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Past Lives – Vidas Passadas


Quantas vidas você teve dentro da sua própria vida? Essa resposta, certamente, vai variar bastante conforme uma série de fatores. Especialmente, acredito, conforme a idade e a complexidade de experiências que a pessoa vivenciou em sua trajetória. Past Lives trata sobre as diversas vidas que alguém pode ter dentro da própria vida na mesma medida em que aborda a perspectiva budista sobre a continuidade de uma vida em diversas existências. Um filme com muitas camadas, muito rico, com um ótimo roteiro que faz pensar e sentir. A melhor surpresa desse ano até aqui.

A HISTÓRIA

Começa com uma garota perguntando para o companheiro o que ele acha que três pessoas que estão na frente deles, do outro lado do balcão de atendimento do bar, são um do outro. Ele responde que não sabe. Ela diz que aquela situação está difícil de adivinhar. Ele responde que acha que a garota asiática e o “cara branco” são um casal e que o “cara asiático” é o irmão dela. A companheira dele chuta que a garota asiática e o cara asiático são um casal e o cara branco é o amigo americano deles. As observações continuam, assim como as especulações, até que a história volta 24 anos no tempo para começarmos a descobrir a verdade sobre aquela cena.

VOLTANDO À CRÍTICA

(SPOILER – aviso aos navegantes que boa parte do texto à seguir conta momentos importantes do filme, por isso recomendo que só continue a ler quem já assistiu a Past Lives): Como eu sentia falta de assistir a um filme diferenciado! Nossa. Sério mesmo! Até me dá um ânimo voltar com o blog após o longo hiato dos últimos meses após assistir a esse filme.

Past Lives comprova algo que eu penso há décadas: que a parte central de uma produção é o seu roteiro. Quando temos pela frente um roteiro maravilhoso, é muito difícil nos depararmos com um filme ruim. No máximo, se a diretora ou o diretor for mediano, assim como os atores, vamos ver um pouco de potencial desperdiçado, mas nunca um filme ruim. Agora, quando juntamos todos os elementos com qualidade, então podemos ter pela frente um filme excepcional.

O roteiro escrito pela diretora Celine Song é o primeiro elemento que salta aos olhos nesta produção. Mas, pouco a pouco, vamos percebendo a inteligência e o talento da cineasta nos outros detalhes, como a escolha dos ângulos das câmeras e do ritmo das cenas e, sem dúvida alguma, a escolha precisa do elenco.

Achei genial, para começar, aquele início de Past Lives. Quantas vezes, quando estamos em um bar, especialmente quando ele é mais “intimista”, não nos perguntamos sobre algumas cenas, algumas pessoas que estão por ali? Mesmo que a gente não tenha tempo para fazer isso ou a pessoa com quem estamos prenda toda a nossa atenção, o começo de Past Lives já se mostra diferenciado apenas pelo fato de nos fazer refletir que, no fundo, nunca vamos saber nada sobre a vida dos outros. Apenas quem está realmente vivendo a situação e que passou por tudo que passou, tem a noção exata do que está acontecendo, do que levou aquela pessoa até ali e do que a pessoa está sentindo. Ninguém mais.

Então não adianta especularmos ou tentarmos adivinhar. Temos que conhecer. E para conhecer, temos que nos aproximar. E é exatamente isso que Celine Song faz durante toda essa produção. Logo depois daquela introdução genial para a história, a narrativa volta no tempo 24 anos. Só então vamos nos aproximar e conhecer a história dos dois “asiáticos”, como os espectadores do bar chamam duas das três pessoas em cena que vemos no início de Past Lives.

Eles são Na Young – que depois se tornaria Nora Moon (na infância interpretada por Moon Seung-ah e, quando adulta, pela fantástica Greta Lee) e Jung Hae Sung (na infância interpretado por Leem Seung-min e, quando adulto, pelo ótimo Teo Yoo), dois amigos inseparáveis que, pouco a pouco, vão descobrindo que se amam. (SPOILER – não leia se você não assistiu ao filme). Tudo parece lindo, até que logo percebemos que aqueles amigos serão separados com a mudança da família de Na Young para o Canadá.

Moon Seung-ah e Leem Seung-min são encantadores e nos revelam uma amizade linda. Cenas marcantes e bem plásticas sobre o primeiro amor – algo gracioso que fazia tempo que não víamos no cinema. Apenas naquela fase dos dois pré-adolescentes, percebemos uma dinâmica entre eles interessante e alguns indicadores sugestivos sobre as diferenças de suas personalidades. No primeiro diálogo entre os amigos, fica sugerido que Na Young/Nora é um bocado competitiva e que gosta de ser sempre a melhor – tirar as melhores notas. Jung Hae Sung, por sua vez, não se importa em ficar em segundo lugar, atrás da amiga, porque ele não faz questão de ser o primeiro.

Ele também está sempre preocupado com os sentimentos dela. Ainda é cedo para dizer, mas parece que eles vivem uma certa codependência e complementariedade. Mas ainda não sabemos se isso poderá ou não ser um problema no futuro. Até porque, naquela fase, tudo é mais simples, gracioso, leve. Os pais de Na Young/Nora, interpretados pelos atores Ji Hye Yoon (mãe) e Won Young Choi (pai), respectivamente artista e cineasta, é que decidem sair da Coreia do Sul e imigrar para o Canadá.

As filhas deles, Na Young/Nora e Si Young/Michelle (Seo Yeon-Woo quando criança e Stephanie Cheng quando adulta), parecem viver uma gangorra de sentimentos sobre a mudança. Ao mesmo tempo que não parecem tão empolgadas a novidade, algumas vezes elas parecem curiosas sobre o que virá pela frente. Crianças ao mesmo tempo são mais adaptáveis do que adultos e sofrem mais com o isolamento da nova realidade – isso fica visível na narrativa de Celine Song.

Na Young/Nora parece nunca querer ficar por baixo. Ela demonstra ser uma pessoa orgulhosa e, por isso, não chega a falar diretamente para Jung Hae Sung que vai mudar de país, mas tem o cuidado de falar perto dele sobre a mudança. Crianças buscam lidar da melhor forma possível, nem sempre enfrentando o que sentem, com o que lhes acontece. A decisão de mudar não foi dela, mas Na Young/Nora vai se sair bem da situação. A despedida deles é cheia de palavras não ditas. Mas fica evidente que os dois se amam, especialmente ele gosta dela.

Toda essa primeira parte é muito bem construída, com diversas cenas muito ilustrativas sobre a cultura sul-coreana e sobre a personalidade dos personagens principais. As escolhas da diretora nessa fase são interessantíssimas, com muitos sentidos sendo construídos apenas com as imagens – como quando Jung Hae Sung segue em uma rua sem sair quase do mesmo nível enquanto Na Young/Nora sobre uma escadaria. Ali está a representação em imagem do que representa a imigração dela e a permanência dele – ao menos a intenção de cada um, o que iria ficar ainda mais evidente no futuro dos personagens.

Apesar de Na Young/Nora e Si Young/Michelle estarem empolgadas com a viagem e o novo idioma no avião, a diretora não ignora as dificuldades da nova vida quando vemos a protagonista sozinha no colégio. Sem dúvida, ela e a irmã passaram por muitas dificuldades até conquistarem seus próprios espaços e um “lugar ao sol” no novo país e sob uma nova cultura. Então o roteiro avança 12 anos. E vemos os protagonistas em sua fase adulta – mas ainda jovens, é claro. Podemos calcular que eles estariam na casa dos 24 ou 25 anos.

Então entram em cena os atores que vão nos hipnotizar pelo restante da produção. Simplesmente fantástico o trabalho da dupla Greta Lee e Teo Yoo. Eles são muito expressivos e falam muito com cada expressão, em cada diálogo e a cada silêncio. Muito interessante a entrega dos dois. Além de tudo, eles são muito carismáticos e conseguem levar para a fase adulta o mesmo espírito que os personagens tinham na infância.

Depois daquela passagem de tempo, descobrimos Nora morando em Nova York e realizando seu sonho de investir na carreira como escritora. Conversando com a mãe por telefone, um dia, Nora começa a lembrar dos amigos que tinha na Coreia do Sul. Até que ela pede ajuda para lembrar-se do nome de Jung Hae Sung, o garoto de quem ela gostava na infância e com quem ela disse que um dia iria se casar.

Procurando por ele na internet, ela descobre que o rapaz perguntou sobre ela em um post de divulgação de um filme recente que o pai dela lançou. A partir daí, ela manda uma mensagem para ele e os dois retomam o contato. É apaixonante, mais uma vez, acompanhar a relação de Nora e Jung Hae Sung. Claro, os dois viveram muitas coisas desde que se falaram e viram pela última vez, mas, de alguma forma, o diálogo aberto e único que eles têm entre si permanece o mesmo.

Parece que o tempo não passou para os dois. O diálogo flui como quando eles eram pré-adolescentes – ou até melhor – e eles realmente se esforçam para manterem a chama acessa. Enfrentam o fuso horário e os horários diferentes das agendas para tentarem conversar sempre que possível. De repente, parece que eles não conseguem passar muito tempo sem se falarem. Mas então entra em cena o problema da distância. Como eles podem seguir assim?

(SPOILER – não leia… bem, você já sabe). Sim, Celine Song nos leva pela mão para nos apaixonarmos pelos protagonistas mais uma vez. Mas se na primeira fase sabemos que os dois não podem ficar juntos porque a família de Nora vai sair da Coreia do Sul, nessa segunda fase sabemos que a distância não permite que eles fiquem juntos. Então como viabilizar toda aquela magia que existia entre os dois? Porque só quem já encontrou alguma vez na vida alguém em quem tudo se materializa, em que cada momento juntos parece perfeito, sabe que isso é raro e, porque não dizer, mágico.

Mas então vem o questionamento inevitável: como vamos resolver isso? Nora volta a se apaixonar – ou reavivar a paixão – que tinha por Jung Hae Sung, mas eles estão a meio mundo de distância um do outro. Falhas de conexão acontecem, ela perde hora de sono preciosas e, lá pelas tantas, questiona sobre quando eles poderão se visitar – ou ele ir para Nova York, ou ela ir para Seul.

Jung Hae Sung diz que ele vai poder visitá-la após um ano e meio, já que antes ele fará um intercâmbio para a China – ele sempre quis aprender o mandarim que, segundo ele, é importante para seu trabalho. Nora, por sua vez, afirma que não poderá visitá-lo antes de um ano e diz que quer focar na sua vida em Nova York, nos Estados Unidos, centrar-se na carreira como escritora.

Eles estão errados? Eles estão certos? (SPOILER – não leia… bem, você já sabe). Quem poderá saber? Nem eles sabem – ou tem certeza. E mesmo no futuro (e falaremos dele depois), eu acho que eles não têm todas as respostas para essas perguntas. Ou, ao menos, não tem firmeza nas respostas. E é sobre isso que Past Lives trata. Também. Não é só sobre isso, mas é bastante sobre isso.

O filme aborda de forma franca, direta e ao mesmo tempo reflexiva como nossas decisões vão moldando a nossa vida. E se Jung Hae Sung tivesse cedido ao desejo de fazer o intercâmbio para a China e tivesse ido para Nova York? Isso realmente iria mudar o futuro dele e de Nora? E se ela não tivesse pedido um tempo e tivesse seguido conversando com ele, de fato ela teria se aproximado de Arthur Zaturansky (John Magaro, também muito bem em seu papel)? Talvez eles tivessem se aproximado, mas ela não estaria aberta para ter um romance com ele enquanto flertava e se relacionava de forma tão franca com Jung Hae Sung, mesmo que apenas através de conexões de vídeo.

A verdade é que Nora e Jung Hae Sung se separaram de forma definitiva a partir do momento que ela mudou-se para o Canadá e, depois, para os Estados Unidos, e ele permaneceu na Coreia do Sul. Apesar da relação especial que eles tinham, da conexão única que só eles poderiam entender, não existe mágica. Alguém precisaria ceder e mudar sua perspectiva de vida para dar certo. E percebemos isso de forma muito clara quando se passam mais 12 anos e, finalmente, Nora e Jung Hae Sung vão se reencontrar pessoalmente.

Muito é dito entre eles sem palavras. Algo muito típico dos sul-coreanos que tem como parte da cultura não expressar com tanta frequência quanto nós, latinos, suas emoções. Muito fica nas entrelinhas, nos olhares, nas expressões que eles trocam. Até que, mais perto do final, quando nos reencontramos com aquela cena inicial do bar, muito do que não tinha sido dito até então é verbalizado – para surpresa geral da nação, acredito.

Celine Song leva com maestria até o final as diferenças de personalidade entre Nora e Jung Hae Sung assim como a profundidade da relação entre eles. Entendo perfeitamente – e a diretora e roteirista nos leva a essa compreensão – as dificuldades de cada um deles para avançar ou para mudar. Nora, por um lado, sente-se compromissada com a ideia dos pais de mudar de vida – e ela própria, como Jung Hae Sung recorda, sempre teve alguns sonhos de grandeza (falaremos disso logo mais). Então ela não pode abandonar aquela realidade.

Sob a ótica de Jung Hae Sung, Nora foge. Sempre foge. Essa é sua natureza. Na verdade, essa é uma visão um pouco injusta. Afinal, não foi ela que escolheu sair da Coreia do Sul. Mas a partir do momento que ela imigrou, ela percebeu nos novos países que teria mais possibilidades de fazer o que amava. Então ela abraçou essa ideia. E orgulhosa como ela era, Nora não iria voltar atrás. Afinal, se fizesse isso, ela teria que abrir mão dos “grandes sonhos” e voltaria a ter uma vida mais simples.

Jung Hae Sung, por sua vez, nunca se importou em ter uma vida simples. Ele não precisava mais do que isso. Não tinha grandes ambições. Quando analisa o amigo, Nora comenta com Arthur que Jung Hae Sung era muito coreano porque, mesmo com a idade que tinha – e podemos presumir que eles estariam na casa dos 35 ou 36 anos -, ele morava com os pais e tinha uma visão “muito coreana” sobre tudo. O amigo tem uma vida comum – o que ela também tem, mesmo que pense que não, mas ok.

Como eu disse lá no início, esse filme tem muitas camadas e é repleto de sutilezas. O roteiro é riquíssimo, especialmente os diálogos entre os atores. Entre as pequenas sutilezas, destaco a conversa de Nora com Arthur depois de ter reencontrado Jung Hae Sung pela primeira vez. Ela está fascinada. Ao mesmo tempo que estranha a “cultura” do amigo que não vê há 24 anos, ela sente-se muito familiarizada com tudo aquilo. E como não seria assim? Ela nasceu na Coreia do Sul e foi criada por pais de lá, então claro que ela carregava aquela cultura consigo. Mas, ao mesmo tempo, ela não era apenas aquilo.

Só quem um dia já morou em outro país – e quanto mais você mora nesse outro país, mais você nota isso – para saber o quanto absorvemos essa outra cultura. Não somos totalmente esponja, não mudamos totalmente de pele, mas acabamos passando por um processo de simbiose entre nossa cultura original e a nova cultura. Impossível sair igual. Impossível voltar ao que se era. Isso é bom mas, ao mesmo tempo, é estranho. Porque aprendemos muito no processo, inclusive sobre nós e os outros, mas também nos perdemos um pouco.

Então entendo perfeitamente Nora e sua estranheza e familiaridade. Ela está certa sob as duas óticas. Jung Hae Sung ao mesmo tempo é um pouco estranho e bastante familiar. Sem contar a sintonia que eles têm, que é algo único e que vai muito além da questão cultural ou pelo fato deles terem nascido no mesmo local. Em certo momento, Nora fala para Arthur sobre a palavra coreana “in-yun”, que significaria algo como “providência” ou “destino”, e que está relacionada com “a relação entre duas pessoas”.

Segundo a protagonista, o conceito estaria ligado ao budismo e teria a ver com vidas passadas e reencarnação. Ocorreria um “in-yun” se dois desconhecidos se cruzam na rua e, sem querer, se esbarram um no outro. Isso significaria que teria existido algo entre eles em suas vidas passadas. Nora explica que se duas pessoas se casam, dizem que é porque já existiria 8 mil camadas de “in-yun” entre eles, de 8 mil vidas passadas.

Vamos combinar que é uma forma muito poética de explicar o casamento e as relações entre as pessoas. Qualquer encontro, praticamente. Essa é uma parte da beleza desse filme, carregado de culturas e significados. Quando Arthur pergunta se Nora acredita em tudo isso, ela brinca que é algo que alguém diz quando está interessado na outra pessoa.

Bem, ela acreditando ou não nisso – e quem assiste a Past Lives também -, não dá para negar a conexão única que Nora tem com Jung Hae Sung. Ela mesma não consegue negar, ainda que não consiga verbalizar ou processar a informação da melhor forma. (SPOILER – não leia se você não assistiu ao filme). E então temos aquele final perfeito. Sim, ele pode ser triste. Para quem torce sempre por finais felizes – e sim, somos levados a narrativa toda a torcer pelo “amor verdadeiro” (será mesmo?) e pela conexão única (isso sim, quase materializado no filme) entre Nora e Jung Hae Sung -, o final pode ter sido decepcionante, frustrante.

Para mim, foi perfeito. Nora e Jung Hae Sung sabem bem o tipo de conexão que eles têm. Mas ela, claramente, não consegue mais solucionar aquele enigma. Ela está casada, ama o marido – sim, é possível amar mais de uma pessoa ao mesmo tempo, ainda que nunca seja igual – e, principalmente, não vai abrir mão da vida que tem. Apesar disso tudo, ela sabe que talvez não tenha feito as melhores escolhas. Mas como voltar atrás? Impossível. Como mudar tudo agora? Ela não vê mais como. E é assim a vida. Fazemos nossas escolhas e temos que lidar com elas.

Sempre que alguém decide estar em um lugar e não em outro, está escolhendo seus caminhos. A frustração pode aparecer, aqui e ali. A pessoa até pode perceber que não fez, talvez, as melhores escolhas. Mas então ela deve lidar com o que decidiu até então. E é isso. Past Lives é tão perfeito que ele trata sobre isso de forma muito franca e singela. E Jung Hae Sung? Ele, por sua vez, sempre apaixonado por Nora, percebe que não tem mais muito o que fazer. Ficou tarde, agora, para ele abrir mão da Coreia do Sul. E talvez ele nem faria isso. Antes, 12 anos antes do reencontro com Nora, ele não fez isso. Agora, passou o tempo e eles não são mais “crianças”, como eles próprios se definiram nos episódios anteriores. Eles são adultos e tem que lidar com suas escolhas.

No fim das contas, quanto mais o tempo passa, isso é o que mais percebemos com a passagem do tempo. Que as escolhas nos definem. Que há caminhos que não podem ser percorridos novamente. Ainda assim, é claro, sempre acredito que é possível buscar o que realmente desejamos. Isso pode demorar mais 12 anos, 24 anos, ou o tempo que for. Ou pode nunca acontecer. Só vai depender de nós e das circunstâncias. E essas circunstâncias, geralmente, dependem das decisões de quem nos interessa. Nada é simples, ao mesmo tempo que nada é tão complexo. O que falta, muitas vezes, é o jogo franco.

Carregados da cultura na qual eles foram gerados, Nora e Jung Hae Sung claramente não conseguem expressar seus sentimentos como deveriam – ou poderiam. Isso é sintomático. No fim, percebemos que alguém precisava ter cedido. E no tempo certo. Sempre é assim. A ação precisa ser feita no tempo adequado, ou nada acontece. Apesar de Past Lives tratar sobre tudo isso e um pouco mais, não deixa de cortar o coração quando Jung Hae Sung pergunta para Nora, perto do final, se aquela já fosse uma vida passada deles, o que eles poderiam ser em uma vida futura. Caramba! Quem pode aguentar isso, Celine Song?

Independente da crença que um ou outro possa ter, o que temos é o presente. Acho que quando perdemos essa noção, corremos um risco muito maior de fazermos escolhas ruins. Não sabemos, de fato, sobre eternidade, mil (ou milhões) de reencarnações, vidas futuras ou passadas. Sabemos sim que nossas escolhas nos definem e nos levam para a direção que queremos. Se temos a coragem de fazer as escolhas que desejamos. O resto é amores não vividos, palavras não ditas, arrependimentos e afins.

Falando ainda sobre as sutilezas de Past Lives, há outro diálogo que me chamou a atenção. Quando Jung Hae Sung pergunta para Nora o que ela deseja conquistar ainda, já que quando eles eram crianças/pré-adolescentes ela queria ganhar o Nobel de Literatura e, 12 anos depois, ela queria ganhar o Pulitzer, o que ela desejava ganhar agora? No que ela responde que não tem pensado nisso. Caramba, Celine Song! Que porrada! São essas sutilezas e camadas narrativas que tornam esse filme tão especial.

O diálogo entre os protagonistas pode parecer simples, mas não é. Nada nesse filme não foi cuidadosamente pensado, aliás. O que significa esse diálogo entre eles? Mais uma constatação sobre a passagem do tempo. Quando criança/pré-adolescente e quando jovem adulta, Nora tinha sonhos ousados. Queria conquistar grandes feitos. Agora, na faixa dos 30 e tantos anos, o cenário era outro. O tempo faz isso com a gente – e quem já passou dos 30 ou dos 40 sabe bem o que acontece.

Realmente é interessante como quando mais jovens a gente quer “conquistar o mundo” e tem sonhos bem ambiciosos, até. Conforme o tempo passa, esses sonhos vão parecendo pouco importantes ou impossíveis. As preocupações passam a ser outras, assim como as prioridades. Após Jung Hae Sung insistir na pergunta, Nora acaba dizendo que gostaria de ganhar um Tony.

É como se a diretora e roteirista estivesse nos lembrando que não podemos nos acomodar. Que sim, muitas outras preocupações (e distrações) surgem no caminho, mas que é sempre importante ter alguém por perto para nos lembrar que precisamos sonhar e correr atrás desses sonhos e grandes realizações. Em que momento a gente esquece disso? Essa é apenas uma das muitas questões que esse Past Lives nos apresenta.

Antes eu falei bastante sobre Nora e como ela se sentia “compromissada” com o sonho de uma vida melhor dos pais. Querendo ou não, muitas vezes de forma impensada, percorremos sonhos que não são os nossos, exatamente. Para honrar ou não frustrar as expectativas dos nossos pais, a quem sempre pensamos que devemos muito, não buscamos exatamente o que mais desejamos. No fim, acho que foi isso que aconteceu com Nora. Sim, ela tinha certa ambição. Mas nem era isso que a segurava nos Estados Unidos.

Por outro lado, e acho importante falar dele, temos o lado de Jung Hae Sung da história. Ele novamente não pode ser resumido pela leitura de que lhe faltou “ambição” para deixar a Coreia do Sul e para ir atrás de Nora. Na verdade, apesar de ser louco por ela, ele ficou 12 anos sem saber nada da garota… e quando a reencontrou, ainda que só virtualmente, ele não conseguiu ter a mobilidade para mudar de direção que poderia ter tido. Mas algo também ajuda a explicar essa “inércia”.

Para mim fica evidente, especialmente na fase final do filme, que no fundo, no fundo, Jung Hae Sung tinha medo sobre quais poderiam ser as ações de Nora caso ele decidisse abrir mão de tudo para imigrar também para a América do Norte. Ela ficaria com ele, encararia uma vida a dois, ou daria um jeito de fugir, como ela parecia gostar de fazer? Entendo a insegurança dele. Sem contar que, provavelmente, ele gostava da Coreia do Sul, dos pais, amigos e etc.

O risco era um elemento a mais na equação e que ele não quis encarar. E então o tempo passou, e apesar de Jung Hae Sung e Nora constatarem que o que eles tinham era especial, parecia que aquela distância toda – de tempo e espacial – não poderia mais ser resolvida. E foi assim que tudo se resolveu sem estar resolvido. E assim os dois seguiram com suas vidas “comuns”, cada um em um continente diferente.

NOTA

10.

OBS DE PÉ DE PÁGINA

Sim, minha gente, depois de uma longa temporada – teria que fazer uma pesquisa aqui no blog para saber quanto tempo se passou -, eu volto a dar a nota máxima para um filme. Puxa, que bom fazer isso! E que bom retomar o blog com esse Past Lives. Precisava de um filme para voltar a me despertar a paixão pelo cinema. Não que eu tenha perdido essa paixão, mas ela andava um pouco esquecida. 😉

Minha ideia, a partir de agora, é voltar a publicar atualizações por aqui uma vez por semana. Vamos ver se eu consigo! Claro que, para isso, sei que devo escrever críticas mais curtas… mas é que Past Lives merecia uma crítica maior. Que filme incrível! Eu teria tanto para falar sobre ele que eu acho que precisaria de algumas horas de vídeo ou de muitas páginas de blog… então vou tentar me conter. Hahahahahaha.

Certamente muita gente não vai concorda com a nota 10 que eu dei acima para essa produção. Devo dizer que, como acontece com todos os filmes que existem, essa produção vai bater diferente em cada pessoa por uma série de fatores. Acho que para quem tem mais de 30 ou 40 anos de vida, o filme vai falar de forma diferenciada. Para quem já viveu – ou vive – em outro país do que no seu de origem, também. Porque a passagem do tempo, o que ela nos traz e a experiência de viver imersa em mais de uma cultura são pontos determinantes nessa história e também na forma como ela vai trazer significados para quem assistir.

Tem uma ou duas questões interessantes desse filme que eu não abordei antes mas que eu acho importante tratar antes de encerrar esse conteúdo. (SPOILER – não leia se você não assistiu ao filme). A primeira questão é de como é interessante a forma como Celine Song trata sobre o amor romântico, o amor idealizado, o amor impossível e o amor possível. Ela nos leva pela mão, claro, para torcer por Nora e Jung Hae Sung. Afinal, esse é o amor idealizado, o amor perfeito, o amor (quase) impossível. Aquele sobre o qual tantas obras já foram feitas. Mas então Arthur, um sujeito atento e sensível, nos apresenta o amor viável, o amor possível, aquele que existe na prática. Então percebemos que ele não é errado, e lembramos que o amor é uma escolha.

Há quem diga que o coração tem razões que a própria razão desconhece (sim, citei Blaise Pascal). Pois bem, Arthur, percebendo que a esposa está mexida com a vinda de Jung Hae Sung, começa a questionar-se sobre a relação dos dois. Tudo que ele lista é totalmente palpável, plausível, provavelmente nós mesmo já vivemos algumas daquelas situações e escolhemos estar com uma pessoa ao invés de estar com outra. Sim, ele mostra fragilidade – algo muito bacana de se ver em um homem, diga-se. Mas Nora é honesta em dizer que o ama e, claro, escolheu estar com ele. E é isso. Não precisamos tornar tudo muito complexo. Estar com alguém é uma escolha.

Nora fez sua escolha, para o bem, ou para o mal. Em certa medida, claro, para o bem. Ela parece se dar muito bem com Arthur e pode ser feliz com ele. Mas ela terá com ele o mesmo que teria com Jung Hae Sung? Certamente que não.

Ela tem uma sintonia surreal com Jung Hae Sung, mas isso também não quer dizer que eles seriam felizes juntos. Na verdade, muitos elementos fazem um casal ter êxito, ficar junto por um longo período (ou “para sempre”, seja lá o que isso quer dizer) ou ser feliz. Não basta sintonia. Acima de tudo, é preciso respeito, sensibilidade, olhar atento e vontade. Sobre isso e muito mais que esse filme trata. E não deixa de ser muito interessante – e até provocativo – como Celine Song nos faz refletir sobre tudo isso, sobre nossa própria ideia e conceito sobre o amor.

Ela trata também sobre outros conceitos, claro, como o bastante filosófico conceito de “in-yun”. Novamente, e não sou uma letrada nesse assunto, acredito que esse filme terá um significado diferente para quem é budista. Como eu não sou, essa parte mais transcendental da história não bateu tão fundo, apenas reforçou para mim aquela ideia que muitos de nós têm de que há mais significado nos encontros fortuitos do que podemos provar. As pessoas precisam encontrar significados especiais para tudo, sem dúvida. Não vou entrar nesse debate, mas Yuval Harari em sua obra não me deixa mentir.

Então sim, você pode acreditar em um milhão de vidas e nos encontros sem fim com as pessoas que você vai ter pela eternidade, sendo vários desses encontros especiais, transcendentais, ou você pode não acreditar nisso. Mas existe beleza nessa crença, nessa forma de ver os esbarrões, paixões, amores, amizades, famílias e afins. Especialmente quando utilizamos o conceito para pensar nas possibilidades que temos ou daquelas que abrimos mãos, ele pode trazer certo conforto para quem percebe que talvez não tenha feito as melhores escolhas até aqui. Jung Hae Sung, apaixonado eternamente por Nora, certamente se agarra a esse conceito para seguir. Aparentemente, é o que lhe resta.

Como comentei antes, para mim um dos grandes trunfos e uma das maiores qualidades desse filme é o roteiro escrito pela diretora Celine Song. Incrível cada linha de texto, os diálogos e as situações que ela construiu. Achei a narrativa perfeita. Também fiquei pensando sobre a divisão do tempo narrativo em ciclos de 12 anos.

Como não sou budista, apenas presumi que isso teria um sentido, mas sem saber logo de cara qual seria. Pois bem, pesquisei sobre ciclos de 12 anos e o budismo – já que o conceito budista “in-yun” é citado no filme – e de fato há uma explicação para a história ser dividida em ciclos de 12 anos. O horóscopo chinês, explicado a partir de uma lenda relacionada com Buda, prevê ciclos de 12 anos tendo como regentes 12 animais. Cada animal rege um ano. Quem deseja saber mais sobre esse assunto, recomendo esse texto publicado pela Universidade Federal de Goiás.

Faz sentido que os encontros e desencontros entre Nora e Jung Hae Sung aconteçam sempre após ciclos de 12 anos. Assim, meu chute de que eles teriam cerca de 12 anos quando a história volta no tempo, faz ainda mais sentido. Assim, podemos presumir que eles tem 12 anos, depois 24 e 36 anos de idade em cada parte que vemos na produção. São fases muito diferentes da vida e, eu diria, bastante definidoras sobre caminhos, escolhas e perspectivas de vida.

Enfim, fiquei apaixonada por Celine Song. E espantada ao saber que Past Lives marca sua estreia na direção. Pois sim, essa cineasta nascida em 1988 na Coreia do Sul tinha apenas um outro trabalho como roteirista, fazendo parte do time responsável pela série de TV The Wheel of Time, antes de escrever e dirigir esse Past Lives. Pois bem, a partir de agora, coloquei ela na lista das diretoras a serem acompanhadas. Se ela seguir com a inteligência e a sensibilidade que ela manifestou nessa produção, ela merece ter seus próximos trabalhos acompanhados, sem dúvida.

Além de um roteiro perfeito, com cada palavra muito bem escolhida, Celine Song mostra firmeza na direção, fazendo a escolha certa em cada sequência, valorizando muito o trabalho dos atores, assim como os lugares em que eles vivem, suas realidades e enquadramentos que ajudam a reforçar determinadas leituras daquela realidade. Marcas de quem entende do ofício e aprendeu muito sobre cinema, certamente, analisando diversos cineastas e suas obras.

Celine Song acerta também em contar uma história aparentemente simples – só na aparência mesmo, porque na essência temos uma história cheia de camadas e significados – focando em poucos personagens. Com isso, vemos brilhar na nossa frente o trabalho de três atores – com destaque especial para os dois primeiros: Greta Lee, Teo Yoo e John Magaro. Eles estão simplesmente incríveis nos seus papéis. Especialmente Greta Lee faz uma performance estonteante, magnética. Mas os três estão ótimos, respeitando cada detalhe de seus personagens e nos passando muito sentimento e significado em cada cena do filme. Trabalho irretocável.

Bem diferente de Celine Song, que estreou na direção de longas com esse Past Lives, os protagonistas do filme já tem um currículo um bocado longo nos cinemas. Greta Lee, americana nascida em Los Angeles em 1983, tem nada menos que 51 títulos no currículo – sendo 23 filmes feitos para a TV ou para o cinema. Ela tem muitos trabalhos em séries feitas para a TV – inclusive estreou nesse formato em 2006. Teo Yoo, ator alemão nascido em 1981, tem 28 títulos no currículo, sendo 16 deles filmes.

Além dos atores que citei, os que valem ser destacados da produção já foram citados anteriormente. Destaque, claro, para Moon Seung-ah e Leem Seung-min que interpretam os protagonistas quando eles tem 12 anos de idade. Vale citar, desta fase, os pais de Nora, interpretados por Ji Hye Yoon e por Won Young Choi; Ahn Min-Young como a mãe de Hae Sung; e Seo Yeon-Woo como a irmã mais nova de Nora quando criança. Todos dessa segunda lista em papéis bem secundários.

Entre os aspectos técnicos do filme, um louvor especial para a direção de fotografia de Shabier Kirchner, em um trabalho muito bonito e de qualidade; para a trilha que ajuda a embalar diversos momentos importantes e valoriza a narrativa, assinada por Christopher Bear e Daniel Rossen; e para a ótima edição de Keith Fraase.

Para quem gosta de saber sobre outros aspectos técnicos importantes de cada filme, vale citar o design de produção de Grace Yun; a direção de arte de Alan Lampert; a decoração de set de Joanne Ling; e os figurinos de Katina Danabassis.

Alguém pode ter lido a crítica acima e ter pensado: “mas da onde ela tirou essa história que os sul-coreanos têm dificuldade de falar sobre os seus sentimentos?”. Pois bem, eu explico. Recentemente eu li uma reportagem sobre as razões que fazem a Coreia do Sul ter os maiores índices de suicídio entre os países desenvolvidos.

(ALERTA para pessoas que estejam passando por momentos difíceis: se ler sobre esse tema é um gatilho para você, sugiro que você procure ajuda e apoio e que não leia o restante deste parágrafo). Entre as razões apontadas pela reportagem da BBC estão a pressão enorme que a sociedade faz para que as pessoas tenham “sucesso pessoal” e a falta de oportunidades e de espaços para as pessoas manifestarem os seus sentimentos. Muito desses dois fatores – entre outros – estão presentes em Past Lives. O que torna o filme ainda mais importante. Ele levanta questões sobre a cultura sul-coreana que são importante ser debatidas por aquela sociedade e por todas as outras.

Essa questão de fundo de Past Lives também nos abre uma outra frente de reflexão e de discussão: o quanto das nossas escolhas são realmente nossas e o quanto são fruto do nosso entorno, de decisões dos nossos pais ou das pressões das sociedades em que nascemos/crescemos? Realmente a gente está fazendo o que gostaria? Estamos onde a gente deseja e com quem a gente realmente quer? Ou fomos “levados”, até certa medida, a fazer essas “escolhas” a ter essas “circunstâncias”? Eita, falei que esse filme é especial, repleto de camadas e nuances? Pois bem.

Ah, e sobre aquela minha reflexão inicial, acho que Past Lives aborda como nenhum outro filme como a gente tem diversas vidas dentro de uma única existência, assim como projeta a possibilidade de vínculos baseados no amor para além dessa vida.

Considero que Past Lives tem muitas cenas marcantes. Mas uma das sequências mais impressionantes está no final, conectada com aquele início do filme. (SPOILER – não leia se você não assistiu ao filme). Inicialmente, a dinâmica daquela noite a três apresenta Jung Hae Sung fazendo um esforço para falar inglês e tentar fazer-se entender por Arthur. Isso começa no restaurante italiano e segue no bar. Até que Jung Hae Sung e Nora engrenam em uma conversa mais profunda – admirável para pessoas que inicialmente têm dificuldade em expressar de forma franca seus sentimentos, mas que talvez pelo passar das horas e percebendo que não teriam mais muito tempo para fazer isso, resolvem “se abrir” um pouco mais – e que só pode ser desenvolvida no idioma materno. Daí fica angustiante aquela cena… os dois falando questões importantes, sérias, marcantes, enquanto Arthur está totalmente “carta fora do baralho”. Ao mesmo tempo, como sabemos que ele já se esforçou para entender o idioma da esposa, será mesmo que ele está totalmente “por fora” do que está sendo dito? A dúvida sobre isso torna tudo aquilo mais angustiante. Golaço de Celine Song.

Past Lives estreou em janeiro de 2023 no Festival de Cinema de Sundance, nos Estados Unidos. Depois, o filme participaria, ainda, de outros 20 festivais em diversos países, incluindo os conhecidos festivais de Berlim, de Sydney, de San Sebastián, de Busan e do Rio de Janeiro.

Em sua trajetória até aqui, Past Lives ganhou sete prêmios e foi indicado a outros 16. Entre os prêmios que recebeu, o destaque vai para os prêmios de Melhor Filme Indie, Melhor Atriz para Greta Lee e Melhor Roteiro conferidos no Hollywood Critics Association Midseason Awards, que literalmente faz referência aos prêmios de “meio da temporada” da Associação de Críticos de Hollywood. Isso demonstra que o filme ganhou visibilidade na primeira metade do ano. Mas sabemos, por experiência, que os filmes mais fortes para concorrer no Oscar aparecem mais para o final do ano. Então, talvez, Past Lives não chegue com muita força no Oscar 2024…

Agora, vale citar algumas curiosidades sobre o filme. Apesar do personagem de Teo Yoo falar com um forte sotaque e aparentemente mal o inglês, o ator na verdade fala o idioma fluentemente, assim como outros três idiomas. Deve ser interessante para quem fala bem um idioma fingir tão bem que fala mal, não é mesmo? Curioso.

A diretora Celine Song disse que tentou deixar os atores Greta Lee e Teo Yoo separados o quanto foi possível para que quando os personagens deles se encontrasse na história, após tanto tempo, ela conseguisse capturar essa sensação de que eles estavam se vendo adultos pela primeira vez, de fato.

Outra curiosidade sobre a dinâmica dos atores: Celine Song cuidou para que os atores Teo Yoo e John Magaro não tivessem se encontrado antes deles rodarem a cena em que seus personagens se encontram pela primeira vez. Assim, quando vemos Arthur e Hae Sung tendo a primeira interação, aquele foi também o primeiro encontro entre os atores que os interpretavam. Interessantes essas escolhas da diretora.

Past Lives tem diversos elementos autobiográficos de sua realizadora. (SPOILER – não leia se você não assistiu ao filme). Celine Song, a exemplo da protagonista do filme, também mudou-se com seus pais da Coreia do Sul para o Canadá quando era criança. O pai dela também era cineasta – como o pai de Nora. Mais tarde, Celine mudou-se para os Estados Unidos, onde começou a escrever peças de teatro e casou-se com um escritor.

Os usuários do site IMDb deram a nota 8 para esse filme – um bom nível de avaliação levando em conta o perfil das notas do site. O site Rotten Tomatoes, por sua vez, apresenta um nível de aprovação de 97% para Past Lives, fruto de 248 críticas positivas e apenas sete negativas – a nota média dada pelos críticos é 9,2, um nível excelente.

O site Metacritic apresenta um “metascore” de 94 para esta produção, fruto de 50 críticas positivas e uma mediana. Entre os usuários do site, o filme apresenta uma nota média de 8,3. Além disso, o filme ganhou o selo “Metacritic Must-see”.

Segundo o site Box Office Mojo, Past Lives faturou cerca de US$ 17,3 milhões nas bilheterias pelo mundo, sendo US$ 10,9 milhões apenas nos Estados Unidos. Resultado interessante para um filme que é apenas parcialmente falado em inglês. Depois dos Estados Unidos, o país onde a produção foi melhor nas bilheterias foi o Reino Unido, onde Past Lives faturou US$ 3 milhões.

Past Lives é uma coprodução dos Estados Unidos com a Coreia do Sul. O filme tem falas em coreano, inglês, mandarim e francês. Ele foi rodado em Seul, na Coreia do Sul, e em Nova York, nos Estados Unidos.

CONCLUSÃO

Um filme cheio de sutilezas, com ótimo texto, intérpretes carismáticos e acima da média e repleto de conteúdo dividido em várias camadas. Certamente Past Lives vai bater diferente conforme a carga de experiências, a idade e as vivências das pessoas. Sob a minha perspectiva, de quem já viveu na pele de imigrante e de quem já se questionou sobre várias decisões tomadas na vida, esse filme tocou fundo. Estas são duas das diversas camadas importantes desta produção, que trata sobre escolhas, amores, sonhos, encontros, desencontros, pequenas alegrias e arrependimentos. Tudo está ali. A vida em sua essência, com toda sua simplicidade e complexidade. Há tempos não assistia a um filme tão bom. Vale cada segundo.

PALPITES PARA O OSCAR 2024

Pois sim, minha gente, com esse Past Lives eu começo a minha jornada/incursão nessa aventura anual de comentar sobre produções que podem ter alguma chance na premiação da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood.

Vendo o que os especialistas apontam para o Oscar 2024, essa produção aparece em diversas listas como uma possibilidade. Sabemos, pelo que vimos da Academia nos últimos anos, que o Oscar está mais aberto a receber e a indicar filmes estrangeiros em suas diversas categorias. Claro que faltam muitos filmes para assistir ainda, mas desde já eu estou na torcida por esta produção.

Francamente, acho que Past Lives poderia figurar não apenas na categoria de Melhor Filme como poderia ser indicado ainda a Melhor Direção, Melhor Ator, Melhor Atriz e Melhor Roteiro Original. Mas, de fato, ele tem chances em que categorias? Conhecendo Hollywood, eu diria que ele tem chances em Melhor Filme, que é uma categoria que aceita um número maior de indicados, e Melhor Roteiro Original.

Caso o filme surpreender e emplacar uma indicação em outras categorias, vou achar ótimo. E quais as chances reais da produção ganhar algo? Olha, todos estão indicando que Oppenheimer pode ser o arrasa-quarteirão do Oscar do próximo ano. Se for assim, dificilmente teremos chances para muitos filmes além da produção dirigida por Christopher Nolan ou de seu franco concorrente, Killers of the Flower Moon, dirigido por Martin Scorsese.

Ainda preciso assistir aos dois favoritos e a outros filmes que estão forte na disputa. Mas Past Lives, desde já, figura na minha lista dos grandes filmes do ano e que deveriam emplacar em diversas categorias do Oscar. Caso isso não acontecer, paciência. É do jogo. Mas espero que muitas pessoas despertem para essa produção bela, sensível e muito rica.

Por Alessandra

Jornalista com doutorado pelo curso de Comunicación, Cambio Social y Desarrollo da Universidad Complutense de Madrid, sou uma apaixonada pelo cinema e "série maníaca". Em outras palavras, uma cinéfila inveterada e uma consumidora de séries voraz - quando o tempo me permite, é claro.

Também tenho Twitter, conta no Facebook, Polldaddy, YouTube, entre outros sites e recursos online. Tenho mais de 25 anos de experiência como jornalista. Trabalhei também com inbound marketing, professora universitária (cursos de graduação e pós-graduação) e, atualmente, atuo como empreendedora após criar a minha própria empresa na área da comunicação.

3 respostas em “Past Lives – Vidas Passadas”

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