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The Great Buck Howard – A Mente Que Mente


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O desejo irrefreável de acreditar que os acontecimentos ocorrem por uma razão e de que cada um de nós tem um espaço definido no mundo. Tal desejo é a espinha dorsal do filme The Great Buck Howard. Esta produção, encabeçada por nomes como John Malkovich e Tom Hanks (que, na verdade, faz apenas uma ponta no filme), também se debruça sobre o “showbusiness” e sobre o tema dos “artistas marginais”. Ainda assim, meus caros leitores, não se enganem: The Great Buck Howard segue a linha de produções que tentam ser mais do que realmente são. Bastante lento, previsível e sem muitos atrativos além de Malkovich, este é um filme que acaba dando sono. E preguiça (até para escrever sobre ele). Claro que se ele for espremido, até solta algum suco interessante. Mas como entretenimento, The Great Buck Howard é muito fraquinho.

A HISTÓRIA: Os três primeiros minutos do filme contam, de forma acelerada, como Troy Gable (Colin Hanks) resolveu dar uma reviravolta em sua vida. Deixando para trás tudo o que seu pai (Tom Hanks) tinha planejado para ele, Troy abandona a faculdade de Direito depois de dois anos e resolve não fazer nada. Pelo menos até que ele encontre a sua verdadeira vocação – começando com a tentativa de ser escritor. Mas como o dever das contas chama, Troy se aventura a buscar um emprego. Lendo os classificados do jornal ele decide trabalhar como assistente pessoal e coordenador de turnês do “famoso” Buck Howard (John Malkovich) – alguém de quem ele nunca tinha ouvido falar. A partir daí, acompanhamos as aventuras de Troy e de Buck Howard em uma turnê pelo interior dos Estados Unidos e pela busca do artista em voltar a ter destaque na mídia nacional.

VOLTANDO À CRÍTICA (SPOILER – aviso aos navegantes que boa parte do texto à seguir conta momentos importantes do filme, por isso recomendo que só continue a ler quem já assistiu a The Great Buck Howard): O começo do filme, ainda que nada inovador, parece promissor. Uma boa edição e a escolha acertada das imagens nos leva a crer que veremos um filme criativo pela frente. Ledo engano. Para começar, pelo ritmo que o filme escrito e dirigido por Sean McGinly toma depois, não entendo o porque de tanta aceleração narrativa naqueles 3 minutos de largada. A história chega a ter nuances tediosos lá pelas tantas… assim sendo, aquela introdução sobre a vida e as intenções do protagonista poderia ter sido um pouquinho mais extensa. Se isso fosse feito, pelo menos não correríamos o risco de achar que o resto do filme seguiria a mesma linha de edição criativa e narrativa acelerada – o que não ocorre, está claro.

Comentada essa diferença brutal entre o que o filme “sugere” nos minutos iniciais e o que ele nos apresenta no restante de seu tempo, vamos ao que interessa: o que The Great Buck Howard quer nos dizer. Para começar, se fôssemos buscar uma “moral da história”, ela nos falaria sobre a necessidade de corrermos atrás dos nossos sonhos, sobre a magia que a vida deveria ter e sobre como podemos aprender com os exemplos de vida mais inusitados/pouco valorizados. Certo, todas estas mensagens são bacanas e necessárias. O problema é que McGinly erra a mão na forma – e não no conteúdo. Assim sendo, além de nos apresentar um filme bastante arrastado e lento, em muitos momentos, o diretor e roteirista tenta nos convencer de uma história bastante surreal, pouco engraçada (sendo que a produção é classificada como comédia) e que emociona mais pelo uso da trilha sonora no final do que por outros recursos.

Sem contar o uso dos estereótipos como principal recurso para dar “profundidade” (leia-se isso com ironia) para os personagens do filme. Vejamos: Troy é o típico rapaz boa-praça que, sem ter muito rumo na vida, decide acompanhar um artista cheio de manias e gênio “complicado” como forma de se inspirar para seu sonhado trabalho como escritor. Ao ler os créditos do filme é que me dei conta de que Colin Hanks não apenas tentava seguir os passos do “eternamente boa-praça” Tom Hanks… sendo filho do astro de Forrest Gump, entende-se como ele se parece tanto com o pai (nos trejeitos e na aparência física). Sendo assim, fica evidente a “forçada de barra” para que um cara um tanto sem graça como Troy consiga “se dar bem” com a única mulher bonita da história, Valerie Brennan (Emily Blunt). (SPOILER – não leia se você não assistiu ao filme). Vamos combinar que nunca, na vida real, um “casinho” de final de semana de turnê no interior dos Estados Unidos entre um cara como Troy e uma garota como Valerie seria levado a sério depois, quando os dois se encontrassem em Los Angeles. Apenas nos filmes do(s) senhor(es) Hanks.

Seguindo com os estereótipos: o artista tão admirado pelas pessoas simples do interior dos Estados Unidos, que ainda guardam na memória suas antigas aparições na tevê, tem que ser um purgante instável, cheio de altos e baixos, muquirana, “duas-caras” (uma para o público, outra para a intimidade) e com um certo problema em “ver a realidade”. Seu empresário, que lhe acompanha há muitos anos, Gil Bellamy (Ricky Jay) é o típico cara que sabe que seu artista está “por baixo”, que não interessa a mais ninguém da mídia, na mesma medida em que tem a noção de que não deve jamais falar sobre isso com ele. Gil não investe mais na carreira de Buck porque sabe que não há muito que fazer com um artista que parece ter “parado no tempo”.

Mr. Gable, o pai de Troy, veste a roupa do “homem de família” que desaprova qualquer manobra do filho por terrenos perigosos – como é o caso de empregos que não tenham um cartão-ponto para ser batido no final do expediente. E Valerie é a típica “mulher moderna” que trabalha em um ambiente competitivo, dominado por homens, que bebe sempre que não está trabalhando, vive sua “liberdade sexual”… em outras palavras: parece imitar os passos de seus “competidores” masculinos. Fora estes personagens principais, temos a Doreen (Debra Monk) e seu irmão Kenny (Steve Zahn), mais dois estereótipos do que seriam as pessoas “do interior” dos Estados Unidos – neste caso, de Cincinnati. Doreen e Kenny são dois interioranos loucos para estar perto do “astro” que saiu na tevê e, no caso de Debra Monk, a atriz ainda explora o estereótipo da mulher que jura (e quer demonstrar) que tem talento artístico. Certo que os estereótipos normalmente trabalham com idéias reais, mas o problema quando um filme se limita apenas a eles é que tudo fica mais pobre de sentido e significado – sem contar que tais idéias, que não são as únicas da realidade, se tornam ainda mais reforçadas.

Mas para não dizer que tudo em The Great Buck Howard se resume a problemas, a reflexão e a ironia do filme em relação ao showbusiness é algo interessante. A necessidade de Buck em seguir o seu trabalho e sua preocupação em voltar a sair na mídia são aspectos realistas da vida de artistas que não aparece muito nos filmes. Acompanhamos apenas o resultado do trabalho de assessores de imprensa, empresários e especialistas em marketing através da mídia, mas ficamos sabendo pouco sobre a luta das personalidades que não conseguem esse espaço.

(SPOILER – não leia se você não assistiu ao filme). Achei especialmente interessante o momento em que Buck Howard deixa de ser um “artista decadente” para ser o novo “queridinho da América”. O que muitos artistas não percebem – e digo isso porque estive “do outro lado” da questão, trabalhando na mídia – é que ninguém aparece sem ter uma novidade para contar. Howard passou grande parte de sua carreira fazendo o mesmo show, sem nenhuma mudança ou inovação. Como ele esperava ser convidado para os principais programas da televisão sem ter nada de novo para contar? Sem nenhum “interesse” por parte do público, que cada vez mais tem uma nova celebridade para acompanhar, Howard não conseguiu ressurgir mesmo quando fez um número novo e excepcional. Mas ao entrar em colapso, virou notícia na “sociedade do espetáculo”. E como um canal de televisão puxa ao outro, o artista virou a “nova antiga celebridade” do momento. Interessante reflexão.

Também achei interessante a homenagem do diretor e roteirista para os artistas que buscam colocar um pouco de “magia” e mistério na vida de seu público. Nos créditos finais de The Great Buck Howard, McGinly cita nominalmente a O Incrível Kreskin, autoproclamado o “mais conhecido mentalista” do mundo. Bonito. Kreskin, nascido nos Estados Unidos em 1935, se tornou muito popular através de um programa na TV norte-americana na década de 1970. Também interessante a idéia mantida pelo filme de que os artistas que fazem essa “magia” continuar maravilhando ao público não são aqueles que aparecem constantemente nos programas de Conan O’Brien, Regis Philbin, Jon e Martha Stewart ou Jay Leno. E sim os que percorrem quase anonimamente as cidades de todo um país, algumas vezes se apresentando para um grande público, outras vezes, para poucas pessoas. Esta homenagem vale o filme, assim como a interpretação normalmente magnética e excepcional de John Malkovich.

NOTA: 7.

OBS DE PÉ DE PÁGINA: Os créditos deste filme são gigantescos. Além dos atores e das personalidades da tevê citadas anteriormente, há muitos outros na lista. Como The Great Buck Howard é praticamente um “road movie” artístico, ele está cheio de coadjuvantes e de pequenas pontas. Além dos atores já citados, queria comentar sobre a participação de Adam Scott como Alan, o assistente de Buck Howard antes de Troy; Patrick Fischler como Michael Perry, um dos empresários de Las Vegas interessado no show do artista; Don Most como o produtor do programa Tonight Show; e Griffin Dunne como Jonathan Finerman, um conceituado roteirista e apresentador de tevê. Menção especial para a divertida aparição do ator George Takei, conhecido pelo personagem de Sulu em Star Trek e, recentemente pela série Heroes, na história.

Gostei bastante da trilha sonora de Blake Neely. Ela acaba sendo fundamental para conduzir o filme, especialmente nos momentos em que o roteiro e até os atores parecem um tanto incapazes de dar a devida “emoção” para a história. O trabalho de Neely acaba fazendo isso por eles – inclusive no “grand finale”. Também achei interessante a apresentação do Clap Your Hands Say Yeah (aqui a página deles no MySpace) no filme. Ficou bacana – e reforçou a idéia de “artistas que se apresentam em qualquer lugar por amor à arte”. Na parte técnica, gostei ainda dos trabalhos do diretor de fotografia Tak Fujimoto e da edição de Myron I. Kerstein.

Como a história mesmo sugere, The Great Buck Howard foi filmado nas cidades de Los Angeles, Nova York e Las Vegas.

O quinto filme no currículo do diretor Sean McGinly estreou em janeiro de 2008 no Festival de Sundance. De lá para cá, ele participou de outros dois festivais e estrou, de maneira limitada, nos cinemas dos Estados Unidos em março de 2009. Sua carreira, pelo visto, ficará mais restrita ao mercado do DVD. A bilheteria do filme comprova as apostas baixas que ele recebeu: nos Estados Unidos, até o início de julho, ele tinha arrecadado pouco mais de US$ 748 mil – nada para os padrões de Hollywood.

Os usuários do site IMDb conferiram a nota 7 para o filme – nota essa com a qual eu estou de acordo, ainda que, admito, fiquei entre as notas de 6,5 e 7,5 na cabeça desde que os créditos terminaram. Por sua vez, os críticos que tem textos linkados no Rotten Tomatoes foram um pouco mais generosos com a produção. Eles dedicaram 63 críticas positivas e 24 negativas para The Great Buck Howard, o que lhe garante uma aprovação de 72% – bastante boa para a média do site.

Ah sim, e o papai do protagonista, Tom Hanks, foi tão bacana que, além de fazer uma ponta importante no filme, ainda ajudou a produzí-lo. Isso que se pode chamar de “empurrãozinho” para a carreira do filhão, hein?

CONCLUSÃO: Uma comédia que aposta mais no talento de John Malkovich do que em um roteiro engraçado ou envolvente. Cheio de “boas intenções”, este filme peca por uma introdução totalmente descolada do restante da narrativa – o que cria falsas expectativas. Se visto com paciência, pode agradar aos que buscam histórias “bonitinhas” e sem muita criatividade. Além de um John Malkovich se “sentindo em casa” em mais um papel de “sujeito estranho” que parece viver sobre os “próprios louros”, o filme vale pela trilha sonora fundamental, que dá o tom dramático e envolvente para o filme que a direção e o roteiro não conseguem garantir. O filme deve valer a pena como curiosidade sobre os bastidores do showbusiness e se for encarado como um conto a respeito da busca pelo próprio talento. Mas isso vai depender do gosto – e do tempo – de cada um.

Por Alessandra

Jornalista com doutorado pelo curso de Comunicación, Cambio Social y Desarrollo da Universidad Complutense de Madrid, sou uma apaixonada pelo cinema e "série maníaca". Em outras palavras, uma cinéfila inveterada e uma consumidora de séries voraz - quando o tempo me permite, é claro.

Também tenho Twitter, conta no Facebook, Polldaddy, YouTube, entre outros sites e recursos online. Tenho mais de 20 anos de experiência como jornalista. Trabalhei também com inbound marketing e, atualmente, atuo como professora do curso de Jornalismo da FURB (Universidade Regional de Blumenau).

8 respostas em “The Great Buck Howard – A Mente Que Mente”

Muito boa a análise crítica do filme, retrata bem o que sentimos após vê-lo.
Eu estava confiante em assistir um filme realmente bom, talvez pelo êxito que teve em “Quero ser John Malkovich”, porém fiquei realmente desapontado com o resultado final. Realmente este filme se mostrou “sem sal”, sem poder de impressionar ou até de chamar a atenção.

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Gostei da análise, porém, para um filme 7, acho que você pegou pesado demais. Logo no começo, pensei que você daria 4, 5 . Eu me apaixonei pelo filme. John Malkovich está soberbo e o Colin Hankis não faz feio, não. As participações estão muito boas, como a do Steve Zanh, e não achei lento o ritmo do filme – e nem tão previsível assim. Para mim, é nota 8,5. Estou com os críticos do Rotten Tomatoes.

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Olá Rodrigo!!

Antes de mais nada, seja bem-vindo por aqui.

Pois então, eu também esperava mais deste filme. Especialmente pelo Malkovich. Mas paciência, isso acontece… um projeto ter grandes intenções e ficar abaixo do que poderia ser.

Obrigada por tua visita e por teu comentário. Espero que ambos se repitam muitas vezes ainda. Um abraço!

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Olá Igor!!

Pois é, às vezes parece que eu vou “detonar” um filme na nota, mas acabo aliviando “a mão” por várias razões. No caso deste filme, não dei uma nota menor porque acho que ele tem boas intenções e, especialmente, algumas cenas muito boas. Mas tenha certeza que já dei notas bem baixas por aqui… hehehehehehe

Fico feliz que tenhas gostado tanto do filme. Honestamente, gosto quando as pessoas sentem prazer em filmes que eu não curto muito – pelo menos alguém fez o esforço dos realizadores valer a pena. 😉

Gostei do John Malkovich também. Para mim, ele salva o filme. Colin Hanks, por outro lado, me desculpe, mas ele não me convenceu. Muito fraquinho para o meu gosto. Eclipsado pelo Malkovich.

Sobre o Rotten Tomatoes, um pequeno detalhe: os críticos destacados pelo site deram, na verdade, a nota média de 6,4 para o filme. Sempre comento a quantidade de críticas positivas – no caso, 72% -, mas isso não quer dizer que seja a nota dos comentaristas. Na verdade, eles foram mais “duros” com esta produção do que eu (e do que você, que deu 8,5 para ele).

Mas gostei do teu comentário. Aliás, muito obrigada por ele. E pela visita. Espero que ambos se repitam muitas vezes ainda. Volte sempre!

Um grande abraço!

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Acho que sou uma das pessoas que busca histórias “bonitinhas” e sem muita criatividade porque adorei o filme. Não achei o filme chato e nem arrastado,aliás não gosto especialmente de filme “ágil”. Fiquei me lembrando da sociedade em que vivemos onde fazer sucesso é essencial não importa qual o preço e muitas vezes não importa nem o artista,importa o empresário. Talvez nessa sociedade os verdadeiros artistas estejam nos pequenos palcos,e talvez seja lá que possamos assistir os melhores shows.

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Oi sand!!

Que bom que você gostou do filme. Honestamente.
Não acho que, por isso, sejas uma pessoa que busca “histórias bonitinhas e sem muita criatividade”. Apenas sentiste a produção de outra forma, viste significados que talvez eu não tenha visto. E tudo bem.

Eu senti ele diferente. Achei arrastado e tudo o mais que eu comentei. Mas fico feliz que discordas de mim. Afinal, os filmes são feitos para agradar e desagradar a diferentes pessoas, certo?

Concordo contigo que a valorização do artista dos pequenos palcos, dos lugares alternativos, é uma das maiores qualidades desta produção. Por este lado, o filme vale a pena. Sem contar que o John Malkovich está ótimo – ainda que um pouco repetitivo, mas tudo bem. Faz parte.

Muito obrigada por tua visita e pelo teu comentário. Espero que voltes por aqui mais vezes.

Abraços!

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Oi ingrid!

Então, o que eu posso te dizer é que, mesmo sem ter sido “obrigada” a assistir ao filme, achei ele bem entediante também. 🙂

Isso porque ele é fraquinho sim.

Obrigada pela tua visita e pelo teu comentário. E volta por aqui mais vezes, ok? Inclusive para falar de outros filmes.

Abraços e inté!

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