabalho nesse filme. Isso é inegável. Não será injusto – como anteriormente o Oscar foi em várias ocasiões, inclusive quando Gwyneth Paltrow ganhou de Fernanda Montenegro -, mas também não será justo.

E como isso é possível? Não ser injusto e ao mesmo tempo não ser justo? Porque se o Oscar realmente premiasse a melhor, teríamos Fernanda Torres ganhando o prêmio. Mas Demi Moore pode levar a estatueta para casa porque ela faz um belo trabalho nesse filme, mas por causa de todo o contexto de sua história. Ela é uma atriz que perdeu diversas oportunidades conforme foi envelhecendo e nunca foi reconhecida por seu talento, apesar do sucesso comercial de vários de seus filmes. Então ela configura uma história de “redenção”, de alguém que já foi importante para a indústria, depois perdeu espaço e agora retorna em um papel ousado, algo que Hollywood adora.

Por isso comento que se Demi Moore ganhar o prêmio, não terá sido apenas por seu bom trabalho em The Substance. Dá para entender se isso acontecer, apesar de ser um pouco injusto com o trabalho superior de Fernanda Torres. Acho que a disputa ainda está em aberto, algo que não seria possível dizer há dois meses. Naquele momento, era meio óbvio que a disputa na categoria Melhor Atriz ficaria entre Demi Moore e Mikey Madison (de Anora, com crítica neste link). Mas a campanha de Ainda Estou Aqui foi crescendo, Fernanda Torres ganhou o Globo de Ouro de Melhor Atriz – Drama e a disputa ficou mais acirrada.

Para mim, seja pela ótima campanha que Ainda Estou Aqui fez nos Estados Unidos nas últimas semanas, seja pela potência da torcida brasileira nas redes sociais, a disputa para Melhor Atriz ficou muito mais acirrada. Agora, o confronto me parece ser franco entre Demi Moore e Fernanda Torres. Difícil acertar quem vai levar. Por justiça, por mérito, por realmente o melhor trabalho do ano, seria Fernanda Torres. Mas, novamente, não acharei totalmente injusto se Demi Moore levar.

Até Mikey Madison “surpreendendo” e levando o prêmio eu não acharia de todo injusto. Apesar de Anora ser, a meu ver, um filme mais fraco e menos interessante entre os principais títulos em disputa neste ano, tenho que admitir que Mikey Madison é o grande nome da produção. Ela faz um belo trabalho. Ainda que eu ache tanto o papel dela quanto o de Demi Moore muito mais exagerados e menos sensíveis e complexos do que o de Fernanda Torres. O talento verdadeiro, para mim, está nos detalhes. Fernanda Torres nos apresenta um trabalho magnífico com muita expressão no olhar. Algo muito mais difícil de se fazer do que nas interpretações das outras atrizes, que tem diversas sequências exageradas. Mas enfim, a disputa está boa esse ano.

Bueno, falei pra caramba de Demi Moore. Mas é porque ela realmente é um dos pontos fortes de The Substance. Juntamente com o ótimo roteiro e direção de Coralie Fargeat, uma diretora realmente digna de ser acompanhada, e da interpretação de Margaret Qualley como Sue, o alter ego de Elisabeth. Aliás, se tem algo que eu acho que jogue contra Demi Moore ganhar como Melhor Atriz este ano no Oscar é que eu vejo ela dividindo muito a cena com Margaret Qualley em The Substance. Muitas vezes, tive dúvidas sobre quem seria a verdadeira protagonista.

Ok, eu não cronometrei e possivelmente Demi Moore tem um pouco mais de tempo em tela do que Margaret Qualley mas, ainda assim, acho que as duas atrizes tem quase a mesma “responsabilidade” sobre o sucesso de The Substance. Ambas, a meu ver, fazem uma entrega tão boa uma quanto a outra. Até por isso acho injusto Margaret não ter recebido uma indicação como Melhor Atriz Coadjuvante.

Ok, ela não teria chances contra Zoe Saldaña, que é uma das bolas mais cantadas deste ano para vencer nesta categoria por seu trabalho em Emilia Pérez (com crítica por aqui), mas ela deveria estar na lista das indicadas, ao menos. Mas enfim, o Oscar tem dessas… algumas vezes, é injusto nas indicações. Outra vezes, entre os premiados.

Bem, após falar bastante sobre as razões que me levaram a assistir a The Substance e sobre as chances de Demi Moore no Oscar, vamos ao que interessa. Que é falar sobre The Substance. Eu tinha ouvido falar bastante do filme, claro. Ouvi que ele seria um dos filmes mais criativos e surpreendentes de 2024. Pois bem, de fato, ele é bastante fora do padrão. Especialmente de Hollywood.

Bastante ousado, tanto pela forma como pelo conteúdo, ele pega uma ideia e leva ela até o extremo. E quando eu falo isso, digo extremo MESMO. Sem exageros nessa avaliação. (SPOILER – não leia se você não assistiu ao filme ainda). A diretora e roteirista Coralie Fargeat quer, com The Substance, basicamente, nos levar a refletir sobre a cultura da beleza e sobre como a sociedade em geral – com Hollywood aqui como protagonista – despreza mulheres depois que elas saíram do “auge da juventude”. Este é um filme que eleva até a máxima potência a crítica da superficialidade e do culto à imagem e à beleza.

Porque sim, todas nós sabemos, que somos todas colocadas como objeto na sociedade. Interessa se você é bonita e jovem. Se você não está dentro dos padrões estéticos e do que é considerado realmente bonito, você perde oportunidades, visibilidade e, para muitos, nem existe. The Substance trata sobre isso focando no show business, começando com o foco em Hollywood e depois mirando suas lentes para a TV estadunidense. E, claro, em menor medida, esse paralelo pode ser feito para quase todas as partes.

Para contar essa história, Coralie Fargeat pega uma protagonista que está vivendo o “ocaso” de seu sucesso. Depois de fazer sucesso em Hollywood quando era jovem e bonita, Elisabeth consegue fazer carreira por muitos anos na TV. O paralelo mais óbvio é com a atriz Jane Fonda que, de fato, vivenciou essa jornada. Ela fez sucesso no cinema antes de ter êxito na TV como “musa do fitness”. Mas até esse “segundo estrelato” tem hora para acabar, já que a idade avançada chega para todos – ao menos para os que não morreram jovens e viraram “lenda” por causa disso.

Mas o que eu acho mais interessante em The Substance é que o filme não fica nessa camada superficial da crítica às aparências do show business. O que torna esse filme realmente interessante – e com uma temática mega atual – é que ele nos faz refletir sobre como a obsessão pela juventude e pela beleza cobra um preço caro de quem não consegue sair desse círculo vicioso. A parte realmente relevante da produção ocorre quando Elisabeth começa a perder o controle do “experimento” até o extremo do extremo. E ela faz isso sem realmente se dar conta que quem está se autodestruindo é ela mesma.

Porque sim, apesar de ter conviver com um alter ego, quem está no comando é Elisabeth. Não existem duas pessoas. Sue está para Elisabeth como Elisabeth está para Sue. (SPOILER – não leia… bem, você já sabe). Claro, como Elisabeth não admite sua obsessão pela fama e pelo reconhecimento que ela lhe traz, ela acaba compartimentalizando a própria história e o experimento trazido pela The Substance.

É sempre mais fácil jogar no “outro” a culpa que uma pessoa não quer admitir. Por mais que o ponto de contato de Elisabeth lhe explique, de forma reiterada, que não existe “ela”, referindo-se à Sue, mas apenas uma pessoa, Elisabeth segue em sua busca desenfreada pelo holofote – algo que ela só consegue agora com o alter ego. Tudo que vemos em cena, com Elisabeth sendo cada vez mais consumida – literalmente – por essa busca, é exagerado, verdade, mas muito proposital.

A roteirista e diretora Coralie Fargeat leva até o extremo do absurdo a busca por reconhecimento da protagonista de The Substance. Devo admitir que ela exagera nisso, nos apresentando quase um filme gore – digo quase porque não considero que todas as cenas com sangue e violência exageradas dessa produção são gratuitas. Sim, vejo exagero em cena, mas entendo os propósitos da realizadora. Eu teria feito menos? Sim, certamente. Admito que algumas sequências de The Substance são difíceis de assistir. Para o meu gosto. Mas, novamente, entendo o propósito de Coralie.

Ela quer nos levar ao extremo para entendermos que muitas pessoas estão fazendo exatamente isso com a vida delas. Os médicos que o digam. Proliferam histórias de mulheres – e homens – que estão sacrificando as suas saúdes e sua vida para tentarem ser “jovens para sempre” ou, ao menos, retardar o envelhecimento o máximo possível. Isso é triste e ilusório. E Coralie quer nos fazer quase passar mal, assistindo a algumas cenas de seu filme, para termos esse desconforto que deveríamos ter, de fato, com tantas histórias do tipo acontecendo ao nosso redor.

Nesse sentido, gosto do que Coralie nos apresenta em The Substance. Acho que ela eleva até a enésima potência o seu olhar crítico e irônico sobre uma era em que muito está se perdendo por causa de algo ilusório e que não faz sentido. E isso tem a ver mas não se restringe apenas ao cinema, à televisão e à indústria cultural como um todo. Claro, tudo isso nos influencia e é um espelho da nossa sociedade, mas o buraco é mais embaixo. São as pessoas que estão se perdendo de si mesmas e do que realmente é importante – não todas, claro, mas muitas.

E a falta de consciência sobre isso, que é o que leva a protagonista deste filme a chegar ao limite em que ela chega, é o mais assustador. Nesse sentido, The Substance acerta ao exagerar. Para nos mostrar que é difícil realmente as pessoas se darem conta, por mais ridículo que seu papel esteja sendo desempenhado frente à todos. E ainda há uma crítica naquela parte final do filme que vai para todos nós.

(SPOILER – não leia… bem, você já sabe). Apesar da sociedade em geral cobrar por “juventude eterna”, por beleza, carisma, jovens mulheres e afins, quando algo diferente sobe ao palco, rapidamente a plateia – e alguns homens em especial – se diz chocada e, especialmente, reage com violência, chamando o “subproduto” de sua obstinação como monstro ou algo pior. Aí começa o linchamento – social e virtual, muitas vezes. No fim, o indivíduo, a pessoa, a mulher, nunca importou.

Por tudo isso, achei esse filme muito interessante. Ele realmente nos apresenta uma história original, criativa, que nos faz refletir sobre um tema que já era importante no século 20, mas que é ainda mais relevante agora. Basta ver o que pessoas estão fazendo para tentarem ser “jovens para sempre”, sem que isso seja possível ou faça o menor sentido. Um tapa na nossa cara e um alerta importante para nossa sociedade. Sem contar a crítica ao show business, que é sempre importante de ser feita.

Para mim, os pontos fortes, como comentei antes, são o roteiro e a direção de Coralie Fargeat, realizadora interessantíssima dessa geração, e os ótimos trabalhos das atrizes Demi Moore e Margaret Qualley. Ambas muito corajosas em suas interpretações. Elas entregam muito. Vale muito ser visto, apesar do estômago forte que precisamos ter para acompanhar todas as cenas do filme. Algumas sequências bastante violentas e nojentas eu teria evitado, mas consigo entender a razão delas existirem, volto a dizer. No geral, um belo filme. Um dos melhores dessa temporada, sem dúvidas.

NOTA

9,3.

OBS DE PÉ DE PÁGINA

Procurei ser mais objetiva e direta nessa crítica para finalmente desovar esse texto e porque eu ainda quero assistir a The Brutalist antes do Oscar. E como nos falta apenas uma semana para a premiação máxima de Hollywood ser entregue, eu preciso ser mais objetiva.

The Substance é um filme exagerado. Com certeza. É como uma alegoria. Ele trabalha um tema muito atual e importante de forma extrema, exagerada, justamente para chocar e para fazer pensar. Não vejo problema nisso, até porque ele não exagera com mau gosto ou de forma absurda, pelo menos não durante grande parte do tempo. Existe sim, perto do fim, algumas cenas de violência que achei um pouco pesadas demais, mas, descontado isso, acho que o filme acerta no conteúdo e na forma.

Mesmo as cenas violentas, que tive um pouco de dificuldade de assistir, (SPOILER – não leia se você ainda não viu o filme), quando Sue ataca Elisabeth para tentar acabar com ela de uma vez por todas, tem um propósito de ser. Sue está virulenta, após descobrir que Elisabeth quase acabou com ela, e reage de forma extrema para tentar acabar com a imagem que ela não quer ter mais de si mesma – afinal, Elisabeth e Sue são a mesma pessoa. É como se Elisabeth quisesse destruir definitivamente a sua imagem envelhecida e viver só na pele da sua versão jovem, mesmo que isso fosse impossível.

(SPOILER – não leia… bem, você já sabe). Mesmo quando ela vira um monstro, o importante é o “show continuar”. Afinal, ela precisa continuar sendo aplaudida e admirada, mesmo que não exista mais nenhuma possibilidade para isso ocorrer na realidade. Mas o que Coralie quer nos mostrar, daquela forma exagerada, é que não existe bom senso, não existe mais contato com a realidade. Quando alguém fica obcecado com a aparência, com a fama, com o aplauso, com a beleza, nada mais importa. Mesmo que a realidade jogue na cara da pessoa que suas expectativas são irreais, ela não consegue perceber isso. Nesse sentido, o exagero da roteirista e diretora faz sentido e é bem-vindo. Chocando as pessoas, talvez, ela faça muitos caírem na realidade.

Por tudo isso, considero o roteiro e a direção de Coralie Fargeat dois pontos fortíssimos dessa produção. Gostei mais do roteiro de The Substance do que de Anora, por exemplo – dois filmes dessa temporada que concorrem na categoria Melhor Roteiro Original. Como comentei na crítica de Anora, vejo o filme tentando desconstruir e reconstruir diversos lugares-comuns, algo que The Substance não faz. Considero o filme de Fargeat muito mais original por isso. Gostei muito também da direção dela, sabendo valorizar muito bem o trabalho do elenco ao mesmo tempo em que valoriza alguns cenários e locações muito bem, criando tensão e valorizando alguns conceitos da produção.

Diretora francesa com 48 anos de idade, Coralie Fargeat tem no currículo cinco títulos como roteirista e sete como diretora. Ela estreou na direção com o curta Le Télégramme em 2003 e, de lá para cá, dirigiu outros dois curtas, uma minissérie para a TV, um episódio da série de TV Sandman e apenas dois longas. Antes de The Substance, ela dirigiu e escreveu o roteiro de Revenge, filme que comentei nessa crítica. Vejo que ela tem um estilo muito criativo e uma assinatura própria. Para mim, é um nome a ser acompanhado.

Mesmo com uma trajetória sem tantos títulos no currículo ainda, Coralie Fargeat conseguiu uma projeção considerável com The Substance. Com o filme, ela conseguiu três indicações ao Oscar: nas categorias Melhor Direção (merecidíssimo, devo dizer), Melhor Roteiro Original e Melhor Filme. Aliás, vale comentar que ela é a única diretora que concorre em sua categoria neste ano – todos os outros concorrentes são homens.

Além de disputar as três categorias acima, The Substance concorre no Oscar 2025 nas categorias Melhor Atriz para Demi Moore e Melhor Maquiagem e Cabelo. Ou seja, no total, cinco indicações ao Oscar. Segundo as bolsas de apostas, até o momento, The Substance lidera para vencer nas categorias Melhor Atriz e Melhor Maquiagem e Cabelo. Na categoria Melhor Atriz, liderada por Demi Moore, aparecem na segunda posição na preferência dos apostadores Mikey Madison e, em terceiro lugar, Fernanda Torres. Na categoria Melhor Roteiro Original, The Substance aparece na segunda posição, atrás de Anora.

Por falar em prêmios, já que estamos nesse tópico, até o momento The Substance ganhou 112 prêmios e foi indicado a outros 283 – incluindo nesse último número as cinco indicações ao Oscar. Vamos combinar que esses números são de deixar qualquer queijo caído. Impressionante! Muito reconhecido por crítica e público.

Entre os prêmios que recebeu, destaque para o Globo de Ouro de Melhor Atriz – Comédia e Musical para Demi Moore; para o BAFTA de Melhor Maquiagem e Cabelo; e para o Melhor Roteiro no Festival de Cinema de Cannes.

Aliás, falando em premiações… antes eu comentei quais são os fatores que ajudam Demi Moore em sua campanha para o Oscar de Melhor Atriz. Além dela fazer um belo trabalho em The Substance, e isso não dá para negar – mas acho ainda Fernanda Torres com um trabalho melhor que o dela -, temos como elementos em cena a coragem da atriz em assumir esse papel, que é ousado, e de incorporar a crítica que o filme faz, expondo seu corpo, sua idade e abraçando uma produção que não era nada óbvia para uma estrela de Hollywood. Tudo isso se junta ao conceito de “redenção”, de uma atriz que fez muito sucesso na juventude, foi muito reconhecida pelo público, mas nunca (ou quase nunca) pela crítica. Tudo isso é verdade. Porém… temos um porém.

The Substance é um filme alternativo, que segue o estilo crítico e, ao mesmo tempo, mergulha no terror – chegando até a roçar no estilo gore. Esse gênero não costuma ser premiado no Oscar. Ou pouco premiado. Então isso pode jogar contra o reconhecimento de Demi Moore. Resta saber se sairia ganhando, contra esse preconceito, a jovem estrela em ascensão Mikey Madison, que tem a seu favor o fato de ser americana, ser jovem e tudo o mais, ou a brasileira Fernanda Torres e seu trabalho magistral em Ainda Estou Aqui. Saberemos em uma semana.

Agora, voltando a falar de The Substance. Como comentei antes, os pontos fortes do filme são o roteiro, a direção e o trabalho das suas atrizes – Demi Moore e Margaret Qualley estão ótimas. Claro que o papel delas é menos complexo do que o de Fernanda Torres. Apesar disso, elas estão muito bem, mergulhando em seus personagens com vontade e sem exagerar para além do que o roteiro lhes pede.

Além delas, vale citar o trabalho de alguns coadjuvantes. Dennis Quaid faz um belo trabalho como o repugnante Harvey, um produtor de TV sem o mínimo bom senso, sem escrúpulos, que de forma exagerada representa os homens que lideram a indústria do entretenimento e que estão sempre atrás da próxima jovem garota bonita para comandar seus programas de TV e estrelar certos filmes; Edward Hamilton-Clark como Fred, uma lembrança do passado de Elisabeth e alguém que a vê como uma pessoa real e não uma fantasia criada pelo show business; e Gore Abrams como Oliver, o vizinho que muda da água para o vinho quando deixa de ver a “velha” vizinha e passa a dar em cima da jovem gostosa que entra em seu lugar.

Esses podem ser considerados atores em papéis coadjuvantes. Outros nomes tem aparições menores, quase como pontas, mas que acabam tendo relevância em uma parte da história. Vale citar, nesse sentido, Oscar Lesage como Troy, um dos caras que Sue pega desde que entra em cena; Robin Greer como o enfermeiro que apresenta a proposta de The Substance para a protagonista; Christian Erickson como o homem no restaurante que é a versão original do jovem enfermeiro – o paralelo de Elisabeth na história; e Hugo Diego Garcia como Diego, o novo namorado de Sue e que foge do apartamento quando Elisabeth ressurge.

Para além do elenco, existem aspectos técnicos da produção que chamam a atenção. Para começar, gostei da direção de fotografia de Benjamin Kracun e da trilha sonora de Raffertie. Para mim, dois elementos muito interessantes e que fazem diferença no filme. Claro que a Maquiagem e o Cabelo desta produção também são muito importantes. Trabalho esse desenvolvido por uma equipe de 48 profissionais.

Além desses aspectos, que considero os mais impactantes no filme, entre as características técnicas da produção, vale citar a edição de Jerome Eltabet, Coralie Fargeat e Valentin Féron, muito bem feita; o design de produção de Stanislas Reydellet; a direção de arte realizada por oito profissionais; o departamento de arte composto por 26 profissionais; a decoração de set de Cécilia Blom, Marion De Villechabrolle, Jacques Oursin e Pierre Strub; o departamento de som, que contou com 27 profissionais; os efeitos especiais realizados por sete profissionais; os efeitos visuais realizados por 31 profissionais; e os figurinos de Emmanuelle Youchnovski.

The Substance estreou no dia 19 de maio de 2024 no Festival de Cinema de Cannes. Depois, o filme participaria, ainda, de outros 19 festivais em diversos países. Coproduzido pelo Reino Unido e pela França, o filme teria custado apenas US$ 17,5 milhões, um orçamento super baixo para os padrões – especialmente por contar por duas atrizes que já tem reconhecimento. Interessante. Sem dúvida, um dos grandes sucessos de bilheteria e de crítica da temporada.

Por falar em grana, segundo o site Box Office Mojo, The Substance faturou US$ 77 milhões nos cinemas, sendo US$ 17,3 milhões apenas nos Estados Unidos. Um belo resultado para um filme com orçamento baixo. O que estimula a sua realizadora e outros produtores a investirem em filmes tão alternativos quanto. Vida longa ao cinema em geral, mas especialmente ao nada óbvio! Depois dos Estados Unidos, os mercados onde o filme se saiu melhor nas bilheterias foram o Reino Unido, a França, a Espanha e a Itália.

Apenas para comparação, para vermos como Ainda Estou Aqui virou um fenômeno global, o filme brasileiro já arrecadou, segundo o site Box Office Mojo, US$ 27,26 milhões nas bilheterias, sendo US$ 4,2 milhões apenas nos Estados Unidos.

Os usuários do site IMDb deram a nota 7,3 para The Substance, enquanto que os críticos que tem os seus textos linkados no Rotten Tomatoes dedicaram 55 críticas positivas e 10 negativas para essa produção, o que garantiu para The Substance o nível de aprovação de 85% e a nota média de 7,9. O site Metacritic apresenta o “metascore” 78, fruto de 49 críticas positivas, seis medianas e duas negativas.

Agora, antes de finalizar esse texto, vale citar algumas curiosidades sobre a produção. Reparei que o filme agradece ao conhecido ator Ray Liotta. Como ele não aparece no filme, inicialmente, não entendi a razão da homenagem. Mas ao ler as notas da produção, soube que o ator foi escalado para participar do filme em fevereiro de 2022, mas ele morreu em maio daquele ano. Ele faria o papel de Harvey, e acabou sendo substituído por Dennis Quaid.

Na história do filme, Elisabeth Sparkle completa 50 anos. A atriz Demi Moore, quando interpretou a personagem, tinha quase 60 anos.

A atriz Demi Moore disse que estava nervosa com a ideia de filmar totalmente nua aos 59 anos de idade, porque se sentia vulnerável. Mas ela foi tranquilizada e incentivada pela colega de cena, Margaret Qualley, que aos 29 anos de idade também ficou nua para seu papel. Interessante que Margaret Qualley é filha de Andie MacDowell, que dividiu cena com Demi Moore no filme St. Elmo’s Fire em 1985.

Em várias entrevistas, Demi Moore disse que ao ler o roteiro de The Substance, ela se lembrou de Ghost – um dos maiores sucessos da atriz em sua carreira. Ela fez esse paralelo porque ela disse que ao ler o roteiro dos dois filmes, teve a impressão de que as chances de cada filme ser um sucesso ou um desastre eram as mesmas. E que, por isso, ela aceitou o papel em The Substance. Interessante. Realmente faz sentido.

O ator Dennis Quaid ficou tão empenhado em fazer a cena de seu personagem no restaurante comendo camarões a mais nojenta possível que, para garantir que isso fosse realizado, ele comeu nada menos que dois quilos de camarão… realmente, é uma de várias cenas nojentas da produção. Ele está muito, mas muito nojento naquela sequência.

CONCLUSÃO

Um filme potente e bastante direto em sua mensagem. Criativo, ousado, mas um pouco “exagerado” além do meu gosto. Claro, quem ama cenas de terror no mais alto nível, vai bater palma para tudo. Eu gosto de filmes de terror e de suspense, mas achei a carga de The Substance um pouco pesada demais. Entendo a proposta da diretora e roteirista Coralie Fargeat ao levar a obsessão da protagonista até o extremo limite. Faz sentido, mas, ainda assim, achei desconfortável de assistir. Para mim, um dos filmes mais interessantes dessa temporada. Bastante ousado, com roteiro de fato criativo e com ótimas interpretações, toca em temas bem importantes e coloca o dedo na ferida de Hollywood. Achei melhor que seu franco concorrente, Anora. Vale ser visto, mas veja com parcimônia, especialmente nas cenas mais nojentas e duras de assistir.

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Por Alessandra

Jornalista com doutorado pelo curso de Comunicación, Cambio Social y Desarrollo da Universidad Complutense de Madrid, sou uma apaixonada pelo cinema e "série maníaca". Em outras palavras, uma cinéfila inveterada e uma consumidora de séries voraz - quando o tempo me permite, é claro.

Também tenho Twitter, conta no Facebook, Polldaddy, YouTube, entre outros sites e recursos online. Tenho mais de 25 anos de experiência como jornalista. Trabalhei também com inbound marketing, professora universitária (cursos de graduação e pós-graduação) e, atualmente, atuo como empreendedora após criar a minha própria empresa na área da comunicação.

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