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The World is Big and Salvation Lurks Around the Corner


A vida é como um jogo de gamão. Esta é a mensagem principal de uma das grandes surpresas na reta final do Oscar de Melhor Filme Estrangeiro deste ano. Representante da Bulgária na disputa pela cobiçada estatueta dourada, Svetat e Golyam i Spasenie Debne Otvsyakade (que no mercado internacional recebeu a tradução literal de The World is Big and Salvation Lurks Around the Corner) é um filme surpreendente. Ele segue a escola de outras produções que ensinam valores importantes e refletem sobre a forma com que uma pessoa se coloca frente ao mundo de uma maneira muito simples e, ao mesmo tempo, se destaca por uma produção impecável. Contando com um ator soberbo, um jovem talento promissor e uma direção de fotografia estonteante, este filme pode surpreender na disputa e conseguir um lugar entre os cinco indicados ao prêmio. Diria que ele ou o holandês Oorlogswinter tem mais a “cara do Oscar” que outros fortes concorrentes.

A HISTÓRIA: O nascimento de Aleksander Georgiev, apelidado de Sashko (Carlo Ljubek) marca a vida de sua família. O garoto veio ao mundo no dia 15 de setembro de 1975, e seu parto começa essa história. Em algum lugar dos Balcãs, “onde a Europa termina, mas nunca começa”, a gentil e suave Yana (Ana Papadopulu) dá a luz a Sashko. Enquanto a mulher grita de dor, seu marido, Vasil (Hristo Mutafchiev), conhecido como “Vasko”, espera ansioso por notícias no corredor do hospital. Enquanto isso, a avó de Sashko (Lyudmila Cheshmedzhieva) sai à caça de açúcar para preparar quitutes para celebrar o nascimento do neto, e o avô do garoto prestes a nascer, chamado por todos de Bai Dan (Miki Manojlovic), confronta um adversário para se tornar o novo Rei do Gamão local. Em um corte rápido, a história de Sashko pula para o momento em que ele viaja com os pais por uma estrada de acesso à cidades da Alemanha. Eles sofrem um acidente e Sashko perde a memória. Com a ajuda de Bai Dan, ele faz uma viagem de encontro à sua própria identidade e aos valores de sua família.

VOLTANDO À CRÍTICA (SPOILER – aviso aos navegantes que boa parte do texto à seguir conta momentos importantes do filme, por isso recomendo que só continue a ler quem já assistiu a The World is Big and Salvation Lurks Around the Corner): Logo nos primeiros minutos desta produção o espectador tem certeza de algo: este é um filme que valoriza cada linha de seu roteiro. As frases e a forma com que o diretor Stephan Komandarev constrói a narrativa por meio das imagens tem um lugar certo e um sentido bem planejado. Nada, absolutamente nada, sobra ou está fora do lugar. Esta é uma característica mais comum no cinema europeu – ainda que, em certas ocasiões, o cinema de Hollywood também opta por este cuidado. De qualquer forma, é sempre um prazer encontrar um filme que cuide de cada mínimo detalhe. The World is Big (vou abreviá-lo assim, ok?) é um destes casos.

O roteiro escrito por Komandarev junto com Yurii Dachev e Dusan Milic é uma delícia. Saboroso nos detalhes e sutil na maior parte do tempo, o texto convence tanto quando é apresentado por seu narrador – Sashko – quanto nas vozes de cada um de seus atores. E falando no elenco… impressionante quando um filme tem um grupo de atores comprometido e que se preocupa com a obra e não com os holofotes (como é o caso de muitos atores de Hollywood). Mesmo que Miki Manojlovic se destaque no papel do avô maluquete do protagonista (e não sei vocês, mas não consegui olhar para ele, na fase de “mais idade”, e não me lembrar do Einstein), todos os demais incorporam seus personagens com esmero. Mais um diferencial deste filme em relação a outras produções mais irregulares.

Na verdade, é difícil encontrar algum ponto negativo em The World is Big. Além do roteiro inspirado e cuidadosamente planejado, do elenco afinado e convincente, a direção de Komandarev se mostra segura e precisa. Como um maestro de uma orquestra, Komandarev executa cada movimento com cuidado e aproveita o melhor de cada elemento do conjunto – com destaque, além dos elementos que eu já citei, para a direção de fotografia de Emil Hristow. The World is Big não teria o apelo e a força que tem se não fossem as paisagens da Bulgária, da Alemanha, da Itália e da Eslovénia cuidadosamente captadas pelas lentes dos diretores.

Todos estes elementos ajudam a encantar o espectador, mas sem dúvida a sutileza da história e a sua “poesia simples” é o que torna este filme diferente de todos os demais concorrentes ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro deste ano. Certo que esta produção lida com alguns lugares-comum. Por exemplo, ao fazer o paralelo entre as regras e malícias de um jogo e seu paralelo nos desafios da vida. Esta idéia foi explorada anteriormente, por distintas produções, roteiristas e diretores, mas no lugar do gamão, eram focados ensinamentos de xadres ou sinuca, por exemplo. Também não é a primeira vez que uma viagem pessoal de um desmemoriado provoca reflexões sobre valores, pessoas que fazem ou fizeram parte de sua vida e uma releitura da própria trajetória de seu protagonista.

Mas se estes dois pontos, o do paralelo entre um jogo e a vida e a “revisão histórica” de um indivíduo e de sua família não são, exatamente, originais, o que torna The World is Big tão interessante? Primeiro que o filme é tudo isso, mas ainda mais. Como pede uma produção que é universal e ao mesmo tempo muito particular – a velha história do “glocal” -, The World is Big revela para o espectador alguns pontos sobre a cultura e a história da Bulgária pouco conhecidos. Um dos temas mais importantes do filme, por exemplo, é a pressão política pela qual o país passou após a Segunda Guerra Mundial e o predomínio comunista em seu território.

Considerado até hoje um dos países mais pobres da União Européia, a Bulgária viu muitas pessoas deixaram o seu território buscando melhores oportunidades em outros países ou, simplesmente, tentando escapar do conservadorismo comunista. Este tema, assim como costumes de búlgaros comuns – representados pela família Georgiev e seus amigos – torna a produção mais rica e interessante. Mesmo de forma trágica e nada desejada, Sashko consegue o “sonho de consumo” de todo imigrante: não ter um passado ao qual se apegar.

Mas o jovem, que já se sentia um bocado perdido antes mesmo de perder a memória, não tem muito tempo para “aproveitar” essa liberdade que uma vida sem passado pode lhe dar. O divertidíssimo Bai Dan, avô do protagonista, não pensa em lhe deixar sem raízes – até porque, para ele, a família, o passado e os valores aprendidos com ambos é o que tornam uma pessoa o que ela é. E ele tem razão, é claro.

Bai Dan vai, pouco a pouco, ensinando as regras do jogo – e como “jogo” é possível entender o conceito como “gamão” ou “vida” – para o neto desmemoriado. Sashko aprende, na prática, que uma viagem de autodescobrimento passa por sacrifício, pela dor mas, também, pela intensa sensação de liberdade e de que temos “o mundo nas nossas mãos”. O filme é lindo, no conceito, nas paisagens, na forma com que é narrado e na emoção que provoca com naturalidade. Para ser mais perfeito, contudo, ele poderia se explicar um pouco menos.

No início, por exemplo, Bai Dan solta pérolas como “O mundo é grande e a salvação espreita na virada da esquina” – que, aliás, dá título ao filme – ou “Você deve acreditar nos dados. Pense em dois números. Agora jogue”. Na primeira afirmação, ele demonstra como a incrível chegada de açúcar de Cuba, tão distante da pequena Bulgária, pode ter salvado a festa de nascimento de seu primeiro neto. Por mais complicada que seja uma realidade, o mundo é muito grande e nele estão todas as oportunidades e possibilidades. Basta caminhar para a frente e, quem sabe na próxima esquina, encontrar a tão desejada salvação.

Na segunda pérola, Bai Dan está ensinando o pequeno Sashko, então com sete anos, como jogar gamão. Mas, muito mais que isso, ele está contando o segredo da vitória na vida mesma. Ou seja: para conseguir que algo dê certo, você deve pensar no que quer, desejar aquilo profundamente, “acreditar nos dados” e jogar (leia-se se arriscar). O bestseller O Segredo, de Rhonda Byner, parece seguir a mesma linha, não? Agora, uma pena que o filme, lá pelas tantas, torne estes ensinamentos sutis um tanto óbvios demais – ou, em outras palavras, quando as pérolas começam a ser explicadas por A + B. Achei desnecessário isso – e, mesmo assim, darei a nota abaixo para filme. Admitindo, antes, que sim, sou uma pessoa sentimental. 😉

NOTA: 10 9,7.

OBS DE PÉ DE PÁGINA: Para muitos – e eu me incluo neste grupo – a escolha de The World is Big and Salvation Lurks Around the Corner entre os nove pré-selecionados para o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro foi uma surpresa. Francamente, eu não tinha ouvido falar desta produção made in Bulgária. Sua chegada entre os finalistas tirou de cena outros títulos mais comentados pela crítica internacional, como é o caso do boliviano Zona Sur, do finlandês Postia Pappi Jaakobille, do iraniano Darbareye Elly ou mesmo do coreano Madeo. Não assisti a maioria dos que ficaram de fora da lista, mas ao conferir The Wold is Big algo ficou claro: este filme pode surpreender ainda mais. E achei totalmente justificada a sua escolha entre os finalistas. Uma grande produção, sem dúvida.

Explicando melhor o que eu quis dizer antes com o “glocal”: há muito tempo especialistas sobre os efeitos da globalização na cultura e na comunicação afirmam que um projeto, para se diferenciar dos demais e ter êxito no panorama atual, deve preocupar-se em “pensar de forma global e agir de forma local”. Essa parece ter virado uma regra para os filmes nacionais. Eles devem apresentar uma mensagem que pode ser compreendida em todo o mundo ao mesmo tempo que, de forma quase obrigatória, devem apresentar elementos de identidade nacional que os fará serem reconhecidos/apreciados pelo público de seus países. Estas características fizeram o japonês Okuribito (ou Departures) ganhar o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro do ano passado.

Bem adaptada para o cinema, a história de The World is Big tem sua origem no livro do escritor, tradutor e editor Ilija Trojanow. Nascido em 1965 na cidade de Sofia, capital da Bulgária, Trojanow viveu na pele a experiência de ter que deixar o seu país ainda muito jovem. Seus pais pediram asilo político na Alemanha, depois de passarem pela Iugoslávia e pela Itália no início da década de 1970. Os Trojanow acabaram vivendo no Quênia, onde o pai do escritor conseguiu um emprego como engenheiro. Na década de 1980 Ilija morou em Paris e estudou na Universidade de Munique.

A verdade é que o escritor nunca parou muito tempo em algum lugar – quem quiser saber mais sobre sua vida, este texto da Wikipédia em inglês revela boa parte de sua trajetória. O curioso de sua biografia é que ele se especializou na cultura e na literatura africana e traduziu alguns autores daquele continente para o alemão antes de começar a publicar seus próprios livros. O livro que inspirou este filme foi publicado originalmente em alemão (sob o título “Die Welt ist Gross und Rettung Lauert Überall”) e lançado em 1996 – nem preciso dizer que ele é semiautobiográfico, não é mesmo?

O constante jogo temporal do roteiro de The World is Big não incomoda – diferente de outros filmes recentes. Cada vez que a história retrocede para a infância do protagonista ou que retoma o seu presente é perfeitamente justificada. (SPOILER – não leia se você ainda não assistiu ao filme). A troca é realizada de forma muito natural, fluente e, para simplificar a compreensão dos espectadores, com a utilização de uma direção de fotografia diferenciada – cores “sépias” para o passado e tons azulados para o presente. O passado, claro, sempre parece mais cálido que o presente – onde todas as oportunidades, prazeres e sofrimentos podem ser sentidos na pele. Os tons azulados, na verdade, marcam principalmente a fase do acidente de carro e a do hospital. Porque quando o protagonista e seu avô saem pelas estradas de diversos países em uma bicicleta dupla, todas as cores parecem ir retomando os seus lugares pouco a pouco – em uma evidente alusão de que a vida estava retomando o seu lugar/as suas cores.

Fiquei especialmente impressinada pela sacada de muitas sequências idealizadas pelo diretor Stephan Komandarev. Duas de muitas que merecem destaque são aquelas que representam a felicidade, o desespero, a liberdade e o medo que tal liberdade traz para a família Georgiev no agitado centro da italiana Trieste; e outra a que simboliza uma das primeiras lembranças do traumatizado Sashko de sua mãe. (SPOILER – não leia se você não assistiu ao filme). Pouco depois de ouvir do avô que seus pais haviam morrido no acidente de carro que havia sofrido, Sashko se lembra de uma história que sua mãe lia para ele quando ele era criança. A voz e a imagem de Yana aparecem narrando o conto de um menino que se perdeu em uma floresta escura, sem a mãe, e que encontrou a esperança de voltar para casa e reencontrá-la ao visualizar um caminho branco. Enquanto isso, o Sashko adulto está do lado de fora do hospital, sentado em um banco junto a um caminho branco, pronto para encarar a sua jornada pessoal pela “floresta escura” (das memórias apagadas e do medo) para reencontrar a sua mãe (seu pai e sua avó, simbolicamente vivos em seu passado/presente). Lindo, vamos combinar.

The World is Big é repleto de pequenos ensinamentos. Entre outros, destaco quando Bai Dan ensina que todo jogador de gamão deveria jurar nunca jogar por dinheiro, “somente pela honra”. Esta é uma maneira diferente de dizer que aquele que conhece os segredos da vida, que atinge a sabedoria, não buscará converter os seu aprendizado em dinheiro, em “papel sujo”. A honra é muito mais importante. Outro ensinamento do engraçado avô de Sashko é que “não há dados ruins, apenas jogadores ruins”. Em outras palavras, não existe sorte ou azar. Nem mesmo um destino equivocado. O que existe são pessoas que não sabem tirar o melhor proveito do que acontece com elas – até porque quem domina os dados sabe conseguir deles os números que necessita para vencer (o mesmo valendo para os acontecimentos da vida).

Quando Bai Dan avisa para o neto que o gamão é feito de “seis pontos” e que Sashko havia aprendido a dominar apenas o primeiro, o espectador sabe que o garoto terá que passar por muitos desafios ainda. Bai Dai ensina que os pontos do Rei e do Paraíso são os mais importantes, e que ele havia aprendido, antes de abandonar o hospital definitivamente, apenas o primeiro dos seis pontos que deveria aprender. (SPOILER – não leia… bem, você já sabe). Passa a ser divertido acompanhar os estágios deste aprendizado. O primeiro deles, que marca a primeira vitória de Sashko, foi conquistado quando o garoto aprendeu a jogar alto e, principalmente, se concentrar nos dados e no queria deles.Vale comentar sobre os outros pontos: a fantasia, que é considerado o “elixir de cada jogo”; a superação, a “conquista do topo”, quando eles conseguem vencer a etapa mais difícil da viagem; o Ponto do Paraíso, “o melhor de todos”, quando Sashko conhece o amor através de Maria (Dorka Gryllus); o ponto do autoconhecimento, quando o garoto tem que descobrir por sua própria conta como chegar até o destino final; e, finalmente, o Ponto do Rei, quando Sashko supera o avô e descobre que a vida é feita de perdas, ganhos, e tudo o demais que ele aprendeu.

Como eu disse antes, todos os atores deste filme estão perfeitos em seus papéis. Gostei demais da simpatia, do carisma e da “loucura” do vovô Bai Dan, interpretado com maestria por Miki Manojlovic. Seu parceiro na maior parte das cenas, Carlo Ljubek, consegue o tom exato de espanto, inocência, determinação e superação do personagem de Sashko adulto. O garotinho que interpreta o personagem quando criança, Blagovest Mutafchiev, também está perfeito – respirando curiosidade, inocência e encanto na medida exata. Os atores que interpretam os pais de Sashko também só merecem elogios. Ana Papadopulo é uma atriz linda que faz com equilíbrio a mãe amorosa e, nos momentos certos, decidida esposa de Vasko. Hristo Mutafchiev incorpora o lema da honra aprendido com o sogro e toma as decisões mais corajosas do filme – com a convicção devida na interpretação.

Além deste núcleo central, é emocionante assistir a entrega de Lyudmila Cheshmedzhieva como a “passiva” e amorosa avó Sladka. Merecem destaque ainda Vasil Vasilev-Zueka como Ivo “o Chicago”, um exilado político na Itália que sonhava em ir para os Estados Unidos e que se torna amigo dos Georgiev; a bela e carismática Dorka Gryllus como a professora de dança Maria, que encanta Sashko; e Stefan Valdobrev como Stoyan, outro exilado que se torna amigo da família. Na parte técnica do filme, merecem ser mencionados os trabalhos do ator StefanValdobrev com a trilha sonora (importantíssima para ditar o ritmo da história e não torná-la “pesada demais” mesmo nos momentos mais densos); e os trabalhos feitos com os figurinos, a direção de arte e o desenho de produção (todos os elementos funcionam perfeitamente para ambientar a história na época devida).

Svetat e Golyam i Spasenie Debne Otvsyakade estreou no Festival Internacional de Cinema de Sofia, capital da Bulgária, no dia 14 de março de 2008. De lá para cá, ele participou de pelo menos sete outros festivais. Os mais conhecidos foram os de Karlovy Vary, Mar del Plata e, nos Estados Unidos, o de Palm Springs (este último em janeiro deste ano). Svetat e Golyam ou The World is Big também participou do mercado de filmes paralelo ao festival de Cannes do ano passado. Ainda assim, ele foi pouco comentado pela crítica internacional.

Em sua trajetória, contudo, The World is Big conseguiu pelo menos sete prêmios. Os mais importantes foram conferidos pelas audiências dos festivais de Sofia e de Zurich; os prêmios dos júris dos festivais de Bergen e Warsaw; e a escolha como o melhor filme búlgaro de 2008 no festival de Sofia.

Os usuários do site IMDb conferiram a nota 8,5 para The World is Big. Uma nota muito boa, para os padrões do IMDb. Para confirmar a falta de críticas do filme na imprensa mundial, o site Rotten Tomatoes não tem nenhum texto sobre esta produção em seu acervo. Ainda assim, basta uma procura um pouco mais cuidadosa pelo Google, especialmente entre publicações conhecidas, para encontrar alguns textos sobre o representante da Bulgária no próximo Oscar.

Uma das críticas que encontrei, assinada por Jay Weissberg para a Variety, começa relembrando que The World is Big foi anunciada como a maior co-produção do cinema búlgaro desde a queda do comunismo. Para Weissberg, este é um drama doce que segue a velha fórmula de uma história que integra duas gerações muito diferentes e que engloba 30 anos de “crise social e política”. O filme ainda empreende “viagens internas e externas que convergem em algum lugar além da real capacidade de compreensão”.

O crítico também não concorda com o constante vai-e-vem da história, afirmando que o roteiro teria transcorrido de forma mais fluída se tivesse sido narrado de outra forma. Weissberg também afirma que é muito difícil de acreditar que um avô com mais de 70 anos cruzaria boa parte da Europa Central em uma bicicleta, ainda que admita que o ator que lhe interpreta consegue fazer um bom trabalho. “Apesar de irregular, o filme tem como um dos seus pontos fortes o seu visual”, comenta Weissberg antes de destacar um ponto que comentei antes, aquele que mostra o protagonista lembrando de um conto infantil enquanto seu caminho se assemelha ao do garoto da literatura.

Neste outro texto, Stephen Farber escreve para a The Hollywood Reporter sobre The World is Big afirmando que o filme tem um dos títulos mais pesados do ano e que tem sua origem na Bulgária, um país que não tem a tradição de apresentar filmes deslumbrantes. Ainda assim, comenta Farber, esta produção traz “surpresas felizes” que fazem com que o espectador fique viciado na história, o que torna o filme em um “encantador inesperado”.

O crítico destaca a figura do avô carismático tão apreciado pelos filmes mas afirma que o veterano Manojlovic, conhecido pelos filmes de Emir Kusturica, consegue uma interpretação tão “vigorosa e sentimental” que transforma seu personagem em algo nada genérico. “Muitos saborosos, os detalhes nada convencionais enriquecem a narrativa; algumas das cenas mais poderosas são aquelas vividas por Alexander e seus pais em um campo de refugiados italiano enquanto eles tentam o asilo na Alemanha. Estes belos episódios detalhados dão ao trauma universal da imigração um preciso e doloroso foco humano”, opina Farber.

O crítico coloca no mesmo patamar interpretativo de Manojlovic o desempenho de Mutafchiev, que vive o pai de Alexander. “As cenas de família são muito aconchegantes, e as imagens são impressionantes, mas uma edição mais nítida melhoraria o filme. (…) Apesar das manchas irregulares, a riqueza de momentos cômicos e agoniantes do filme fazem com que ele seja um dos road movies mais originais que você poderá assistir”, enfatiza Farber.

Mesmo sendo o representante da Bulgária no próximo Oscar, The World is Big é, na verdade, uma co-produção entre a Bulgária, a Alemanha, a Eslovénia e a Hungria. No filme são falados cinco idiomas: o búlgaro, o alemão, o italiano, o inglês e o esloveno.

CONCLUSÃO: Um filme leve, engraçado, denso e emocionante ao mesmo tempo. The World is Big and Salvation Lurks Around the Corner tem um dos títulos mais complicados de lembrar/indicar dos últimos tempos, mas isso não impede que ele seja uma das surpresas do ano na categoria de Melhor Filme Estrangeiro do Oscar. Resgatando a idéia de que um jogo pode sintetizar as regras da vida, The World narra a inesperada aproximação de um avô e seu neto em uma viagem cheia de ensinamentos e aprendizagem. Repleto de imagens lindas e cuidadosamente planejadas, este filme emociona pela simplicidade de sua história e pela interpretação de seus atores. Esqueça o quanto o filme pode ser fantasioso ou realista. O que importa, nesta produção, é o quanto ela transforma estes conceitos e reflete sobre a vida enquanto nos conta uma história de interesse universal e rica em detalhes sobre seu país de origem, a Bulgária. Delicioso, belo, engraçado e emocionante. Totalmente recomendado.

PALPITE PARA O OSCAR 2010: The World is Big ganhou força para chegar ao Oscar depois de sua participação no Festival Internacional de Cinema de Palm Springs em janeiro deste ano. Até então, poucos haviam comentado sobre o filme nos Estados Unidos. Agora, depois de assistí-lo, eu não me surpreenderia se ele conseguisse ficar entre os cinco finalistas ao prêmio de Melhor Filme Estrangeiro. A verdade é que The World tem a cara do Oscar. Assim como o holandês Oorlogswinter. Sem discutir originalidade de argumentos ou a qualidade das produções, mas os representantes da Bulgária e da Holanda tem histórias mais facilmente “compreendidas” pelos votantes da Academia do que o ótimo La Teta Asustada, do Peru, para dar um exemplo.

El Secreto de Sus Ojos, representante da Argentina, têm sido muito badalado pela crítica internacional. Mas, francamente, acho que tanto El Secreto quanto La Teta correm por fora das cinco vagas. Têm seus lugares garantidos os filmes Das Weisse Band (Alemanha), Un Prophète (França) e, se levarmos em conta os altos elogios que recebeu, Samson & Delilah (Austrália). Sobrariam duas vagas para os demais candidatos. Ajami (Israel) e Kelin (Cazaquistão) são produções que, a exemplo de The World e Oorlogswinter, são pouco conhecidas da crítica internacional. Para mim, estes quatro disputam as duas vagas que sobram… e The World, assim como Oorlogswinter, bem que merecia chegar lá. Ganhar, já acho bem complicado. Das Weisse parece mesmo que domina os holofotes. De qualquer forma, a disputa deste ano está muito boa – e acima da média. Todas as produções merecem ser vistas.

Por Alessandra

Jornalista com doutorado pelo curso de Comunicación, Cambio Social y Desarrollo da Universidad Complutense de Madrid, sou uma apaixonada pelo cinema e "série maníaca". Em outras palavras, uma cinéfila inveterada e uma consumidora de séries voraz - quando o tempo me permite, é claro.

Também tenho Twitter, conta no Facebook, Polldaddy, YouTube, entre outros sites e recursos online. Tenho mais de 20 anos de experiência como jornalista. Trabalhei também com inbound marketing e, atualmente, atuo como professora do curso de Jornalismo da FURB (Universidade Regional de Blumenau).

4 respostas em “The World is Big and Salvation Lurks Around the Corner”

” Bulgária viu muitas pessoas deixaram o seu território buscando melhores oportunidades em outros países ou, simplesmente, tentando escapar do conservadorismo comunista.”

Não Alessandra. As pessoas que fugiam da Bulgaria (e de outros paises submetidos aos horrores do comunismo), buscavam escapar de um totalitarismo terrivel e assassino.
“Conservadorismo comunista” é mais do que eufemismo, é uma grave omissão a respeito da realidade dos fatos.
Isso me faz lembrar do holodomor (Ucrania). Outro caso do “conservadorismo comunista” ?
A pergunta é : Quantos jovens fãs do Che Guevara sabem o que é Holodomor ?
Tudo isso é muito grave.

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Olá Marcelo!!

Vamos lá, você quer que eu afirme que as pessoas fugiam de um sistema totalitário e opressor, assassino em muitas ocasiões? Ok, é isso mesmo. Agora, sempre achei que as pessoas tivessem estudado o suficiente para saber que totalitarismos comunistas abrigassem estes conceitos sem ter que comentar cada um deles em detalhe. Até porque este não é o objetivo deste blog.

De qualquer forma, falei sobre “conservadorismo comunista” porque o filme começa a ser narrado em mediados da década de 1970, quando a Bulgária passava por um lento processo de democratização e quando o regime já não era tão aniquilador como em décadas anteriores. Sem contar que vale lembrar o fato de foi a população, através de um plebiscito em 1946, que decidiu pela queda da monarquia e pela mudança no regime de governo.

Não sei quantos “jovens fãs do Che Guevara” sabem o que é Holodomor, mas eu cuidaria ao colocar todos os comunistas e socialistas no mesmo saco. Francamente não acho que as ações de Che Guevara na América Latina podem ser comparadas com o que foi feito na Ucrânia. Seria uma simplificação que não levaria em conta as características históricas, culturais e políticas de cada região.

Um abraço.

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Política, seres humanos, política… É quase como argumetar sobre religião. E por mais sensata que sejam as palavras de Schopenhauer, o ser humano não perderá a esperança, por mais irreal que seja. Mas, o que isso tem haver com esse belo filme? rs

Ale, o filme é ótimo! Um dos melhores que já vi. É belíssimo e a lição de vida, ou melhor, de como “enfrentar” a vida e saber conduzi-la (melhor que em “O Segredo”), passada pelo avô, é a melhor parte! Um filme carismático, sutil e refinado.

Parabéns pela excelente crítica!

Abraços,
Louzada

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Oi Eduardo!!!

hahahahahahahaha. Genial o teu comentário. E tenha certeza que entendi toda a sutileza dele. 😉 Concordo contigo que, para alguns, discutir política é como debater religião. Para mim, na boa, não é. Não levo assunto algum, nem mesmo futebol, tão a sério.

Puxa, outro filme que entrou para a tua lista dos “melhores que já viste”, hein? Que sorte!! 😉

Também achei a produção fantástica. Ele abriga lições de vida muito interessantes, assim como uma riqueza cultural e de referências super bacanas. Gostei da tua avaliação sobre ele.

E obrigada, mais uma vez, por teu comentário e teu incentivo.

Um grande abraço!

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