Categorias
Cinema Cinema europeu Cinema norte-americano Crítica de filme Filme premiado Globo de Ouro 2025 Movie Oscar 2025

The Brutalist – O Brutalista


A Estátua da Liberdade de ponta-cabeça. Essa é uma das imagens que me ocorrem ao pensar em The Brutalist. Um filme sobre sobrevivência, busca por uma nova vida em um lugar onde pouco interessa quem você é ou sua história. O mais importante é o que você pode dar. Preferencialmente, o preço que você aceita dar por seu talento e, algumas vezes, por sua alma. Um filme sobre pós-guerra, tentativa de recomeço, desigualdades, injustiças, talento, propósito e o quanto os ricos podem ser podres. Uma bela produção, apesar de um tanto longa, mas que nos envolve por sua narrativa e qualidades. Entende-se porque chegou na lista dos melhores do ano, ainda que haja filmes melhores.

A HISTÓRIA

Começa com um grito. Em seguida, vamos uma jovem, Zsófia (Raffey Cassidy), claramente desesperada, sendo “incentivada” a ficar calma e a se sentar. O homem que fala com ela, e que não aparece em cena, diz que a “acompanhante” de Zsófia está fora. São dois homens que falam com ela em tom autoritário, ríspido e inquisitório. Um deles diz que ela falou que é a sobrinha da mulher que está fora. Ele pergunta se isso é verdade e questiona onde está a mãe da jovem. Zsófia está desesperada e não consegue falar nada, mas eles continuam a interrogando.

Atrás de Zsófia existe uma janela. Vemos o lado de fora. Um cenário que parece gelado e que lembra o de um campo de concentração por causa dos arames farpados e das cercas. O interrogatório segue, e um dos homens pergunta sobre o endereço antigo dela, se é verdade que ela era de Budapeste. Um dos homens comenta que, se ela não quer falar, ela pode escrever o que eles estão perguntando em uma folha de papel que tem na frente dela. A câmera se distancia e vemos melhor o cenário em que ela está. Uma sala pequena e, aos fundos, um soldado aparece. Corta. Em seguida, em uma carta endereçada para László (Adrien Brody), a mulher dele diz que está viva. Em breve vamos conhecer a história deles e da moça que apareceu no início do filme.

VOLTANDO À CRÍTICA

(SPOILER – aviso aos navegantes que boa parte do texto à seguir conta momentos importantes do filme, por isso recomendo que só continue a ler quem já assistiu a The Brutalist): Muito se falou que The Brutalist é um filme longo. Verdade que é bom sabermos disso antes de nos lançarmos a assistir a essa produção. Afinal, sempre esperamos algo em torno de duas horas. Mas, devo dizer, que não senti que essa produção seja longa demais.

Quando isso acontece, quando tempos pela frente um filme com cerca de 3h15 de duração e ele não nos parece longo demais, é porque temos uma produção bem conduzida do início ao fim. E isso realmente acontece com The Brutalist. Um filme dividido em diferentes capítulos, que narram a história de personagens ficcionais, apesar de parecerem tão realistas – só fui descobrir que László Tóth, sua esposa, Erzsébet (Felicity Jones) e Harrison Lee Van Buren (Guy Pearce) eram personagens criados e não papéis inspirados em pessoas reais após o filme terminar.

Uma produção com uma base sólida e que vai erguendo suas paredes pouco a pouco, como a obra que acompanhamos criada por László e que preenche boa parte da narrativa. Um belo trabalho do diretor e roteirista Brady Corbet, que desenvolveu o roteiro de The Brutalist juntamente com Mona Fastvold. O trabalho deles é tão bom e convincente que realmente acreditamos que as pessoas que vemos em cena existiram. Como indivíduos, não. Mas, certamente, como personagens que representam várias pessoas reais, sim.

Cheguei até The Brutalist por motivos óbvios. Quem me acompanha aqui no blog há algum tempo sabe que sempre procuro assistir aos principais filmes indicados ao Oscar a cada ano. Essa “missão”, que eu mesma me dei, começa entre novembro e dezembro e termina no final de fevereiro ou início de março – tudo dependendo da data em que o Oscar é apresentado. Sendo assim, há meses eu estava curiosa para assistir a The Brutalist. Porque ele era o único título entre os principais que me faltava para chegar na cerimônia do Oscar com maior propriedade.

Entre os principais concorrentes do ano – e aqui me refiro à categoria Melhor Filme -, eu já tinha assistido a Conclave (com crítica por aqui) e Anora (texto sobre ele aqui), mas faltava The Brutalist. O Oscar principal da noite de hoje – sim, chegamos no aguardado dia da entrega dos prêmios da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood – deve ficar entre essas três produções. Claro, zebras sempre podem acontecer. É impossível nosso queixo cair nesta noite, como aconteceu em 2020 com Parasite ganhando o Oscar não apenas na categoria Melhor Filme Internacional mas também como Melhor Filme?

Bem, desde 2020, sabemos que milagres acontecem e que, algumas vezes, em raras ocasiões, o melhor filme ou um dos melhores filmes realmente ganha o Oscar principal. Seria um sonho ver o melhor filme do ano, Ainda Estou Aqui (com crítica neste link), conseguindo este feito. É impossível? Não, mas bastante improvável. Falei mais sobre isso daqui poucas horas, quando eu escrever o texto de acompanhamento da entrega do Oscar, mas acho sim que após 97 edições do Oscar, finalmente vamos ganhar nossa primeira estatueta dourada.

A minha aposta principal é que Ainda Estou Aqui vença na categoria Melhor Filme Internacional. Temos chances, mas um pouco menos, de Fernanda Torres levar como Melhor Atriz. Para isso, ela terá que vencer a ainda favorita Demi Moore. Temos mais chances em Melhor Atriz do que em Melhor Filme, claro. Enfim, veremos… acho que tudo pode acontecer. Eu aposto em uma estatueta, com o Brasil podendo levar duas – a segunda seria a da Fernanda Torres. Três seria sonhar muito alto.

Então sim, cheguei até The Brutalist porque, apesar do filme não ser o favorito em Melhor Filme, não seria também uma total surpresa se ele levasse a estatueta principal da noite para casa. Afinal, ele já ganhou prêmios importantes esse ano. Eu diria que Melhor Filme realmente está entre Conclave, The Brutalist e Anora, nessa ordem. Veremos.

Uma coisa é certa: The Brutalist mereceu a indicação. Realmente é um filme muito bem construído e que nos conta uma história com diversos temas importantes para entendermos nosso passado e parte do nosso presente. É um filme “histórico”, entre aspas, já que trata-se de uma ficção, mas que foca em um tempo histórico bem definido, e, ao mesmo tempo, por incrível que pareça, é um filme bastante atual.

Afinal, infelizmente, como acontece com Ainda Estou Aqui, temas do século passado estão voltando com força nestas primeiras décadas deste século. Então sim, ao mesmo tempo que temos calhordas defendendo regimes de exceção e ditaduras, mesmo as transvestidas de democracia, temos muito do que The Brutalist nos conta acontecendo nos cenários que o filme aborda – Europa e Estados Unidos – e em outras latitudes também. Infelizmente, se a Humanidade avança com passos lentos em algumas direções, em outra ela parece não aprender com o passado e repetir velhos erros…

Estou falando, claro, sobre temas muito presentes em The Brutalist e que estão muito presentes no dia a dia de vários países da Europa, nos Estados Unidos e em outras partes, com destaque para a xenofobia, o preconceito com quem não tem condições financeiras e a exploração das classes mais abastadas daqueles que não tem o mesmo. Sem contar o antissemitismo, que não é tão forte no Brasil, mas sim em outras partes, e o preconceito com outras religiões que não são dominantes – isso sim, presente em todos os lugares, infelizmente.

Acho curioso, e devo fazer uma pausa aqui para comentar isso, como dois dos filmes favoritos deste ano exploram de forma muito franca e direta a podridão dos ricos – claro que há exceções para toda regra, mas a maioria dos ricos são sim desse jeito que vemos em tela. Tanto Anora quanto The Brutalist mostram o lado mais abjeto e deplorável dos ricos.

(SPOILER – não leia se você não assistiu ao filme). Enquanto em Anora eles tratam uma garota como menos que nada, em The Brutalist eles exploram o protagonista da forma mais vil possível, tratando ele com tal nível de desprezo que, na cena mais explícita sobre isso, Harrison Lee Van Buren o trata como um cão sarnento que ele pode estuprar em uma situação de extrema vulnerabilidade, quando László não pode se defender. Tanto os ricos de Anora quanto os de The Brutalist ainda se revestem da fantasia de “mecenas” ou de “bondosos”, porque estão dando algum “trocado” para a pessoa que eles exploram. Escória!

Esse, para mim, é o aspecto mais forte e contundente de The Brutalist. Esse desprezo das “classes” mais abastadas por todos os outros, por aqueles que não são iguais a eles. Mas o filme, claro, trata de muito mais. Aborda a dor e a necessidade de sobrevivência de todos que tiveram que deixar as suas casas, terras e países durante e após a Segunda Guerra Mundial, perseguidos por serem como são.

Infelizmente isso é algo que ocorre até hoje, em 2025. Quantas pessoas tem que deixar as suas casas, suas famílias, muitas vezes, seus países, por causa de guerras, conflitos, perseguições políticas ou religiosas? Isso acontece todos os dias. Acontece enquanto escrevo essas linhas. Esse é um dos temas desta produção. Essa fuga desesperada em busca de sobrevivência e de uma chance de viver em outro lugar.

O protagonista desta história, a exemplo de muitas pessoas que fazem isso hoje em dia, tem uma profissão, uma carreira e muito talento. Mas chega em um país estranho sem ter esse passado valorizado. Literalmente ele começa do zero, inicialmente sendo ajudado por um primo, Attila (Alessandro Nivola), que consegue um local pequeno para László ficar enquanto o primo lhe ajuda com sua empresa de móveis e projetos sob encomenda na área. Até que a esposa de Attila, Audrey (Emma Laird), deixa claro que a presença e permanência de László por ali não é bem-vinda. Esse é o primeiro golpe que o arquiteto recebe.

Na verdade, pouco antes, ele tem o desprazer de conhecer o ricaço Harrison Lee Van Buren e seu filho, igualmente desprezível, Harry Lee (Joe Alwyn). A péssima reação de Harrison frente à surpresa encomendada por Harry é o primeiro dos dois golpes fundamentais que László recebe em pouco tempo. Na sequência, podemos dizer. E isso será determinante para o que virá depois. Porque László passa a depender de caridade para ter onde dormir e aceita um subemprego, nada a ver com sua profissão ou talento.

Vulnerável daquela forma, ele acaba sendo uma “presa” fácil para Harrison quando o ricaço vê em László uma oportunidade de se dar bem. Claro, como acontece muitas vezes, Harrison se fantasia de “mecenas” e se reveste de “boas intenções”, dizendo aos quatro ventos que vai receber e manter László em sua propriedade, ajudar o protagonista a resgatar sua esposa e sobrinha da Europa, enquanto László desenvolve um projeto gigantesco para ele.

A ideia de Harrison é fazer um centro comunitário com várias “benesses” para a comunidade local colocando o nome da mãe dele, recém falecida, como homenageada. Algo realmente bacana, não é mesmo? Pena que isso seja apenas uma fachada. E aí The Brutalist nos faz refletir sobre muito da “caridade” que existe no mundo atualmente. O quanto dela é feita de coração e o quanto é para enaltecer o ego de quem age como “mecenas” ou filantropo? De fato essas pessoas estão contribuindo com a arte, com a comunidade, com esse ou aquele grupo marginalizado e explorado ou muitas dessas pessoas fazem essas obras e “gestos” para esconder o que no dia a dia elas fazem ao explorar ou ao menos tirar a oportunidade de outras pessoas?

Enfim, são questões que essa história nos levanta. Mas outra questão para mim muito pujante nesta produção é que fica evidente o quanto por trás da exploração de Harrison existe inveja. Diferente do que ele alega em duas ocasiões, conversando com László, as conversas deles nunca são enriquecedoras para o arquiteto. Muito pelo contrário. Nas conversas que eles têm, Harrison apenas mostra o desprezo que ele tem pelas pessoas, mesmo que em sua boca exista sempre uma voz macia e sorrisos entre uma frase e outra. O conteúdo do que ele fala costuma ser desprezível ou vazio, nada edificante ou interessante.

Se alguém ganha nas conversas dos dois, é Harrison. László não aprende nada, não tem uma “iluminação” sequer naquelas conversas com Harrison. Porque Harrison tem muito dinheiro, mas é só isso que ele tem. Quer dizer, ele também tem inveja e desprezo, ao mesmo tempo, de László. Inveja porque, no fundo, ele sabe que não tem talento algum, muito menos um talento transcendental como Lászlo. E desprezo justamente porque ele sabe que o mundo é movido por dinheiro, algo que László não tem e dificilmente um dia terá na ordem que Harrison tem. Como todo homem desprezível, Harrison vive de medir os outros pela sua régua, achando que essa medida é a mais importante.

Impossível assistir a The Brutalist e não ficar mexida(o) com esse filme. Corbet conduz a história muito bem, com uma narrativa envolvente e com um trabalho de atores com muita entrega. Dividir a história em capítulos ajuda na narrativa e a não percebermos o tempo passar. Como eu disse, no final, o filme nem parece ser tão longo assim.

Agora, por mais que a história funcione muito bem, devo admitir que apenas no final a gente acaba entendendo porque László aceitou passar por tudo que passou. Qual a razão dele quase ter perdido a sua sanidade mental e de ter praticamente “vendido a alma” para um sujeito como Harrison. Apenas quando ele é homenageado e entendemos o que ele quis representar naquele projeto desenvolvido para Harrison, é que tudo faz sentido. Mais um acerto de Corbet, que nos presenteia com um final que amarra tudo e que fecha o ciclo da história.

Um belo filme. Que trata de diversos temas importantes de uma maneira muito eficaz. Tecnicamente, muito bem desenvolvido. Feito para ser um épico. Chega a ser? Bem, apesar de suas qualidades, acho que The Brutalist vai durar na nossa mente e revolver nossas emoções em uma proporção menor do que outros épicos. Vale estar na lista dos melhores do ano, mas não acho ele tão inesquecível como Ainda Estou Aqui, por exemplo. E me tocou menos que Conclave. Mas foi bem valorizado pelos prêmios que recebeu até aqui e pela vitória que deve ter em algumas categorias do Oscar nesta noite.

NOTA

9.

OBS DE PÉ DE PÁGINA

Minha gente, pelo motivo do Oscar estar se aproximando, serei mais sucinta nesta parte da crítica por enquanto, beleza? Prometo nesta semana ainda atualizar essa sessão. Mas, por agora, serei mais direta e objetiva para ter tempo de me preparar para o post de cobertura da entrega do Oscar. Sei que vocês vão me entender. 🙂

Vou focar, nesta seção, principalmente nas chances de The Brutalist no Oscar. O filme foi indicado em nada menos do que 10 categorias do Oscar – o mesmo número que Wicked e apenas atrás de Emilia Pérez, que foi indicado 13 vezes. The Brutalist concorre nas seguintes categorias: Melhor Filme; Melhor Ator, para Adrien Brody; Melhor Ator Coadjuvante, para Guy Pearce; Melhor Atriz Coadjuvante, para Felicity Jones; Melhor Fotografia; Melhor Direção; Melhor Edição; Melhor Trilha Sonora; Melhor Design de Produção e Melhor Roteiro Original.

Bueno, e em quais categorias o filme tem chances? As bolsas de apostas apontam que The Brutalist deve ganhar três estatuetas – ao menos é o favorito nestas categorias: Melhor Ator para Adrien Brody; Melhor Fotografia e Melhor Trilha Sonora. Esses mesmos apostadores apontam Anora como favorito nas categorias Melhor Filme e Melhor Direção. Honestamente, tenho sérias dúvidas sobre isso.

Acho que Conclave e The Brutalist tem mais chances de ganhar Melhor Filme do que Anora e que Brady Corbet, diretor de The Brutalist, é favorito sobre Sean Baker, de Anora. Mas… nada disso é certo. Seriam as minhas apostas, caso eu apostasse. 😉 Conclave como Melhor Filme – isso falando no que eu considero como a maior chance, porque a torcida mesmo está para Ainda Estou Aqui, o que seria uma surpresa de outro mundo – e Brady Corbet como Melhor Direção. Logo saberemos quem está certo, se as bolsas de apostas ou essa humilde jornalista que aqui escreve. Hahahahahaha.

Adrien Brody merece o Oscar, claro. Ainda que, para mim, não seria uma completa surpresa Ralph Fiennes por Conclave ou Timothée Chalamet, por A Complete Unknown, surpreenderem e levarem o prêmio. Entre os dois – porque ainda não assisti A Complete Unknown -, vejo Adrien Brody realmente com uma leve vantagem. Ele está ótimo em The Brutalist e é um dos trunfos da produção.

Felicity Jones não tem nenhuma chance contra Zoe Saldaña. Ela sim, uma das melhores partes de Emilia Pérez (com crítica neste link), filme que finalizou 2024 e começou 2025 com uma campanha avassaladora e que depois só foi minguando, a ponto de ser, provavelmente, um dos maiores derrotados do Oscar deste ano. E não vou achar ruim. Porque apesar do filme ter as suas qualidades – eu não considero ele um completo lixo, como alguns argumentos -, ele também tem muitos defeitos. Todos já comentados na crítica que eu escrevi sobre ele.

Eu não assisti a A Real Pain ainda, mas todos apontam Kieran Culkin como favoritíssimo na categoria Melhor Ator Coadjuvante. Seria uma bola cantada no estilo de Zoe Saldaña. Considero que Guy Pearce super mereceu ser indicado nesta categoria e que ele também é um dos trunfos de The Brutalist. Então não seria injusto ele ganhar nessa categoria. Só que isso realmente parece improvável.

Em Melhor Roteiro Original, todos colocam Anora como favoritíssimo. Então… acho o roteiro de Anora bom, é verdade. Mas não acho tão bom ou tão original quanto The Substance ou The Brutalist. Acho que o roteiro dessas duas produções estão em um outro nível. Mas… eu não sou votante da Academia e minha opinião pouco importa, então logo mais saberemos se Anora é bola cantada nessa categoria.

Em Melhor Edição, as bolsas de apostas apontam Conclave como o favorito, seguido de Anora. De fato, acho que Conclave merece ganhar nessa categoria, ainda que a edição de Anora e de The Brutalist sejam muito boas. Categoria difícil e me parece bem equilibrada este ano. Os apostadores apontem Wicked como o favorito em Melhor Design de Produção. Não vi o filme, mas vendo as fotos e imagens de divulgação, realmente me parece que ele é o franco favorito. Novamente, The Brutalist acerta muito nesse quesito, mas ficou difícil competir…

Então é isso. Se as bolsas de apostas acertarem, The Brutalist levará três estatuetas douradas para casa. Eu não me surpreenderia se esse número pudesse chegar a cinco ou seis, incluindo Melhor Filme e Melhor Direção. Logo mais saberemos.

Acho que minha crítica até aqui já deixou claro o que considero como os pontos fortes de The Brutalist. Para começar, a direção de Brady Corbet, que colocou para si a missão de produzir um épico do cinema e faz isso. Algo bastante ousado, vamos combinar, mas que ele executa com precisão. Procurei sobre ele e reparei que The Brutalist é o primeiro filme que eu vejo do diretor. E que ele realmente não teve muitos trabalhos antes desta produção.

Nascido na cidade de Scottsdale, no estado do Arizona, há 36 anos, Brady Corbet tem mais trabalhos no currículo como ator – 38 no total, até aqui – do que como diretor. Na direção, ele estreou com o curta Protect You + Me em 2008. O primeiro longa que ele dirigiu veio apenas em 2015: The Childhood of a Leader, uma história ambientada após a Primeira Guerra Mundial. Interessante. Parece que ele tem apreço por histórias de época… Depois vieram mais dois longas, um vídeo musical e a direção de três episódios de uma série de TV. Só depois veio The Brutalist, seu grande filme até agora. Mas eis um nome que merece ser acompanhado.

Além de nos apresentar um ótimo trabalho de direção, devo dizer que Brady Corbet surpreende pelo roteiro. Esse é outro ponto forte do filme, sem dúvida alguma, porque não é simples desenvolver toda essa história ficcional parecendo que estamos vendo uma cinebiografia. A narrativa é tão envolvente e tão mergulhada em “realismo” que realmente acreditamos que o arquiteto László Tóth e todas as pessoas que lhe cercam nessa história existiram. Só que não. Mérito total do roteiro de Corbet e de Mona Fastvold.

Antes que alguém me pergunte, existiu um certo László Tóth, mas ele não era um arquiteto respeitado e nem nada do gênero. Na verdade, o verdadeiro László Tóth ficou conhecido por um crime. Segundo esse artigo da Wikipédia, László Tóth foi um australiano que nasceu em 1938 e morreu em 2012 e que em 1972 vandalizou a obra Pietà, de Michelangelo, na Basílica de São Pedro.

Então, se László Tóth, o arquiteto, não existiu, o que vemos em cena em The Brutalist foi tudo inventado ou teve algum fundo de verdade? Claro que a inspiração dos personagens vieram de várias pessoas que passaram pelo mesmo ou por algo parecido. Mas a arquitetura que vemos em cena foi obra da designer de produção Judy Becker. Segundo essa reportagem da CNN Brasil, ela se inspirou no trabalho do modernista húngaro-alemão Marcel Breuer e no arquiteto japonês contemporâneo Tadao Ando, entre outros nomes, para desenvolver as criações que vemos em cena no filme. Interessante.

Vale citar também essa reportagem da Casa Vogue na qual o diretor e roteirista Brady Corbet comenta que se inspirou no livro Architecture in Uniform, do historiador de arquitetura e escritor Jean-Louis Cohen, para desenvolver a história do personagem László Tóth. Ou seja, Corbet se inspirou em arquitetos e suas histórias para desenvolver o perfil e a narrativa do protagonista de The Brutalist.

Para quem ficou curioso para saber mais sobre o brutalismo, estilo arquitetônico que inspirou o nome do filme, justamente por ser o estilo que o protagonista desenvolveria, deixo por aqui essa referência do site Arch Daily que trata sobre as “produções arquitetônicas situadas entre as décadas de 1950 e 1970 que guardam algumas semelhanças entre si, sobretudo no uso aparente dos materiais construtivos”.

Além da direção e do roteiro, The Brutalist chama a atenção pelo trabalho coerente e convincente do elenco. Os destaques, por óbvio, vão para o protagonista, interpretado por Adrien Brody, que realmente faz um dos grandes trabalhos de sua carreira aqui; seguido de Guy Pearce, que está muito bem como o “charmoso” e desprezível antagonista Harrison Lee Van Buren. Eles são os nomes de maior destaque da produção, porque estão realmente impecáveis em seus papéis.

Junto com eles, mas com menos tempo de tela e com menor destaque na história, vale citar alguns outros atores que, quando aparecem, preenchem a tela porque estão muito bem em seus papéis. Nesse sentido, vale falar de Felicity Jones como Erzsébet Tóth; Joe Alwyn como Harry Lee, o filho mimado e quase tão desprezível quanto o pai, que ajuda no desprezo manifestado contra o protagonista; Raffey Cassidy como Zsófia, em uma papel complexo, com poucas falas, mas que acaba se revelando bem expressiva; Alessandro Nivola como Attila, primo do protagonista, que tem relevância na parte inicial do filme e depois desaparece da narrativa, tendo apenas seu nome citado algumas vezes; Stacy Martin como Maggie Lee, filha de Harrison e, aparentemente, a parte um pouco mais humana e menos abjeta da família; Isaach De Bankolé muito bem como Gordon, aparentemente o único amigo que László faz nos Estados Unidos, igualmente explorado pelos ricos e pelo contexto da época; e Emma Laird como Audrey, esposa de Attila, que também tem certa relevância na parte inicial do filme e depois desaparece.

Claro que há outros nomes no elenco, como atores coadjuvantes, mas os nomes acima são os que merecem maior destaque.

Deixarei um espaço por aqui, nestes parágrafos, para citar depois os aspectos técnicos e algumas curiosidades sobre a produção. Algo que farei em uma atualização desse post durante esta semana, beleza?

Para finalizar esse conteúdo, vou comentar o resultado do filme na avaliação da crítica e nas bilheterias. The Brutalist teria custado US$ 10 milhões – um orçamento baixíssimo para um filme tão complexo quanto esse – e faturado, nos mercados em que já estreou, pouco mais de US$ 41,3 milhões. Apenas nos Estados Unidos o filme fez quase US$ 15,8 milhões nos cinemas segundo o site Box Office Mojo.

Os usuários do site IMDb deram a nota 7,6 para The Brutalist, enquanto que os críticos que tem seus textos linkados no site Rotten Tomatoes dedicaram 65 críticas positivas e quatro negativas para a produção, o que garante para The Brutalist um nível de aprovação de 94% e uma nota média de 8,9. O site Metacritic, por sua vez, apresenta o “metascore” 90 para o filme, além do selo “Metacritic Must-see”. O metascore é fruto de 90 críticas positivas e de uma mediana.

The Brutalist é uma coprodução dos Estados Unidos com o Reino Unido e o Canadá.

Atualização (dia 10/08/2025): Olá, minha gente. Voltei. Não consegui voltar naquela semana que eu prometi e nem nos meses seguintes. Na verdade, estou voltando por aqui nada menos do que cinco meses depois de ter publicado esse conteúdo. Eita! Peço desculpas por isso, mas a vida anda corrida e estou com pouquíssimo tempo livre. Então não tenho conseguido parar para ver filmes ou para passar aqui. Mas tentarei voltar a esse bom hábito a partir de agora.

Entre os aspectos técnicos de The Brutalist, além da direção de Brady Corbet e do roteiro escrito por ele junto com Mona Fastvold, um ponto alto do filme é a direção de fotografia de Lol Crawley, em um trabalho realmente incrível e marcante. Sem dúvida alguma o visual de The Brutalist é uma das qualidades do filme que ficam mais tempo presentes na nossa memória. Outro aspecto importante é a edição de Dávid Jancsó, um outro trabalho feito com precisão e que pode ser visto como um grande exemplo recente para quem gosta de analisar os detalhes de cada produção. Para finalizar os três aspectos técnicos que considero mais relevantes deste filme, cito a trilha sonora de Daniel Blumberg, um trabalho inspirado e marcante.

Outros aspectos técnicos que valem ser citados porque são realizados com exatidão e que ajudam muito o filme em sua proposta artística: o design de produção de Judy Becker; a direção de arte de Csaba Lodi, Cesenge Jóvári, Alexander Linde, Virág Tyekvicska e Sári Weichinger; os figurinos de Kate Forbes; o trabalho da equipe de 22 profissionais envolvidos com o Departamento de Arte; o trabalho da equipe de 21 profissionais responsáveis pelo Departamento de Som; e o trabalho da equipe 20 profissionais envolvidos com os Efeitos Visuais.

Agora, algumas curiosidades sobre o filme. Segundo as notas de produção, não existe um igreja que siga o estilo brutalista em Doylestown, no estado da Pensilvânia. A inspiração do diretor Brady Corbet para o filme foi a Igreja da Abadia de São João em Collegeville, em Minnesota. A construção da igreja foi baseada nos planos do arquiteto modernista húngaro educado em Bauhaus, Marcel Breuer, feitos em 1953. O complexo inspirado nos planos de Breuer foi concluído em 1961 e inclui a igreja, uma biblioteca, um dormitório, um departamento de ciências e um centro de pesquisa ecumênica.

Segundo os produtores do filme, o protagonista Toth é inspirado em dois arquitetos judeus húngaros do mesmo período: Marcel Breuer e Erno Goldfinger. Os móveis da biblioteca que aparecem no filme fazem homenagem aos projetos de Breuer.

A sequência do mármore que vemos em The Brutalist foi filmada na mesma pedreira onde Michelangelo esculpiu a Pietà, uma de suas obras mais famosas. Essa obra está na Basílica de São Pedro, no Vaticano, e foi vandalizada no dia 21 de maio de 1972, quando o geólogo húngaro Laszlo Toth golpeou a estátua 15 vezes com um martelo, quebrando um braço da obra. Depois a estátua foi restaurada e hoje está protegida por um vidro à prova de balas.

Com 3 horas e 34 minutos de duração, The Brutalista é o quinto filme mais longo a ser indicado ao Oscar de Melhor Filme. Os outros filmes indicados nessa categoria mais longos que ele são: Cleópatra (1963), com 4 horas e 8 minutos de duração; …E o Vento Levou (1939), com 3 horas e 46 minutos; Lawrence da Arábia (1962), com 3 horas e 42 minutos; e Os Dez Mandamentos (1956), com 3 horas e 40 minutos.

O uso de uma tecnologia de IA na fase de edição do filme gerou uma certa polêmica. Mesmo após passarem por um longo treinamento de um instrutor, diálogos em húngaro dos atores Adrien Brody e Felicity Jones foram modificados pelo editor húngaro Dávid Jancsó utilizando a ferramenta Respeecher. O editor comentou em uma entrevista que utilizou a ferramenta de IA para “refinar” o diálogo húngaro dos atores utilizando sua própria voz como referência para modificar as vozes dos atores.

O diretor Brady Corbet defendeu essa mudança e falou o seguinte sobre o uso da ferramenta IA: “As atuações (de Brody e Felicity Jones) são completamente suas. Eles trabalharam por meses com a instrutora de dialetos Tanera Marshall para aperfeiçoar seus sotaques. A inovadora tecnologia Respeecher foi usada apenas na edição dos diálogos em húngaro, especificamente para refinar certas vogais e letras para maior precisão. Nenhuma fala em inglês foi alterada. Este foi um processo manual, realizado por nossa equipe de som e pelo Respeecher na pós-produção. O objetivo era preservar a autenticidade das atuações em outro idioma, não substituí-las ou alterá-las, e feito com o máximo respeito pela arte.”

Assim como o protagonista desta produção, os antepassados da família de Adrien Brody fugiram da Hungria após a Segunda Guerra Mundial.

A parceira de vida e do roteiro de The Brutalist de Brady Corbet, Mona Fastvold, é norueguesa e se inspirou em sua própria vivência e experiência de vida como imigrante parar criar o roteiro desse filme.

The Brutalist acabou ganhando três Oscar: Melhor Ator para Adrien Brody; Melhor Trilha Sonora para Daniel Blumberg e Melhor Direção de Fotografia para Lol Crawley.

CONCLUSÃO

Um filme bem construído, com uma narrativa linear e interessante, que nos conta uma história que vai muito além do singular. Claro, para quem ama arquitetura, esse filme terá um impacto muito diferente do que para mim, que não faço parte deste grupo. Eu, como grande parte do público, reles mortais, vamos ver apenas camadas mais “superficiais” da história. Nos centramos nos temas universais, sem tanto apreço pela questão da obra arquitetônica em si – que é um elemento importante do filme, apesar da história de Lászlo ser, e isso me surpreendeu ao pesquisar sobre, uma fantasia. Mas a essência da arquitetura está ali.

Apesar de não nos apegarmos ao significado da obra arquitetônica apresentada em cena, The Brutalist nos apresenta uma história poderosa, porque ela fala de arquitetura, sim, e de sua potência enquanto arte e obra humana, mas a história vai para além desta camada. Ela fala sobre sonho americano, sobre as possibilidades e frustrações que esse sonho pode trazer, trata sobre antissemitismo, xenofobia e a velha e muito atual inveja que alguns ricos têm sobre quem tem talento. Porque sim, eles só tem muito dinheiro. Poucos são os que tem talento além disso. The Brutalist trata sobre tudo isso de uma forma impecável, com uma ótima direção, fotografia e atores muito afinados. Um filme bem realizado, mas que está longe de ser o melhor do ano.

Avatar de Alessandra

Por Alessandra

Jornalista com doutorado pelo curso de Comunicación, Cambio Social y Desarrollo da Universidad Complutense de Madrid, sou uma apaixonada pelo cinema e "série maníaca". Em outras palavras, uma cinéfila inveterada e uma consumidora de séries voraz - quando o tempo me permite, é claro.

Também tenho Twitter, conta no Facebook, Polldaddy, YouTube, entre outros sites e recursos online. Tenho mais de 25 anos de experiência como jornalista. Trabalhei também com inbound marketing, professora universitária (cursos de graduação e pós-graduação) e, atualmente, atuo como empreendedora após criar a minha própria empresa na área da comunicação.

Deixe uma resposta

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Saiba como seus dados em comentários são processados.